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Marcos Vinícius dos Anjos | vinicius.anjos@uol.com.br

Não é só o fato de se apropriar do alheio, não se trata apenas do roubo, mas da capacidade de ser predador, do presente e do futuro, da condição do Estado de atender às imensas demandas sociais existentes no Brasil.

Começa a ganhar forma no Brasil um fenômeno no mínimo inusitado, o movimento emergente motivado pelo esgotamento da tolerância com a corrupção. Inicialmente incendiado nas redes sociais, agora ascende às ruas como aconteceu no último dia 07 de setembro, quando ocorreram manifestações contra a corrupção na maioria das cidades brasileiras. O curioso é que esse levante não está sob a tutela das agremiações tradicionais de esquerda e centro esquerda, não se observa nele a presença de flâmulas, faixas e estandartes vermelhos, tão tradicionais em movimentos de massa recentes no país.
A indignação crescente dos descontentes não se prende somente aos estragos dos “malfeitos”, mas também da constatação de que só há delitos e não há punições (só há danos, não há responsabilizados), ou melhor, pode-se supor que até hoje, o crime têm compensado para os corruptos brasileiros.
Não é preciso desfilar aqui o longo elenco de episódios recentes, brandamente intitulados na atualidade, por algumas autoridades, simplesmente de “malfeitos”, para atestar a origem desse sentimento espontâneo de constrangimento com os rotineiros escândalos envolvendo parlamentares, membros do executivo, servidores públicos e até mesmo do judiciário.
A saturação com o fardo da corrupção e seus males parece começar a mover as pessoas e, dessa vez, os pseudo-esquerdistas entranhados no poder somente se ressentem das manifestações. Devem estar desacostumados ao exercício de reivindicações alheias ao rateio partidário de lotes dos cargos públicos e de seus orçamentos, pois se esqueceram das massas e suas necessidades. É como se a ascensão ao poder revelasse a seguinte e triste face: “agora é a nossa vez!”. De fato, não há distinção entre os “malfeitores” de hoje e de ontem, embora tenham origens distintas concorrem na mesma voracidade e impacto sobre a coisa pública.
O pior de tudo é a capacidade de se servir do erário público e perpetuar toda a problemática social para, sob os mais inflamados discursos de assistência, construção da igualdade e promoção do desenvolvimento, apossar-se das licitações com o propósito de acessar e desviar os recursos públicos. Não é só o fato de se apropriar do alheio, não se trata apenas do roubo, mas da capacidade de ser predador, do presente e do futuro, da condição do Estado de atender às imensas demandas sociais existentes no Brasil.
A corrupção, em última instância, retira o alimento da boca das crianças e as suas salas de aulas, também condena à morte muitos dos que recorrem ao SUS, celebra o atraso, as desigualdades e os desequilíbrios regionais, além de aniquilar a capacidade do Estado de orientar e disciplinar o investimento, contendo os ímpetos mais perversos do mercado.
No fundo, todos sabem que a possibilidade do Estado conviver com os corruptos, põe por terra as suas boas intenções, decreta uma espécie de morte lenta da sociedade, sofrida, agonizada com o flagelo dos órfãos e desamparados do Estado vitimados pelo acirramento do antagonismo de classes.
A quem diga que a corrupção no Brasil é endêmica, mas na verdade ela é uma herança ibérica, potencializada pelo estilo de vida dos nossos irmãos lusitanos, principalmente nas imediações e durante parte do período mercantilista, quando as práticas corruptoras eram aliadas na sustentação do império português, ou seja, têm raízes muito profundas. Mas, isso não isenta a vocação do Estado brasileiro para se degenerar e afastar-se dos reais interesses que deveriam movê-lo, sua histórica negligência com os recursos dessa terra, sua incapacidade de olhar para o potencial interno, prendendo-se a tentativas sempre frustrantes de transplantar culturas e estilos de vida alheios.
O Brasil aderiu desde a primeira república a um nacionalismo barato, que nunca resistiu ao primeiro suborno, com uma identidade patriota frágil, vitaminada pela longínqua dedicação à internacionalização desvantajosa das suas riquezas. É como se o DNA brasileiro, das possibilidades de desenvolvimento, já tenha nascido dependente.
No Brasil de hoje, dorme-se e acorda-se sob o mais pesado estigma da corrupção de toda a sua história. Neste momento em que os sopros do capitalismo mundial estão ao seu favor (fugindo da crise de dissolução dos ativos no velho mundo e nos EUA) se a percepção cristalina das precariedades sociais no presente e do roubo das oportunidades do futuro aliado ao vilipêndio do Estado, não for capaz de indignar e mover as pessoas, o que mais será?
Para os poucos observadores que ainda refletem sobre o Estado, o intrigante é perceber que as possibilidades de mudança, assim como no oriente médio, começam a emanar das massas independentes e penalizadas pelos descalabros dos corruptos. No Brasil há muitos destes “malfeitores”, ainda travestidos e escondidos nas ideologias partidárias para encortinar seus reais interesses.
A boa prudência e o exercício da honestidade nos obrigam a reconhecer que além dos homens devassadores do erário estatal, existem alguns bons, ainda pautados pelo espírito público decente e pela consciência do papel do Estado, independente de legendas, siglas ou cores partidárias. Também não se trata aqui da abstenção à política e sim do resgate da boa política, isenta dos interesses individuais que não possam ser alinhados aos do coletivo.
Por fim, se a tendência de crescimento desse movimento, ainda ancorado num sentimento comum de indignação e constrangimento com o comportamento e a impunidade dos corruptos, não se desvirtuar nem for capturado ou “aparelhado” por interesses de ocasião, poderá iniciar no Brasil um período de mudanças nas práticas políticas, puxado pelo vigor e visão de mundo dessa nova geração. E, talvez, se alinhado com a seriedade no trato da nova condição econômica de inclusão, aumento do poder aquisitivo, capacitação e consolidação do mercado interno (que o contexto capitalista nos impõe), dar-se-á um próspero ciclo de crescimento com algumas conquistas na melhoria da qualidade de vida. Porém, se esse movimento for abortado, se o povo brasileiro não tiver a capacidade de reformar as suas instituições tanto pela justiça já tardia, quanto pela via eleitoral, estará mais uma vez atuando como exterminador de muitos dos sonhos de conquistas sociais, infelizmente ainda legadas ao futuro.
Marcos Vinícius dos Anjos é professor do Departamento de Administração e Ciências Contábeis da Uesc.

0 resposta

  1. Zelão diz: – Indignação só, não basta!
    É só o princípio! Mesmo que louvável, não é suficiente que o povo sai às ruas bradando a sua indignação contra a corrupção que deixou de ser endêmica e passou à epidêmica, grangenando todo o organismo dos poderes da república.
    Não esperem que se repita o episódio histórico do “impechament” do ex-presidente Collor de Mello, quando os “caras pintadas” saíram às ruas, bradando contra a corrupção, que se comparada com a existente hoje no país, seria facilmente tipificada como “crime de menor monta.” Diferentemente, havia naquele período uma “cabeça a ser posta na bandeja.” Foi fácil então para os nossos legisladores e juízes escolherem quem deveria ter a cabeça decepada do corpo.
    Agora, diante da epidemia que se alastrou, seria pedir demais que todos, voluntaria e altruisticamente, pusessem a própria cabeça no cadafalso.
    É só esperar que a “voz do povo nas ruas” se torne rouca e inaudível e que a mídia dê uma trégua cúmplice, para que tudo retorne a mais perfeita desordem, até a próxima eleição, quando a maioria da população, desencantada de tudo e descrente na sua própria força de mudança, elegerá muitos dos que hoje, comprovadamente, cometem os crimes de corrupção, por julgá-los menos perniciosos, por já conhecidos, que qualquer novo nome, que por desconhecidos, podem vir a representar um mal maior.

  2. Quando se fala em corrupção fico triste e decepcionada, o dia não tem sentido para mim,tudo parece estar no fim. Até quando estas pessoas ficarão prêsos nas armadilhas do diábo?
    Corrupção é andar lado a lado com o diábo e fazer o que ele gosta.
    Para mim só existe uma punição; a MORTE carnal, porque espíritualmente eles já estão mortos, não sentem mais nada, não existe o minimo de amôr. Quantos doentes sem medicamentos, quantas familias com fome, quantas dores, quantos suícidos, á corrupção acompanha tudo o que é mal. Desejo que estas pessôas se libertem o quanto antes, se arrependam e reparem todo o mal que fizeram, para que possam encontrar o perdão e ser uma nova possôa E VIVER EM CRISTO

  3. Mandou muito professor.
    A corrupção é uma imensa mancha de sugeria nas sociedades. Vejam aqui em Itabuna, comprovadamente surrupiaram o dinheiro da câmara, os nobres vereadores brigaram entre eles e toda a lama veio à tona, porém nada foi feito, ninguém foi punido, pois não houve apuração.
    Acho que gostamos mesmo é de estar no mínimo próximo dessa sujeira, independente de ficarmos enlameados ou não, já que não há qualquer resistência.
    Excelente texto, uma boa porrada na consciência de todos. Quem sabe um dia aprenderemos a votar e a exigir o que é certo.

  4. boa visão do professor, é isso mesmo só danos e falta punição. precisamos mudar as leis para crimes de corrupção seja considerado hediondo.

  5. Em meio a tantas denúncias e apurações de corrupção nos últimos anos, não consigo me lembrar de nenhum político preso ou condenado. Realmente professor Marcos, o senhor têm razão, nesse país o crime compensa muito para políticos corruptos.

  6. A bem da verdade está na moda ser corrupto ou mal-feitor. Pra que lembrar do povo, contentam-se com tão pouco e o muito que sobra tem de ser apropriado por alguém e gasto também. O mal é temos muitos recursos e somos muito perversos. Estou convencido de que o certo é cada um pegar a sua parte e o mais espertos pegar a de muitos. Viva os corruptos brasileiros abaixo o povo. Afinal o povo também quer se candidatar!

  7. Seu Pimenta o senhor esta errado, ou melhor, o povo está errado e os políticos corruptos estão certos. Comprar voto, pôr dólar em cueca, fazer remessa de dinheiro para o exterior, financiar e bancar laranjas, construir mansões, comprar coberturas e carros de luxo, todas essas coisas e tantas outras fúteis custam muito caro, por isso muitos dos pobrezinhos políticos têm de roubar. O povo é só um detalhe, chato e sem perspectiva mesmo. Não precisa nem de escola nem de saúde, só comer para produzir o que deve ser subtraído pela corrupção, esse é o sistema.
    Brincadeiras a parte, Parabéns ao blog Pimenta pelo texto.

  8. A corrupção emmpobrece o Brasil, tira empresas serias do mercado via concorrência desleal,
    Mas o fenomeno longe de ser a cara do brasileiro, somo um povo que aceita a corrupção pois achamos que a ocasião faz o larão.
    corromper de longe se refere somente a vida dos politicos:
    Veja em Itabuna : O comercio estende seu limite para a via publica, carros param na Cinquntenario e se lixam para os quem atras, colcam adeisocvo apoiando a Capitão para terem algum privilegio na bliz da policia, quem não busca sonegar o impsto de renda e se vanglrie disto aos amigos, quem não busca um cargo publico para depois descobrir o que elste cargo faz.
    Quem não assiste calado medico com cargo publico baterem o ponto e irem para seu consultorio particular.
    Quem nunca presencioiu um motorista furar a fila no transito?
    TODOS os governantes está onde está pelo voto do povo. Não adianta reclamar e depois votar nos mesmos.
    Veja o presidente Lula , teve em seu governo a maior onda de corrupção ,mas terminou com um indice de 80%
    Dilma já percebeu que é melhor manter a base do que fazer “faxina” que pode comprometer a governabilidade.
    Parem de reclamar e votem melhor.
    A solução está na mão do brasileiro.

  9. Esse Valdir ai, que comentou antes, meio Justo Veríssimo sabe mesmo como é que político gasta dinheiro. Não Seria ele um Político corrupto famoso de Itabuna, disfarçado fuçando este blog? KKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKK

  10. Apenas 1 detalhe, ñ vi em todo o texto da postagem, nem em nenhum dos comentários, nada, nadica de nada, sobre essa figura etérea, inatingível: o corruptor !!!O que seria do corrupto sem o seu complemento, o corruptor;Essa indignação torna-se estranhamente seletiva, pois sabemos que se existem corruptos no poder público, legislativo, judiciário, e ñ esqueçamos o setor privado, em nenhum momento vemos os formadores de opinião,a mídia tradicional-jornal impresso,televisivo,rádio, etc- investigar e denunciar os corruptores.

  11. Roni, quando se fala em corrupto ou corrupção é obvio que se inclui o corruptor pois são duas pestes iguais, conheço uma pessoa ex-proprietário de uma empresa prestadora de serviço que teve que fechar as portas porque não quis continuar participando dessas maracutaias, na época seus funcionários, acharam que êle tinha pirado essa tal empresa chegou a atender 8 prefeituras de médio porte, mas metade das faturas ficavam com os políticos e funcionários dessas cidades, e aí eu vou dizer que os corruptos são piores que os corruptores, a verdade verdadeira mesmo é a seguinte: no fundo no fundo o país inteiro gosta dessa safadeza, quem não sabe que o fenomenal bloco dos caras pintadas foi comandada pela UNE? só que agora a UNIÃO NACIONAL DOS ESTUDANTES tá cheia da grana que nem sabe onde botar dinheiro, a mídia e os políticos que na época foram contra o Color são os mesmos que hoje comandam os ataques aos cofres públicos, e a grande maioria dos eleitores que neles votam são os mesmos que embriagados morrem e matam usando o carro como ferramenta, e o problema do lixo? em qualquer lugar tá bom de jogar, a culpa vai ser mesmo da prefeitura, são tantas as safadezinhas desses inocentes brasileirinhos sempre vítimas dos políticos safados e corruptos que nem vale apenas enumera-los o resto é conversa mole pra boi dormnir.

  12. Os políticos são “o povo lá dentro”. A maioria é corrupta. Dão apoio aos que tem condição de corromper: eles são corrompidos e corruptores ao mesmo tempo. Não há como viver sem votar, nem sem viver a política. A questão é que a maioria que vota ignora os bons costumes, gostam do mal feito.
    Não fazem auto-escola, porque em Itabuna sempre tem quem patrocine o analfabetismo. Corre lá no padrinho e ele abona tudo. Aí é esssa enxurrada de motos e carros com prestação a perder de vista para os vândalos ostentarem sua pobreza moral. Ficam sem comer, mas compram moto e saem por aí se esbagaçando e aos outros. Prejuízo social em tamanho monstro, inchaço nos hospitais, encosto na aposentadoria, muitos não voltam mais ao trabalho.
    As pessoas que trabalham, tem que morrer no trabalho, porque os cálculos só veem o envelhecimento. Ninguém pede compensação das multinacionais, nada, quem paga é quem anda direito. Deixar de votar? Nunca… A Ficha Limpa foi extinta. O STJ recusou, mas o povo tem que virar a casaca! Fazer revolução! Não vai todo mundo pras paradas gay? Vamos escolher nossos representantes e substituir os calhordas.
    Parabéns, professor, pelo texto. A indignação continua, vamos usar as redes sociais. Se candidate, professor! A política é coisa de homem sério, tem que ser só para pessoas sérias.

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