Advogado e doutor em Direito Efson Lima
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A disputa é pragmática e, agora, interessa converter toda a estratégia em voto. Ontem o artista foi de direita, hoje, dialoga com os interesses da esquerda e vice- versa.

 

Efson Lima

No Brasil, geralmente, não é um nascido na periferia que ocupa o “poder”, especialmente, o Executivo. Mas, é pouco provável alguém alcançar a função executiva sem um apoio das camadas mais populares. As eleições municipais de 2024 chamam bastante a nossa atenção. Os acenos para as periferias são constantes e demarcam o perfil do eleitorado brasileiro. As periferias no Brasil não são uniformes. As novelas, programas prediletos de milhões de brasileiros, já tinham sido produzidas com lastro nesse perfil e as periferias algum tempo já contribuem enormemente para o PIB brasileiro, inclusive, com uma classe média que cresceu nesse ambiente e “prefere” lá permanecer.

Segundo o IBGE, o Brasil tem mais de 10 mil aglomerados urbanos, representando aproximadamente 8% da população, em números absolutos, 16,6 milhões de habitantes. O sul da Bahia, como Ilhéus e Itabuna, as duas maiores cidades da região, possui diversas periferias e mostra o enorme tecido social. Núcleos urbanos que cresceram em decorrência da lavoura do cacau e que até hoje reclama uma solução.

Em Itabuna, determinado candidato, parece ter sua base nesse ambiente e consegue aglutinar diversos formadores de opinião em favor de seu nome.  Não sem razão, inúmeras pessoas declaram a partir desse lugar de origem e raça.  Outros tantos enxergam a oportunidade de uma pessoa com cunho mais popular alcançar a cúpula da gestão municipal.  Em Ilhéus, cidade demarcada por seus morros, muitos deles habitados pelas camadas populares, depara-se com candidatos de classe média, mas que esses cientes do desafio de receber o apoio do eleitorado, buscam os mais diferentes estratagemas para alcançar o eleitorado e converter em voto no domingo. A Princesa do Sul, uma cidade com enorme contingente periférico, padece com candidaturas, historicamente, aventureiras. E muitas delas sempre fazem apelo ao populismo. O eleitorado periférico precisa confrontar as propostas de programas de governo e verificar quais ações estão sendo pensadas para esse grupo.

Portanto, as estratégias para atingir esse eleitorado são as mais distintas, algumas delas surgem dentro de um contexto assertivo, logo, conseguimos verificar na proposta do programa de governo; outras buscam o voto do eleitor e recorrem aos artistas, preferencialmente, aqueles com apelo popular e conectado com essa massa. A disputa é pragmática e, agora, interessa converter toda a estratégia em voto. Ontem o artista foi de direita, hoje, dialoga com os interesses da esquerda e vice- versa.

As periferias brasileiras sempre instigaram pesquisas e reflexões. Algumas delas indicam que as periferias não são homogêneas; existe uma forte presença de igrejas evangélicas. As mortes violentas e as que decorrem pelo não acesso ao tratamento adequado dos problemas de saúde são constantes. Estas últimas são materializadas pela violência do Estado e, às vezes, do racismo estrutural.

As periferias são espaços urbanos, que constituídos pela omissão estatal ou articulados por agentes do Estado, refletem habitações muitas vezes desordenadas, ruas apertadas e uma gama de problemas que reunidos constituem ambientes singulares e que carecem de uma ação efetiva do Estado. Nem sempre a periferia está na borda de uma cidade, ela pode estar do lado de um bairro nobre.

As periferias possuem uma série de demandas: regularização fundiária, esgotamento sanitário e uma efetiva coletiva seletiva de resíduos sólidos; geração de trabalho; escolas e acesso ao ensino superior, preferencialmente, gratuita e pública e com qualidade; as diversas formas de acesso à cultura e de fomento, sem juízo de valor das elites. A segurança pública não pode ser repressiva, mas que dialogue com as diversas dificuldades locais e que seja acompanhada do conjunto de direitos: saúde, transporte público efetivo. As crianças e adolescentes precisam de apoio permanente.

Após as eleições, espera-se que os gestores e os legisladores eleitos para o âmbito municipal não se esqueçam desse conjunto de cidadãos que, diuturnamente, constroem a nação brasileira a partir de cada cidade. Por fim, a periferia merece ser representada por seus sujeitos de direito e de fato. A periferia não deseja ter príncipe e nem chefe de gueto, mas gestores comprometidos com o fazer pleno e permanente da cidadania.

Efson Lima é advogado e doutor em Direito pela Ufba.

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