A capa de "Pedra Branca" e o seu criador, Ramon Fernandes || Fotos Walmir Rosário
Tempo de leitura: 3 minutos

 

 

 

Como no juízo final, os personagens ganham o lugar que merecem na história, sem atropelos, de acordo com seus procedimentos.

 

Walmir Rosário

Em apenas duas sentadas – com muito fôlego – li o novíssimo romance Pedra Branca, sangue e poder, lançado no último sábado (10-08-24), no restaurante Porto dos Milagres, em Canavieiras, por Ramon Fernandes. O livro marca a estreia do autor na literatura, com uma obra bem engendrada e que contribui para o enriquecimento da intelectualidade regional.

A história é ambientada na fictícia Pedra Branca, pequena cidade interiorana fincada nas barrancas do rio Jequitinhonha, bem na divisa dos estados da Bahia e Minas Gerais. Como todo o romance que busca prender o leitor, já no início nos apresenta um personagem que morre cedo, mas deixa um imenso legado.

A história é bem fiel ao estilo de vida interiorano, com fortes raízes fincadas na família campestre e na pachorra das pequenas cidades, com a predominância dos seus personagens marcantes. E todos estão bem situados, cada um com seus destaques: o padre, os coronéis, os comerciantes, os políticos, o delegado, a dona do bordel, ou casa de conveniência, como queiram.

Ramon Fernandes é formado em Filosofia pela Universidade Estadual de Santa Cruz (Uesc), professor na rede particular de ensino, servidor público municipal da Prefeitura de Canavieiras e ex-secretário de Cultura. Embora com vida fincada em Canavieiras, conhece e viveu em outras cidades regionais, algumas bastante parecidas como a descrita no romance.

Daí é que após a leitura de Pedra Branca, sangue e poder tomei a liberdade e indiscrição ao perguntar ao autor se o livro era oriundo de uma história verdadeira e por ele romanceada. Respondeu que era apenas fruto de sua imaginação – criativa, digo eu, diante do bom argumento, desenvolvimento e ambientação.

Os personagens com vida breve na história saem com dignidade e os longevos sempre aparecem em bons momentos. Não sei se é redundante observar que nas cidades pequenas – no estilo Pedra Branca – as ocorrências são sempre monótonas, contrastando com os fuxicos e brigas normalmente resolvidas entre as partes, no estilo mais agressivo.

As diferenças menores são resolvidas por meio dos conselhos do delegado, que a todos conhece e há muito se tornou amigo. Mas só que mora ou morou em pequenas cidades interioranas, notadamente nas divisas de estados, conhecem de perto as rusgas entre as pessoas influentes e seus apaniguados, que vão desde as questões de terras e as políticas.

E em Pedra Branca as guerras não acontecem somente entre as diversas famílias, mas também dentre um mesmo clã, geralmente derivadas por ciúmes, posição social e riqueza. E essa questão está presente no romance com briga fraticida entre coronéis, sem faltar motivação para a expropriação de terras com o apoio dos revólveres e rifles dos jagunços.

A personalidade feminina aparece com muita distinção e força, desde a coronela, senhora de si e que comanda com mão-de-ferro suas propriedades e família. Com a ajuda de bons jagunços, defende seus bens contra pessoas da própria família; resolve sua vida conjugal de uma hora pra outra após a viuvez; ajuda seus protegidos. Uma mulher resolvida.

Também aparece com altivez e se torna personagem marcante a figura meiga da senhora do delegado, com ares de professorinha, que assume o protagonismo de uma hora pra outra, sem que alguém esperasse. Outra personagem, esposa de um coronel, vítima de maus-tratos, resolve se libertar do jugo do marido, toma uma atitude inesperada e vai viver nova relação. Esta proibida pelas leis dos homens e de Deus.

Lançamento do romance de Ramon Fernandes, no Restaurante Porto dos Milagres

Não poderia faltar na trama os forasteiros que chegam, encontram oportunidades e as aproveitam. Alguns metem os pés pelas mãos, mas conseguem se segurar devido às habilidades no relacionamento social e político. Mas como sempre nessa vida terrena, a avareza, a inveja e soberba promovem a própria destruição.

Como no juízo final, os personagens ganham o lugar que merecem na história, sem atropelos, de acordo com seus procedimentos. Os maus geralmente acabam na cadeia ou cemitério, os bons continuam distribuindo felicidade, os menos atrevidos sem destaque. Cada qual no seu quadrado, como determina Ramon Fernandes, com minha posterior aprovação. Recomendo.

Walmir Rosário é radialista, jornalista e advogado, além de autor de livros como Os grandes craques que vi jogar: Nos estádios e campos de Itabuna e Canavieiras, disponível na Amazon.

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