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Os contratos de concessão de rodovias federais serão revistos e poderão ser renovados sem a necessidade de licitação, mas terão novas regras determinadas por portaria do Ministério dos Transportes, publicada nesta terça-feira (29) no Diário Oficial da União. A medida, que entra em vigor a partir de 1º de setembro, prevê avaliações das concessões com base na defesa do interesse público, na aplicação de preços baixos e na execução de investimentos em curto prazo.

Segundo o ministro dos Transportes, Renan Filho, a nova política pública foi baseada em decisão do Tribunal de Contas da União (TCU) que permite a renegociação de contratos, sem necessidade de relicitação de ativos. Dessa forma, investimentos que estavam parados, por problemas de adequação financeira, poderão ser remodelados, por meio de termo aditivo.

A renovação dos chamados contratos estressados foram condicionados a medidas como a renúncia de processos judiciais, a antecipação de cronograma e garantia de execução das obras, além da modernização das cláusulas de acordo com as atuais políticas públicas e regras objetivas para eventual descumprimento.

INVESTIMENTO DE R$ 40 BILHÕES

Com a mudança, o Ministério dos Transportes projeta investimentos de R$ 40 bilhões nos setores ferroviário e rodoviário, até o fim da gestão do atual governo. “Os novos contratos trarão maior segurança e previsibilidade jurídica, o que deve atrair mais investidores e garantir melhorias de infraestrutura nas principais rodovias do país”, explica Renan Filho.

A portaria determina também que a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) será o órgão responsável por fiscalizar os contratos e realizar a avaliação técnica da execução das obras. E os termos aditivos serão celebrados com a mediação e avaliação do TCU.

Trecho da Ferrovia de Integração Oeste-Leste (Fiol) || Foto Ministério da Infraestrutura
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“Se a ferrovia lograr conexão com o oeste baiano, permitirá ao Porto Sul escoar a volumosa produção dessa fronteira agrícola”.

Henrique Campos de Oliveira || henrique.oliveira@ecossistemaanima.com.br

Dificilmente uma cidade na costa do Brasil irá dispensar a construção de um porto ligado a uma ferrovia que avança 1500 km em direção ao oeste no continente. Não há porto no país com essa capilaridade longitudinal.

Não é de agora que o litoral da Bahia é cobiçado para abrigar um porto que seja via de acesso a uma ferrovia que adentre o continente em direção ao pôr do sol. Vasco Neto, nos anos 1950, já apresentava tal proposta. A ideia era conseguir a sonhada conexão entre os Oceanos Pacífico e Atlântico. O porto do nosso lado seria em Campinhos, na baía de Camamu, e o do lado de lá da cordilheira, o de Iquique, no Chile. Uma obra com a mesma ambição do canal do Panamá: ligar os dois continentes e facilitar a conexão entre Ásia e Europa, tendo a Bahia e o Brasil como entrepostos.

Aquela iniciativa não foi adiante (relembre), mas a Ferrovia de Integração Oeste Leste (Fiol) e o Porto Sul têm o projeto de Vasco Neto como referência.

O projeto da Fiol consiste na construção de três trechos de, aproximadamente, 500 km cada. O primeiro trecho e mais avançado na execução da obra é o que liga o Porto Sul a Caetité, onde se encontra a mina Pedra de Ferro. O escoamento do minério é o principal motivador para as duas obras, bem como gerará volume de cerca de 50 milhões de toneladas/ano, que viabilizam o empreendimento.

Trecho 2 não aparece como investimento ferroviário prioritário em estudo de 2010 do Ipea

O segundo trecho definido no projeto é a ligação entre Caetité e Barreiras, na região oeste da Bahia, produtora de grãos e demais commodities agrícolas. Se a ferrovia lograr conexão com o oeste baiano, permitirá ao Porto Sul escoar a volumosa produção dessa fronteira agrícola. O preço do frete seria reduzido, tendendo a expandir a atividade e a aumentar a diversidade de operações e serviços adicionais na região onde o porto é construído.

Todavia, é o trecho que enfrenta algumas complexidades, mesmo tendo 45% das obras concluídas. O ramo entre Correntina e Barreiras tem lençol freático e sítios arqueológicos importantíssimos, que exigem significativo cuidado na execução da obra. Além disso, há a necessidade da construção de uma ponte que passe sobre o maravilhoso – e largo – leito do Rio São Franciso, na altura de Ibotirama.

O terceiro trecho seria a conexão entre Barreiras e Figueirópolis, no Tocantins, onde iria entroncar com a ferrovia Norte-Sul, que liga Santos (SP) ao Porto de Itaqui, no Maranhão. Com esses três trechos, o Porto Sul não seria somente opção para escoamento de produtos do oeste baiano, mas também do Centro-oeste brasileiro, tendo a possibilidade de ampliar sua área de influência, inclusive à parte do Sudeste e do Norte.

O trecho 1, Ilhéus-Caetité, está praticamente pronto. Aguarda apenas o porto para começar a operar. A licença de exploração foi adquirida pela Bamin, mesma empresa que é dona da mina e do terminal portuário. O trecho 3 ainda aguarda licenças ambientais.

O trecho 2, a meiota que liga Caetité ao nosso oeste e viabilizaria a ampliação de serviços e operações do Porto Sul, como já dito, apresenta sensíveis complexidades na execução da obra. Se os trechos 1 e 3 forem executados sem o 2, será o fim da possibilidade de termos tal empreendimento como alternativa para superarmos a pobreza e a desigualdade que maculam a região.

Trechos da Fiol identificados em vermelho (1), azul (2) e verde (3)

Se esse buraco na Fiol persistir, como consta no mapa do Ipea (2010), vai tonar o Porto Sul um terminal exclusivo para minério e, ao invés de escoarmos a produção do Centro-Oeste, com consolidação do trecho 3 (Barreiras-Ferrovia Norte-Sul), outros estados vão escoar os produtos do oeste baiano, tanto por portos do Sul e Sudeste como do Norte.

Portanto, além de questões de engenharia e ambientais – legítimas e fundamentais para a sustentabilidade de uma nação -, há aspectos de ordem política na disputa federativa, que afetam a integralidade da Fiol. Contornar esses obstáculos exige dos políticos baianos (Executivo e Legislativo) e, sobretudo, da sociedade civil (como associações de produtores, sindicatos e empresários) união e coordenação política para garantir a integralidade do projeto o mais rápido possível. É questão de sobrevivência!

Henrique Campos de Oliveira é ibicariense, doutor em Ciências Sociais pela UFBA e professor do Mestrado em Direito, Governança e Políticas Públicas da Unifacs.

Canteiro de obras do Porto Sul, em Ilhéus || Foto Divulgação
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“Esses empreendimentos e obras podem ser a redenção para a região reconfigurar a sua inserção internacional, prover mais competitividade aos agentes econômicos daqui e atenuar a miséria e desigualdade crônicas que assolam a região”.

Henrique Campos de Oliveira || henrique.oliveira@ecossistemaanima.com.br

Como discutido na última coluna, a infraestrutura disponível para integração física internacional do sul da Bahia é defasada e desintegrada. O Porto do Malhado foi inaugurado já em descompasso com as tecnologias vigentes da época, não precisou de uma década sequer, desde o início de suas operações, para se tornar ocioso. Tal como o Porto de Salvador atualmente, não tem conexão com ferrovia, isso desde a sua concepção pelo Governo da Ditadura Militar.

Assim, recuperamos a pergunta feita há 15 dias: como os atuais projetos e empreendimentos voltados à atividade da logística internacional superam esse atual padrão de conexão com o mundo na região?

A partir de 2007, iniciou-se discussão sobre a construção de um novo porto: o Porto Sul. A principal motivação para esse empreendimento, diferente dos demais portos construídos aqui, consiste em uma atividade exógena à região. Com o aumento da cotação do minério de ferro, que saiu de 20,00 para 120,00 dólares naquele ano, a exploração da mina em Caetité se tornou viável. Mas a produção não tinha como ser escoada.

A única malha ferroviária disponível, a Ferrovia Centro Atlântica (FCA), que passa próximo à região mineradora, é defasada, ainda com traçado sob o paradigma tecnológico de trens a vapor e tem a Vale, concorrente da empresa exploradora da mina de Caetité, como exploradora da ferrovia.

O Porto Sul surge como a solução para esse gargalo logístico. Todavia, diferentemente do contexto da construção do Porto do Malhado, a proposta, que tinha a ligação da mina com o nosso litoral, inicialmente, por dutos, sofreu forte contestação.

Na primeira audiência pública do Processo de Licenciamento, os grupos locais de contestação, munidos de estudos técnicos, rechaçaram a Ponta da Tulha como o local designado pelo primeiro estudo locacional apresentado na referida audiência, em 2009.

A partir daí, com um novo estudo, numa nova audiência pública em 2011, decorrente de um processo de maior barganha e negociação com lideranças locais, decidiu-se pela atual área, em Aritaguá, mais próxima da cidade e mais antropizada. Também alterou-se substancialmente as medidas de mitigação e compensação definidas pelo EIA/RIMA, após um processo de maior aproximação e oitiva das demandas das comunidades afetadas diretamente pela obra.

Além disso, os governos estadual e federal, na época, apresentaram obras adicionais, com relações mais próximas das atividades locais, tais como: Fiol; aeroporto internacional; duplicação da BR 415; e a nova ponte do Pontal. Noutra frente, foram assegurados recursos e apoio para a lavoura do cacau, produção do chocolate e o turismo ecológico.

A ponte foi inaugurada, a Fiol já tem o trecho que liga o local do porto em construção a Brumado, cidade vizinha a Caetité, e muito se avançou na agregação de valor das cadeias do cacau e do turismo. Houve até o recente alargamento da BR-415. No entanto, o aeroporto internacional ainda não saiu do papel, e a Fiol tem sua integridade comprometida, podendo se tornar uma estrada de ferro exclusiva para escoar minério.

Iremos tocar em cada um desses desafios nas próximas colunas. Repensar essas obras é vital para não repetirmos o erro da construção de obras com dispêndio volumoso de recursos públicos e forte impacto ambiental, tal como o Porto do Malhado, para que não se limitem ao simples escoamento de commodities.

Esses empreendimentos e obras podem ser a redenção para a região reconfigurar a sua inserção internacional, prover mais competitividade aos agentes econômicos daqui e atenuar a miséria e desigualdade crônicas que assolam a região.

Diferente do que experimentamos com a ditadura miliar, que deixou como legado essa precária infraestrutura disponível, o contexto democrático nos permite cobrar, seja por voto ou vias institucionais, que os erros do passado não se repitam no presente.

Henrique Campos de Oliveira é ibicariense, doutor em Ciências Sociais pela UFBA e professor do Mestrado em Direito, Governança e Políticas Públicas da Unifacs.

Henrique C. Oliveira: "Lula exporta capacidade de gerar consensos"
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O sul da Bahia não saiu ileso desse processo. O projeto de uma ferrovia sobre a antiga estrada de chão que ligava o nosso litoral a Minas Gerais, passando por Vitória da Conquista, foi substituído pelo predomínio das rodovias.

Henrique Campos de Oliveira || henrique.oliveira@ecossistemaanima.com.br

O movimento pela inserção internacional do sul da Bahia como santuário da Mata Atlântica perpassa, invariavelmente, por sua conexão física com o mundo. Não adianta elucubrar sobre projetos e ações envolvendo a internacionalização de seus produtos e serviços, se não tivermos meios de transporte, principalmente, para prover competitividade e previsibilidade à nossa presença nos mercados nacionais e internacionais.

Como a história nos ajuda a (re)pensar as formas como viemos e aspiramos nos integrar?

Inicialmente, no final do século XIX, as sacas de cacau eram concentradas no leito do Rio Cachoeira, na altura do Banco da Vitória, e embarcadas em canoas até um trapiche no Malhado, de onde seguiam de navio para Salvador.

Com a expansão da exportação do cacau, veio a construção do primeiro porto de Ilhéus, no Pontal, com tentativas de construção datadas de 1909, com atuação protagonista de Antônio Berílio de Oliveira. Sob muita contestação de interesses ligados à capital baiana, sua conclusão só se deu em 1926.

Desde 1911, sob exploração da South Western Rail Way Company Limited, já existia a ferrovia que ligava Ilhéus a Uruçuca. Originalmente, o elo foi pensado para conectar o litoral ilheense a Vitória da Conquista.

Quando a indústria automobilística avança e as ferrovias trocam a maria-fumaça por locomotivas movidas a combustão, há uma inflexão na forma do transporte terrestre de carga, principalmente. Nesse contexto, ocorre uma mudança no planejamento e na implementação de políticas de transporte no país, com fortes impactos na nossa região. De 1930 a 1980, a malha ferroviária brasileira é substituída por rodovias.

Há uma convergência de fatores que nos ajudam a compreender esse fato. A transição da malha ferroviária para o novo paradigma tecnológico de combustão implicava em muito gasto, porque, além das locomotivas, essa substituição exigia que fossem alterados os traçados das estradas de ferro. Era preciso suprimir curvas fechadas e aclives acentuados para garantir segurança ao movimento da composição extensa dos comboios de vagões puxados por trens movidos a diesel.

Também avia pressão significativa da indústria automobilística para a construção de estradas que viabilizassem a comercialização de carros e caminhões. A construção de estradas era – e ainda é – mais barata do que a de ferrovias. Além do mais, o modal rodoviário atendia à necessidade estratégica de garantir a integração física nacional, ao dar mais flexibilidade ao transporte terrestre, permitindo operações porta a porta.

De Getúlio Vargas aos militares, a nossa matriz de transporte saiu de uma predominância ferroviária para rodoviária, na contramão do que ocorria nos países desenvolvidos de dimensão continental.

O sul da Bahia não saiu ileso desse processo. O projeto de uma ferrovia sobre a antiga estrada de chão que ligava o nosso litoral a Minas Gerais, passando por Vitória da Conquista, foi substituído pelo predomínio das rodovias.

Com isso, o porto do Pontal perdeu a sua integração ferroviária. Além do mais, Já no início dos anos 1940, o porte dos navios não condizia com a profundidade do canal entre a Praia do Cristo e o Morro de Pernambuco, hoje à sombra da ponte Jorge Amado.

Daí surgiu a ideia do Porto do Malhado, que entra em disputa com outra alternativa, a construção do Porto de Campinhos, na Baía de Camamu, próximo do refúgio turístico de Barra Grande. Esse porto seria usado como base para o envio de material para a construção de Brasília, via BR-030, sem pavimentação até hoje.

Para a sorte da conservação da fauna e flora da Baía de Camamu, nessa competição, sob forte influência de cacauicultores e políticos locais, os recursos do Banco Mundial foram destinados à construção Porto do Malhado.

O projeto original era construir, junto com o distrito industrial de Ilhéus e com as empresas transnacionais moageiras, o polo logístico e produtivo do cacau. Todavia, o porto inaugurado em 1972 já se mostrava defasado e ocioso em 1978, constituindo-se como mais um item da coleção de elefantes brancos do governo militar.

Ao longo do letárgico e conturbado processo de construção do novo porto, o cacau era transportado pelo serviço de alvengarias, chatas, entre o porto do Pontal e os navios atracados no mar aberto, diante da Avenida Soares Lopes. Acidentes eram comuns, com perdas significativas de carga. As exportações eram registradas por Salvador. As casas exportadoras da capital e aqueles que exploravam o serviço de alvengaria ganhavam, a região perdia.

O Porto do Malhado foi construído sem integração ferroviária e com um aparelhamento defasado, sem contar o impacto ambiental, que intensificou a erosão na orla norte de Ilhéus e o assoreamento da Praia da Avenida.

O mundo começava a usar contêineres para movimentar cargas. Assim fizeram as empresas de beneficiamento do cacau do também recente Distrito Industrial de Ilhéus. Os derivados simples das amêndoas de causa – manteiga, pasta, licor etc. – eram compartimentalizados em tuneis e transportados por contêineres, circulando por rodovias, até o escoamento portuário via Salvador e Santos.

Para completar esse cenário, em paralelo à infraestrutura de transporte terrestre e marítima, o aeroporto de Ilhéus foi construído para receber aviões da década de 1940 e não recebeu melhorias capazes de adaptá-lo à evolução das aeronaves.

As decisões políticas e econômicas que orientaram a trajetória resumida acima impõem os seguintes questionamentos. Aprendemos com as lições do passado? A construção do Porto Sul e da Ferrovia de Integração Oeste-Leste (Fiol) confere ao sul da Bahia a superação do perfil defasado e limitado da sua integração física com o mundo?

Pretendo discutir essas questões na próxima coluna, ao comparar esses projetos com o que já vivenciamos, tendo como horizonte a centralidade da conservação da Mata Atlântica e a ruptura com a repetição de padrões do planejamento espacial da nossa região. Desde já, agradeço pelas eventuais comentários ou provocações dos leitores e leitoras.

Henrique Campos de Oliveira é ibicariense, doutor em Ciências Sociais pela UFBA e professor do Mestrado em Direito, Governança e Políticas Públicas da Unifacs.