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O projeto Circulação Profundanças – Mulheres em Diálogo celebra os oito anos do circuito editorial colaborativo que, em três antologias, já publicou poemas de 51 escritoras, em sua maioria nordestinas. A programação começa neste mês e segue até agosto, com rodas de conversa e oficinas gratuitas. À frente de cada encontro virtual, as fotógrafas e escritoras que fizeram a terceira edição de Profundanças.

As ações promovidas pelo circuito buscam mitigar a desigualdade de gênero que ainda caracteriza o campo editorial brasileiro. Pesquisa da professora da Universidade de Brasília, Regina Dalcastagnè, publicada no livro Literatura brasileira contemporânea: um território contestado, em 2012, revela que, de 1990 a 2004, 72% dos romances brasileiros publicados pelas maiores editoras brasileiras tiveram autoria de homens.

Para ampliar os espaços de divulgação dos escritos de mulheres, Profundanças também ganha site próprio, www.profundancas.com, onde é possível acessar gratuitamente todas as antologias que compõem o projeto.

MULHER E LITERATURA EM CENA

A circulação promoverá oito momentos em que o público poderá compartilhar vivências e dialogar com as autoras e fotógrafas participantes do livro Profundanças 3. A programação de maio já está definida.

A primeira roda de conversa será no dia 11 de maio, às 19h, no canal www.youtube.com/profundancas. Nela, dialogam as escritoras Yasmin Moraes, Vânia Melo, Isabelly Moreira e a fotógrafa Maria Ruana. O mote do encontro será a resistência de mulheres no campo das artes.

Já a oficina Pelas veredas da poesia do Pajeú, ministrada por Isabelly Moreira, acontece no dia 21 de maio, das 14h às 17h. Nessa atividade o público poderá conhecer a poética de tradição oral secularmente praticada no sertão do Pajeú (Pernambuco), território conhecido como berço imortal da poesia. As vagas são limitadas e a inscrição gratuita pode ser feita no site. Haverá emissão de certificado para quem se inscrever na oficina e na roda de conversa.

ESCREVER ACIMA DE TUDO

Comumente, os poemas e a vontade de fazer literatura não encontram terreno fértil para florescer. Na contramão deste quadro, 24 escritoras da Bahia, Pernambuco e São Paulo nasceram para o mundo da literatura em Profundanças, com suas primeiras publicações.

Para a idealizadora do circuito editorial, Daniela Galdino, tantas conversas com mulheres potentes causaram perturbações. “E o incômodo maior era esse: as gavetas engolindo tantos escritos. A cena se repete em lugares tão díspares – Recife, Itabuna, Feira de Santana, Ilhéus, Garanhuns, Brumado, Salvador. Gaveta: vala comum? Dessa perturbação surgiu a ideia de organizar uma antologia literária”, relembra.

Para a pernambucana Odília Nunes, viver é o que inspira a escrita. “É bonito saber de meus escritos indo além do meu caderno. Minha primeira publicação ser em conjunto, como foi Profundanças, é algo que me alegra bastante”, conta.

Autora de “Na terra quero ficar”, um dos textos da terceira antologia, Odília lembra que, no período de produção do ensaio fotográfico, sofreu grave acidente de carro. O primeiro impulso foi desistir de participar do livro. No entanto, a autora e a fotógrafa Renata Pires deram à situação um significado que ficaria para sempre registrado. “O ensaio foi um ritual de cura que senti de fazer no pós-acidente de carro”, lembra. A escritora raspou os cabelos e representou esse momento na ação performática que resultou no conjunto de fotografias inseridas no livro Profundanças 3. 

Publicada aos 19 anos, Yasmin Morais é a escritora mais jovem a participar de Profundanças. Vencedora do Prêmio Malê de Literatura 2019, sua produção é cada vez mais conhecida fora da Bahia. “Ter sido publicada em Profundanças foi um divisor de águas em minha carreira, em minha vida. Tive a possibilidade de estar em contato com mulheres que possuem uma poética potente, apesar de serem, por vezes, invisibilizadas devido ao contexto em que estamos”.

Fotografada por Andreza Mona, até hoje o momento do ensaio reverbera na escritora. “Me recordo das sensações que foram suscitadas durante o ensaio e do quanto me deixaram inspiradas”, lembra Yasmin. 

Já a escritora baiana Celeste Barros não parou de escrever, mesmo com a hostilidade da patroa que jogou seu caderno de poemas no lixo. Outros detalhes de sua história se assemelham à da escritora Carolina de Jesus: Celeste também precisou interromper a escolaridade ainda na infância e começou a trabalhar desde cedo como doméstica, enfrentando situações de racismo. 

A sua persistência, além de inspirar a criação da antologia, a levou ao mundo das publicações literárias pela primeira vez na edição inaugural de Profundanças, em 2014. Hoje, tem poemas divulgados em outros espaços e recitados em saraus. “Não quero ser invisível. Tenho uma relação de amor com as palavras, pois elas relatam a vida. Quero, cada vez mais, declarar a pessoa que sou por meio dos poemas e, para isso, já estou preparando meu próximo livro”, revela a escritora.

O projeto Circulação Profundanças – Mulheres em Diálogo foi contemplado pelo Edital Setorial de Literatura 2019 e tem apoio financeiro do Governo do Estado, através do Fundo de Cultura, Secretaria da Fazenda, Fundação Cultural do Estado da Bahia e Secretaria de Cultura da Bahia. A produção é da Voo Audiovisual. Mais informações podem ser acessadas nas redes sociais (@profundancas).