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A cada necessidade de crescimento ou desenvolvimento, os coronéis do cacau, do comércio e dos serviços se reuniam e se cotizavam, doando terras, recursos em dinheiro e materiais para implantar uma rede de energia elétrica, a pavimentação de uma rua, e até a construção do aeroporto.

Walmir Rosário || wallaw2008@outlook.com

Não é todo o dia que se comemora 110 anos! Uma idade respeitável para uma venerável cidade, generosa, acima de tudo, e que sempre concedeu todas as oportunidades aos que a procuram. Mesmo antes de se emancipar de Ilhéus em 1910, o distrito de Tabocas era conhecido pela sua ousadia de filha precoce que sempre buscou andar com as próprias pernas, sem a dependência financeira.

De início, mal interpretada pela mãe Ilhéus, exigente e responsável pelo futuro da filha, cujos planos e costumes da época se limitavam ao agarramento das saias e submissão ao pátrio poder. Os quase 30 quilômetros da sinuosa estrada que os separavam Itabuna proporcionavam um desejo de independência, emancipação, pois a gente desbravadora das terras do sem-fim também sabia e queria dirigir seus destinos.

Em 1909 os comerciantes do distrito de Tabocas demonstravam sua pujança e fundaram sua Associação Comercial, com sede e diretoria própria, pronta para cuidar dos seus interesses econômicos. O distrito prosperava a olhos vistos com a chegada de leva de pessoas da Bahia, do Brasil e do exterior, fazendo funcionar todas as instituições da comunidade, sem a ajuda de Ilhéus.

Enquanto lutava por sua emancipação, desbravava novas áreas, plantava e colhia cacau, produzia alimentos para sobrevivência, comercializava e os melhores produtos da moda vindos da Bahia (Salvador), Rio de Janeiro e Paris. Os cacauicultores lucravam com a colheita do cacau e construíam as casas de comércio e seus sobrados, verdadeiros palacetes.

As adversidades sofridas com as cíclicas enchentes alternadas com as secas eram superadas à custa de muitas dificuldades daquela gente nortista – baianos da caatinga, sergipanos, alagoanos –, aliada aos turcos, sírios, libaneses, portugueses e espanhóis. E massa deu liga e até hoje está amalgamada na famosa Nação Grapiúna, de novos costumes e cultura do cacau.

Por anos a fio Itabuna esteve no ranking das cidades que mais cresciam no país e passou a ser considerada uma das principais para investimentos. O comércio e serviços contribuíram decisivamente para mantê-la continuamente nessa posição de destaque. Foram construídos hospitais, escolas, melhorada a infraestrutura urbana e rural e os filhos dos coronéis do cacau voltaram das capitais diplomados, ostentando anéis nos dedos.

E Itabuna se fez cosmopolita, passou a interagir mais com Salvador, Rio de Janeiro, São Paulo e Paris, desta vez não só com as compras de catálogos, mas através das casas residenciais adquiridas nas capitais, a exemplo dos palacetes no chiquérrimo corredor da Vitória. Tudo financiado com o lucro das fazendas de cacau, produto exportado para todo o mundo.

E Itabuna não se fez de rogada ao perder quase uma dezena de distritos – emancipados –, ao contrário planejou sua economia no que mais pendia sua vocação: o comércio e a prestação de serviços, implantada com os melhores equipamentos. Época de estradas ruins e navegação de cabotagem precária, o itabunense construiu um aeroporto para chamar de seu.

A cada necessidade de crescimento ou desenvolvimento, os coronéis do cacau, do comércio e dos serviços se reuniam e se cotizavam, doando terras, recursos em dinheiro e materiais para implantar uma rede de energia elétrica, a pavimentação de uma rua, e até a construção do aeroporto. O sobe e desce dos aviões rivalizavam com muitas capitais brasileiras, devido ao alto poder aquisitivo da população.

Se o itabunense se preocupava com a economia, desprezava a política estadual e federal, mesmo elegendo deputados locais. Se ufanava da riqueza que produzia, mesmo recebendo migalhas em contrapartida. Bastava chegar ao tesouro estadual os recursos oriundos do Imposto de Circulação de Mercadoria e Serviços (ICMS) do cacau para rodar a folha de pagamento dos servidores e honrar os compromissos com fornecedores.

Não eram recursos exclusivos produzidos por Itabuna, embora grande parte foi gerada com a comercialização nas grandes empresas compradoras e exportadoras de cacau aqui localizadas. Veio a vassoura de bruxa e as aves de mau agouro vaticinaram o fim da lavoura cacaueira, a extinção de Itabuna do mapa econômico regional. Apenas ameaças que não chegaram a atemorizar o itabunense.

Aos poucos, a cidade conseguiu se recuperar e voltou a ocupar o lugar de destaque na Nação Grapiúna. Administrações desastrosas, intemperes, políticas econômicas, preços do cacau em baixa, nada disso abalou as estruturas sociais. Prova inequívoca é a pandemia da Covid-19, cujo efeito devastador não chega a paralisar a cidade, apesar dos decretos e ordens de fique em casa.

Consequência maior e mais triste é o itabunense nativo ou de coração não poder comemorar o  Dia da Cidade na verdadeira data, por ter sido antecipada. Doloroso hoje, prazeroso amanhã comemorar a volta por cima, nos moldes da cultura e tradição deste povo que não se entrega às dificuldades, pois sabe combater o bom combate, sagrando-se vencedor, como sempre.

Walmir Rosário é radialista, jornalista e advogado.

Uma resposta

  1. Verdade amigo Valmir Rosário! Itabuna e seu povo merecem todo nosso carinho, amor e atenção, fui recebido aqui ha 45 anos vindo de Santa Luzia e Canavieiras. Parabéns Itabuna.

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