Déri (penúltimo agachado à direita) no jogo de despedida de Garrincha, em Itabuna
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O sucesso de Déri chamou a atenção dos times da capital, tanto assim que foi negociado para o Galícia, que o colocou numa vitrine especial do futebol brasileiro. Alegria maior foi quando escalado para jogar contra o Santos de Pelé, com quem posou para foto, recordação que tem até hoje guardada com carinho.

Walmir Rosário

Todo menino bom de bola é o primeiro a ser escolhido no baba, um de cada lado, para não desequilibrar a partida, e até “os pernas-de-pau” tem seu lugar, na falta dos que têm mais intimidade com a bola. Outra meio de ser escolhido de primeira é ser o dono da bola, pois do contrário não terá jogo. Esses são os métodos mais tradicionais, sendo o da meritocracia o mais utilizado.

E um dos meninos escolhidos de primeira nos campinhos do Lava-pés e da Borboleta, nas proximidades da atual estação rodoviária de Itabuna, na década de 1960, era Déri, ou melhor, Derivaldo Alves da Silva. Sua pequena estatura e seu corpo magro não representavam problemas, ao contrário, facilitava “ciscar” em campo com mais facilidade, driblar os adversários e marcar o gol.

E o menino Déri faz fama e “encheu os olhos” de jogadores mais velhos e técnicos dos times de camisa, que viam nele um craque em potencial e que deveria ser lapidado para jogar num dos times amadores no campo da Desportiva. Não demorou e já estava matriculado na Academia de Futebol Grapiúna, comandada pelo cirurgião-dentista Demósthenes Lordelo de Carvalho.

E o garoto prodígio não queria pouco, e passou a se espelhar no futebol jogado pelos grandes craques da época, como Pelé e Garrincha, em São Paulo e Rio de Janeiro, além dos irmãos Riela, Tombinho, Santinho, Neném e outros da Seleção Amadora de Itabuna. Sem demora recebe convite para treinar – também – no quadro aspirante do Janízaros, time em que jogavam seus ídolos.

Se em campo Déri aprendia o futebol com os professores celebridades, fora era apadrinhado dos diretores Zelito Fontes e Antônio Heckel, que se preocupavam com a formação do homem, do cidadão Déri. Sem dúvida alguma, foi um excelente aluno e não demorou dividir o campo com o goleiro Luiz Carlos, Tombinho, Neném, Nocha, Piaba, Jurandir, Santinho, Florizel. Aos poucos o franzino ganhava condição física e técnica.

Déri foi se firmando no meio-campo, saindo sempre que podia para o ataque, tanto pela direita como pela esquerda. E a cada oportunidade que aparecia lá estava ele marcando gols, o que gostava. E Déri aproveitava a sua rapidez e a marcação cerrada dos adversários nas celebridades para se tornar goleador. Com Tombinho desenvolvia jogadas combinadas nos treinamentos, deixando os adversários apavorados.

Naquela época, em Itabuna, não havia programa melhor nas tardes de domingo do que assistir aos jogos do campeonato amador no campo da Desportiva. Pouco importava contra que times jogavam, a torcida lotava o estádio, pois confiava na qualidade do futebol praticado. Nos jogos da imbatível Seleção de Itabuna, então, era preciso chegar cedo para garantir um lugar melhor na geral ou na arquibancada.

E o sucesso de Déri chamou a atenção dos times da capital, tanto assim que foi negociado para o Galícia, que o colocou numa vitrine especial do futebol brasileiro. Alegria maior foi quando escalado para jogar contra o Santos de Pelé, com quem posou para foto, recordação que tem até hoje guardada com carinho. E, ao final do jogo, o placar marcava 2 X 2, um empate com sabor de vitória.

E na vitrine do Galícia chegou a ser cobiçado por várias equipes brasileiras e até da Espanha, esta lhe fez uma proposta irrecusável. Porém, o amor pela família falou mais alto e Déri continuou no “Demolidor de Campeões”, que tinha como técnico o zagueiro e lateral Nílton Santos, a Enciclopédia do Futebol, com quem aprimorou os fundamentos e disciplina tática.

Déri foi um dos componentes da primeira equipe do Itabuna Esporte Clube, recém-criado e profissionalizado, ainda prestes a completar os 17 anos. Passou a integrar o meio-campo do Itabuna ao lado de Bel, Lua Riela, Élcio Jacaré. Outra grande passagem de Déri pelo Itabuna Esporte Clube se deu na década de 1970. Na inauguração do Estádio Luiz Viana Filho, hoje Fernando Gomes, em 28 de julho de 1973, teve uma atuação brilhante e ainda marcou os dois gols contra o Vitória e saiu como o herói da partida, no empate por 2 X 2.

Na Bahia, Déri também passou pelo Atlético de Alagoinhas, o Leônico, no qual foi campeão do torneio de acesso, e o Vitória. Mas foi em Sergipe que se consagrou como o grande ídolo futebolístico. Jogou pelo Confiança, depois no Sergipe e Itabaiana. No Confiança se sagrou campeão em vários anos e considerado o melhor time do estado. Na transferência para o Sergipe, Déri sofreu bastante com os torcedores do Confiança, que não admitiam a mudança. Eram vaias de um lado e aplausos do outro. No Itabaiana também foi campeão por diversos anos.

Déri, campeão por vários anos no Itabaiana

Em Sergipe, o conceito de Déri era tamanho, que era pressionado a enveredar pela política, com convites para se filiar a vários partidos e se candidatar a deputado ou vereador. Soube dispensar os chamamentos e preferiu continuar a jogar futebol. Somente nos estádios sergipanos jogou futebol por longos 10 anos e até hoje é lembrado e endeusado pelos torcedores dos times pelos quais jogou.

O mesmo conceito Déri goza em Itabuna, onde mora. Depois que abandonou o futebol, trabalhou para diversos empresários dos ramos do comércio e agropecuária, além de atuar no comércio de veículos. Atualmente está afastado das atividades econômicas e, aposentado, convive mais próximo de sua família. Atualmente, pouco sai de casa, onde recebe os amigos para bate-papos, geralmente sobre futebol, atividade que se destacou por longos anos.

Déri, um craque a ser sempre lembrado.

Walmir Rosário é radialista, jornalista, advogado e além de autor de livros como Os grandes craques que vi jogar: Nos estádios e campos de Itabuna e Canavieiras, disponível na Amazon.

Piaba, primeiro em pé, à esquerda, era de família pródiga em craques do futebol
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Piaba foi convocado para a Seleção de Itabuna e já em 1961 terminou o Campeonato Intermunicipal como bicampeão. Daí não saiu mais até a conquista do hexacampeonato

 

 

Walmir Rosário 

Custo a acreditar que o craque já nasce feito, embora tenha minhas dúvidas sempre me vem à mente a história de determinados jogadores de futebol do passado, que já apareceram “arrepiando” nos campinhos de baba, tanto faz na zona rural ou na cidade. É certo que, por mais modesto que tenha sido, sempre atuava um “jogador técnico” nos diversos times de futebol por esse Brasil afora.

No caso em questão, me refiro a Piaba, um itajuipense baixinho que “sobrava” nas zagas e meio campo dos times pelos quais passou, e tinha lugar assegurado na Seleção de Itabuna amadora, a hexacampeã baiana. E Piaba fazia parte de uma família pródiga em craques, com os irmãos Almir, Abel, Aloísio, Luiz e Ariston, jogadores importantes nos clubes de Itajuípe, Buerarema, Ibicaraí, Ilhéus e Itabuna.

Batizado Antônio Avelino dos Santos, nasceu em Itajuípe em 26 de outubro de 1935 e o apelido Piaba veio do seu comportamento e estilo de jogo, pela forma esguia, escorregadia, serelepe de tomar a bola e se desvencilhar dos adversários. Assim que saiu da fazenda Independência, onde foi criado e veio residir em Itajuípe, começou a aprender o ofício de alfaiate com o mestre Boca-rica, o mesmo que lhe deu o apelido.

E foi o Boca-rica – um mestre de alfaiataria de renome – que apadrinhou Piaba em sua famosa oficina e nos campos de futebol, atuando pelo Independente, Internacional e o lendário Bahia de Itajuípe. Com o tempo, Boca-rica se muda para Ibicaraí, e não abre mão do seu aprendiz de alfaiate e promessa de craque. Na nova cidade, Piaba dá um show de bola e se torna revelação.

No Independente de Itajuípe, de Litinho (Wanderlito Barbosa), chamava a atenção a atuação de duas famílias, que praticamente completavam o time inteiro. Eram Piaba e os cinco irmãos, além do próprio Litinho e seu irmão Bel. Esse era um pequeno exemplo da quantidade de craques itajuipenses que jogavam em sua cidade, além de Itabuna, Ilhéus e até em Salvador, a capital do estado.

Mas Piaba dá saudade de casa e retorna a Itajuípe, passando a jogar no lendário Bahia. Considerado um dos maiores craques, é também convocado para a Seleção de Itajuípe. E não era por menos, pois o Bahia chegou a ser considerado o time do século da região cacaueira. Com o crescimento de Piaba no futebol passou a ser cobiçado pelos grandes clubes das cidades de Itabuna e Ilhéus.

E o Flamengo de Ilhéus, de Gildásio Almeida, foi mais rápido e conseguiu fechar contrato com Piaba, levando o craque para a cidade rival de Itabuna. O goleiro Antônio Pires, do Bahia de Itajuípe e do Janízaros, ainda lembra que o dirigente do Fluminense de Itabuna, Frederico Midlej, e o itajuipense Hemetério Moreira, diretor do Janízaros, disputaram a vinda de Piaba para Itabuna, queda de braço vencida pelo Fluminense. Posteriormente, Piaba se transfere para o Janízaros, como queria o amigo Hemetério Moreira.

Em Itabuna, como era praxe entre os jogadores de Itajuípe, Piaba chega pra ficar, encantando pelo seu futebol sério e decisivo, despertando a atenção de outros clubes. O atleta itajuipense também jogou pelo Flamengo, sagrando-se campeão em 1963, com o timaço formado por Luiz Carlos, Abiezer, Zé David, Leto, Péricles, e Piaba; Gagé, Maneca, Tertu, Tombinho e Luiz Carlos II.

Apesar de sua pequena estatura – 1,66 metro de altura – Piaba tinha disposição para cabecear e bolas altas não eram problema. Possuía uma grande impulsão, sendo constantemente comparado ao seu companheiro de seleção, Ronaldo Dantas, outro baixinho do futebol que não se amedrontava com adversários mais altos. Piaba e Ronaldo se revezavam nos jogos da seleção.

Piaba foi convocado para a Seleção de Itabuna e já em 1961 terminou o Campeonato Intermunicipal como bicampeão. Daí não saiu mais até a conquista do hexacampeonato, em janeiro de 1966, embora o certame seja relativo a 1965. Na seleção de Itabuna foi decisivo na conquista do Hexacampeonato baiano e sua figura em cima do carro do Corpo de Bombeiros com o rosto enfaixado chamou a atenção.

Na partida final, Piaba levou um pontapé no rosto, aplicado num choque com o jogador Meruca, que até hoje gera controvérsias se foi um simples encontrão ou premeditado para tirar o craque de campo, pois seu substituto estava contundido. Meruca foi o mesmo jogador que não conseguiu evitar a cabeçada de Pinga e que resultou no gol da vitória da Seleção de Itabuna e no hexacampeonato.

A chegada da Seleção itabunense que acabara de conquistar o Hexacampeonato Baiano de Futebol amador em Itabuna foi uma verdadeira apoteose, numa comemoração sem precedentes. Na chegada foi realizada uma carreata com os jogadores desfilando em cima do carro de bombeiros, cedido pela Prefeitura de Itabuna. A imagem mais marcante era a de Piaba com o rosto inchado e coberto com gases e faixas, contrastando com a alegria estampada na fisionomia dos jogadores e da torcida.

Piaba foi um dos poucos jogadores a atuar pelas seleções de Itajuípe, Ilhéus e Itabuna, além do Galícia, de Salvador. Devido a alguns problemas de saúde, Piaba retorna a Itajuípe, sua terra natal. Até atingir os 30 anos de idade, o atleta não bebia nem fumava. Porém, o laudo médico apontou o uso do cigarro como a causa de sua morte, em 15 de julho de 1997.

Piaba morreu triste, no hospital, sem conseguir ver os seus companheiros de sucesso no futebol.

Walmir Rosário é radialista, jornalista e advogado.