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A pandemia do coronavírus e suas consequências socioeconômicas levaram milhares de pessoas a morar nas ruas. Porém, a grande mídia deu pesos e medidas completamente diferentes às duas falas.

Cláudio Rodrigues || aclaudiors@gmail.com

A primeira semana de julho chega ao fim com mais de 64 mil óbitos vitimas da Covid-19, essa pandemia que mudou por completo nossas vidas. Além da tragédia da pandemia, a semana foi marcada por duas declarações, no mínimo infelizes: uma do prefeito de Itabuna, Fernando Gomes, e outra da primeira-dama e presidente do Fundo Social de São Paulo, Bia Doria.

Em uma entrevista coletiva por videoconferência, na última terça, dia 30, o prefeito da cidade sul-baiana soltou uma frase que lembrou o “E daí?” do presidente Jair Bolsonaro. “Primeiro, lutar pela vida, a vida é uma só. [Depois que] morrer, acabou [a vida]. Não tem fortuna, não tem pobreza, não tem falência, não tem nada. Mas não posso abrir uma coisa que não tenho cobertura. Com a dúvida, com os nossos morrendo por causa de um leito em Itabuna, vou transferir essa abertura. No dia 8, mandei fazer o decreto, que no dia 9 abre, morra quem morrer”, disse o prefeito.

O “morra quem morrer” do prefeito Gomes foi a principal notícia do day after. Todos os veículos de comunicação em seus programas noticiosos, de entretenimento e até algumas agências de notícias internacionais deram destaque à fala do prefeito, além dos comentários nas redes sociais.

Já a primeira-dama do estado de São Paulo, em uma entrevista publicada em rede social, para a socialite Val Marchiori, aquela do empréstimo irregular de R$ 2,79 milhões, junto ao Banco do Brasil, segundo atestou o Tribunal de Contas da União (TCU), travaram um diálogo com algumas “pérolas” que beiraram o ridículo.

“Falando sobre projetos sociais, algo muito importante é assim… as pessoas que estão na rua… não é correto você chegar na rua e dar marmita, porque a pessoa tem que se conscientizar que ela tem que sair da rua. Porque a rua hoje é um atrativo, as pessoas gostam de ficar na rua”, disse a senhora Doria. A entrevistadora questionou: “eles querem ficar na rua porque no abrigo eles têm horário pra entrar, eles têm responsabilidades, limpeza e eles não querem, né, Bia?

A presidente do Fundo Social do estado mais rico do Brasil afirmou: “Não querem! A pessoa quer receber a comida, a roupa, uma ajuda, e não quer ter responsabilidade. Então, isso tá errado”. Sem perder o embalo, a socialite e dublê de jornalista emendou: “todo mundo tem responsabilidades”. Não se fazendo de rogada, a mulher do governador João Doria completou: “Nós temos, se a gente não pagar nossas contas, vai pra cartório. E o povo fala!”.

O que difere a falta de empatia do prefeito de Itabuna, Fernando Gomes, e a da primeira-dama de São Paulo, Bia Doria? O primeiro é um senhor de 81 anos, em seu quinto mandato de prefeito e no final da carreira política. Ex-vaqueiro, semialfabetizado, como uma dicção quase que incompreensível e sofrendo uma forte pressão por parte do setor econômico da cidade. Gomes tem uma carreira política muito controversa. Foi destaque na revista Veja como “O marajá dos marajás” por ter um salário de quase U$ 18 mil, no inicio dos anos de 1990, em um de seus mandatos de prefeito.

Bia Doria é artista plástica, tem no currículo exposições realizadas em todo o Brasil e em países da Europa e Estados Unidos, filha de imigrantes italianos. Estava em um bate-papo descontraído, nas dependências do Palácio dos Bandeirantes e, aos 60 anos, preside um órgão do Governo do estado de São Paulo responsável por atender pessoas em situação de vulnerabilidade social.

A fala da primeira-dama paulista foi tão chocante e repulsiva quanto a do prefeito itabunense. Vale lembrar que a pandemia do coronavírus e suas consequências socioeconômicas levaram milhares de pessoas a morar nas ruas. Porém, a grande mídia deu pesos e medidas completamente diferentes às duas falas.

Não quero fazer defesa do alcaide baiano, pois Fernando Gomes é o tipo de político que conta com minha completa aversão, mas o comportamento de Bia Doria, uma elitista que já se envolveu em outras polêmicas, não difere em nada. Faltou a ambos sentir o que sentiria outra pessoa caso estivesse vivendo a mesma situação.

Cláudio Rodrigues é consultor em comunicação.

3 respostas

  1. Quem nunca errou que atire a primeira pedra ,muitas vezes falamos e percebemos que a frase não foi bem colocada quando escrevemos acontece a mesma coisa só que podemos apagar e escrever de novo ,porém mais errado do que aquele que errou são os que acusam, condena e não conseguem perdoa .

    1. “… porém mais errado do que aquele que errou são os que acusam, condena e não conseguem perdoa.”
      Eu só acho estranho uma pessoa com atitude aporofóbica ocupar uma função filantrópica no governo do Estado de São Paulo.

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