Seu Clarindo, aos 78, é honrado, digno e sério. Como um preto-velho, um pai, um Homem. Que a sorte lhe dê mais sorte, seo Clarindo. Nada perdeu o senhor ao dizer, diante das câmeras da TV, a máquina de fazer doido, que o juiz não aceitou a petição do seu advogado. Nada.
No Dia Mundial da Liberdade de Imprensa, 3 de maio, a TV foi lá mexericar. Mesmo com liberdade, o jornalista não observou a dignidade do entrevistado. Citou seu infortúnio, com a perda de móveis e cadeiras de sua cantina arrematados num leilão da Justiça do Trabalho, mas nada acrescentou no seu reme reme ao vivo em busca da audiência incauta e fácil.
A menos de 10 dias para a data em que a Lei Áurea comemora 130 anos, o empresário negro, magro, cabelos carapinhos brancos como a luz da lua e lendário personagem do Pelourinho, em Salvador, embora se reportasse que tivesse passado mal depois da ação dos oficiais de Justiça, manteve-se íntegro, digno e preocupado com o destino do lugar onde vive e trabalha e não com cacarecos que o repórter disse ter vindo da Oropa.
Que lição do preto velho mais querido do Pelô! Que beleza e demonstração de seriedade de um cidadão de 78 anos que ainda luta com sua voz pequena e ainda firme para que as cerca de 180 casas comerciais dos históricos quarteirões da velha Bahia se mantenham abertos, gerando empregos para os trabalhadores, atração para os turistas e dignidade para quem do trabalho vive.
A tocante entrevista nem parecia com um ancião. Não. Era com um homem digno que, certamente, não pode indenizar um ex-empregado que o levou à Justiça do Trabalho em busca do seu direito. Nada contra. Aliás, a Justiça deveria ter exatamente a função de fazer cumprir regramentos sociais mínimos, as tais normas de conduta que aprendíamos na disciplina Introdução ao Direito.
Chorosa, a reportagem perdeu a chance de dar voz a seo Clarindo Silva, da Cantina da Lua, um lugar imagético da Salvador camarada, hospitaleira e amiga. Aliás, a cantina é onde se respira a maior baianidade que se perde a cada dia seja pela volúpia imobiliária, seja pela tolice de uma violência sem limites, seja pela estupidez humana que, com inigualável velocidade, vai de encontro ao não se sabe o quê. Todos temos pressa em direção ao fim do mundo que jamais chega!
Seu Clarindo, aos 78, é honrado, digno e sério. Como um preto-velho, um pai, um Homem. Que a sorte lhe dê mais sorte, seu Clarindo. Nada perdeu o senhor ao dizer, diante das câmeras da TV, a máquina de fazer doido, que o juiz não aceitou a petição do seu advogado. Nada.
Nós é que ganhamos com sua altivez e sua honestidade em confirmar a pauta e passar a sensação de que a Justiça começa mesmo em casa. Embora a 130 anos ainda aguardemos o que a princesa Isabel prometeu e não cumpriu a nós negros e brasileiros: Justiça!!
Axé…
Luiz Conceição é jornalista.