O Supremo Tribunal Federal (STF) retomou, nesta quarta-feira (2), o julgamento sobre a descriminalização do porte de drogas para consumo próprio. A Corte aprecia o Recurso Extraordinário 635659, com repercussão geral. Último dos quatro ministros que já votaram, Alexandre de Moraes propôs a fixação de critério nacional, exclusivamente em relação à maconha, para diferenciar usuários de traficantes.
Segundo o ministro, o artigo 28 da Lei de Drogas (Lei 11.343/2006) deixou de punir com prisão o porte de drogas “para consumo próprio”, mas não definiu critérios objetivos para diferenciar consumo próprio de tráfico. Essa definição fica a cargo do sistema de persecução penal (Polícia, Ministério Público e Judiciário), que interpreta a norma de formas diversas.
O porte de pequena quantidade de entorpecentes passou, em muitos casos, a ser qualificado como tráfico, tornando a punição mais dura e aumentando significativamente o número de presos por esse crime. Além disso, pessoas presas com a mesma quantidade de droga e em circunstâncias semelhantes podem ser consideradas usuárias ou traficantes, dependendo da etnia, de nível de instrução, renda, idade ou de onde ocorrer o fato.
Para o ministro, essa distorção decorre do excesso de discricionariedade para diferenciar usuários de traficantes. Em respeito ao princípio da isonomia, ele sustentou a necessidade de que os flagrantes de drogas sejam tratados de forma idêntica em todo o país. “O STF tem o dever de exigir que a lei seja aplicada identicamente a todos, independentemente de etnia, classe social, renda ou idade”, afirmou.
PARÂMETROS OBJETIVOS
Ele propôs que sejam presumidas como usuárias as pessoas flagradas com 25g a 60g de maconha ou que tenham seis plantas fêmeas. O ministro chegou a esses números a partir de levantamento sobre o volume médio de apreensão de drogas no Estado de São Paulo, entre 2006 e 2017. O próprio Alexandre de Moraes conduziu o estudo em conjunto com a Associação Brasileira de Jurimetria. A pesquisa abrangeu mais de 1,2 milhão de ocorrências com drogas.
De acordo com o ministro, a autoridade policial não ficaria impedida de efetivar a prisão em flagrante por tráfico quando a quantidade de maconha for inferior ao limite. Entretanto, é necessário comprovar a presença de outros critérios caracterizadores do tráfico, como a forma de acondicionamento da droga, a diversidade de entorpecentes e a apreensão de instrumentos e celulares com contatos, por exemplo. Da mesma forma, nas prisões em flagrante por quantidades superiores, o juiz, na audiência de custódia, deverá dar ao preso a possibilidade de comprovar que é usuário.
NOVO ADIAMENTO
Após o voto, o relator do recurso, ministro Gilmar Mendes, pediu o adiamento do julgamento para construir uma solução consensual, diante dos novos argumentos e da mudança das circunstâncias desde 2015, quando apresentou seu voto, como a implementação das audiências de custódia. Inicialmente ele votou para descriminalizar todas as drogas para uso próprio.
Nos outros dois votos apresentados anteriormente, o ministro Luís Roberto Barroso propôs a descriminalização, exclusivamente em relação à maconha, do porte de até 25 gramas ou a plantação de até seis plantas fêmeas para diferenciar consumo de tráfico, até que o Congresso edite lei sobre o tema. Já o ministro Edson Fachin considera a regra inconstitucional exclusivamente em relação à maconha, mas entende que os parâmetros para diferenciar traficantes de usuários devem ser fixados pelo Congresso Nacional.