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GUSTAVO HAUNGustavo Haun | [email protected]
 

Durante as duas semanas seguintes, o conhecido cacauicultor mandava alguns dos seus mais de trezentos funcionários irem ao comerciante, um ou dois por dia, para perguntar se tinha pedra de amolar para vender.

 
Sêo Oscar era um dos homens mais ricos da Bahia, com certeza o maior cacauicultor individual do mundo à sua época.
A fama dele corria léguas e mais léguas: homem previdente, astuto e trabalhador. Ninguém lhe passava a perna. Corria a estória de que até seu genro tinha tentado assassiná-lo (de olho na gorda fortuna!), porém não havia logrado êxito, pois Sêo Oscar fora mais esperto…
Havia migrado de Sergipe para o sul da Bahia em busca de terras e riquezas. E as conseguiu, com muito suor e dedicação.
O tempo passava e Sêo Oscar só prosperava ainda mais.
Certa feita ele se dirigiu ao antigo Banco Nacional – era um dos maiores correntistas da instituição – e pediu para reaver sua aplicação.
Era muito dinheiro. O Banco consultou o saldo: mais de milhões! Trabalheira danada. Contaram, recontaram. Colocaram em várias maletas o seu valioso vintém. No fim do dia, quando lhe entregaram o montante, ele disse ao gerente:
– Ô, seu menino, sabe de uma, não vou levar o dinheiro, não… Só queria saber se vocês tinham guardado ele bem, aí…
As más línguas criaram inúmeras lendas sobre Sêo Oscar, como a de que ele amarrava um comprimido de melhoral e tomava para passar a dor de cabeça constante. Quando estava bom da dor, puxava de volta o cordão, guardando o remédio para uma próxima vez…
Como disse, muitas, muitas lendas! E o homem era famoso por elas.
Mas um fato real aconteceu que supera a todos os demais, e que de forma alguma vem abonar o seu caráter, senão mostrar o seu espírito capitalista e de visão de mercado aguçadíssimo.
Juntando os dedos dos pés e das mãos não dava para contar a quantidade de fazendas de Sêo Oscar. Eram inúmeras. Todas produtivas, o que o fez colher a incrível soma de 120 mil arrobas de cacau.
Enfim, ele tinha em uma das suas “terrinhas” uma pedreira mui valiosa e que ele não sabia do fato. Depois de aplainar o local para nova cultura agrícola, várias pedras de amolar apareceram quebradas no terreno. De todos os tamanhos e formas.
Seu funcionário o alarmou para o caso, ele não se fez de rogado. Mandou-o se dirigir à maior loja de ferragens e material de construção da cidade e perguntar se o dono, Sêo Nicodemos, tinha a tal pedra para vender.
– Olha, meu filho, tenho três pedrinhas aqui, muito boas…
Sêo Oscar mandou então o trabalhador comprar as três. Seu funcionário, intrigado, ficou de orelha em pé: “Cumé que pode, o homi tem num sei quantas na fazenda dele e manda cumprá?”
E durante as duas semanas seguintes, o conhecido cacauicultor mandava alguns dos seus mais de trezentos funcionários irem ao comerciante, um ou dois por dia, para perguntar se tinha pedra de amolar para vender.
– Ô, meu filho, num tem não… Acabou! – Sempre respondia, mas pensando de si para si no faro comercial: “Meu Deus, tou perdendo um dinheiro da disgrama sem essas pedras aqui!”
Passando o tempo supracitado, Sêo Oscar telefona para o amigo, dono da loja, como quem não quer nada:
– Ô Nicó, lá nas minhas “terrinhas” descobri umas pedrinhas de amolar… Você não tem interesse, não, Nicó?
– Mas, Oscar, eu tenho e muito…
Fecharam negócio, e Sêo Oscar mandou tantas carretas de pedras para o amigo Nicó, que este, vindo a morrer trinta anos após, ainda tinha pedras de amolar para vender!
Gustavo Atallah Haun é professor, formado em Letras, UESC, e ministra aula em Itabuna e região. Escreve para jornais de Itabuna, Ilhéus e edita oblogderedacao.blogspot.com ([email protected]). É maçom, da Loja Acácia Grapiúna.

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