Tempo de leitura: 5 minutos

 

 

Valorizar o servidor não é uma mera condescendência do gestor. É, sobretudo, um dever legal.

 

 

Osias Lopes

O SERVIDOR PÚBLICO NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA – O subtítulo deste modesto artigo parece até um lugar comum, eis que por obviedade o servidor público é imprescindível para que ocorra, de fato, o funcionamento da chamada máquina pública. Todo serviço público é executado pelo servidor, é ele quem faz acontecer a entrega dos produtos e serviços essenciais à vida na municipalidade. Mas, na prática não é assim que ele é visto e tratado por um determinado segmento de “gestores” que teimam em enxergá-los de maneira estranhamente enviesada, esdrúxula até, a começar por terem a folha de pagamento de pessoal como incômoda despesa. E mais, quase sempre se utilizam da verba de pessoal para a prática nefasta de política assistencialista/clientelista, deturpando todos os princípios básicos que regem a administração pública, resultando no que todos vemos, uma máquina pública entrevada, coxa, sem foco, sem eira nem beira, que pouco ou quase nada serve ao público, sua única razão de existir.

A ESCOLA DE GOVERNO – Contrapondo-se a essa realidade, é interessante lembrar que lá pelos idos dos anos primeiros da primeira década do século XXI, de maneira pioneira, a gestão pública itabunense experimentou a implementação do projeto de uma Escola de Governo, quando foi desenvolvida uma importante fase embrionária com o apoio da sociedade e efetiva participação de autoridades locais, membro do Ministério Público Estadual, profissionais liberais e, fundamentalmente, de professores da UESC, quando ministraram aulas extraordinárias acerca das mais variadas temáticas, tudo voltado à formação e ao crescimento intelectual do servidor, conferindo-lhe conhecimentos de todos os naipes, inclusive e especialmente os voltados à melhoria da gestão municipal.

O MODELO DE CAMPINAS, SÃO PAULO – Essa Escola foi inspirada no modelo então adotado no Município de Campinas, São Paulo, sem formalismos estruturais físicos ou burocráticos que demandassem custos extras, haja vista que para o seu mister eram utilizadas salas de reuniões e auditórios já existentes, com uma programação elaborada a partir das mais ingentes e urgentes carências detectadas no quadro de pessoal decerto que poderia ter progredido mais, mas a mudança de hábitos e de rotina assusta, fez a Escola sofrer os mais variados ataques, até de quem não deveriam vir.

A institucionalização da Escola de Governo. E o fato é que, a preocupação em fazer andar esse projeto era tamanha que o legislador municipal foi convencido da necessidade de institucionalizar a iniciativa, e foi assim que, através da Emenda nº 007/2003, se inseriu no Capítulo II da Lei Orgânica do Município de Itabuna – LOMI, dedicado aos servidores municipais, no § 3º do art. 94, a seguinte obrigação:

Art. 94- …
§ 3º O Município criará Escola de Governo, sob a denominação “Escola de Governo e Desenvolvimento do Servidor Público Municipal de Itabuna” para a formação e o aperfeiçoamento dos Servidores Públicos Municipais, constituindo-se a participação nos cursos um dos requisitos para a promoção de carreira, facultada, para isso, e elaboração de convênios ou contratos entre os entes federados ou privados.

CONSECTÁRIOS ÓBVIOS DA IMPLEMENTAÇÃO DA ESCOLA DE GOVERNO – É fácil de imaginar o melhoramento da gestão municipal, imbuída de capacidade satisfatória para enfrentar os desafios impostos pelas constantes mudanças e transformações trazidas pelos novos tempos, tivesse havido a concretização da criação dessa Escola há mais de vinte anos. Certamente que todos os servidores estariam praticando as melhores técnicas, com melhores conhecimentos, atualizados e muito mais aptos a exercerem suas funções. Para isso bastava aos alcaides que se sucederam anos afora, cumprir com esse dever legal, insculpido na mais elevada norma municipal, popularmente considerada como constituição municipal. Mas o fato é que tal dispositivo foi solenemente ignorado, desprezado, e não bem avaliado também e até pela instituição sindical, que em última análise, poderia e pode requerer em juízo a criação da Escola, ferramenta estratégica e de fundamental importância para o aprimoramento da prestação do serviço público.

RESPEITO À VERDADEIRA MEMÓRIA DA ADMINISTRAÇÃO – Em vez disso, estamos testemunhando alguns “incidentes” que afetam de maneira demasiadamente negativa membros dos quadros de servidores municipais, especialmente o segmento dos mais antigos, demonstrando até mesmo uma certa insensibilidade no trato com quem realmente dedicou e ainda dedica a vida à causa pública, desprezando o conhecimento e a experiência que carregam, verdadeiras memórias vivas da Administração que, observadas pelo gestor com inteligência, sobriedade e respeito, em muito poderiam e podem contribuir para a boa fluência e qualidade dos serviços públicos prestados, assim como para o aprimoramento da atuação dos novos servidores.

O DEVIDO CUMPRIMENTO DA LEI – A mais disso, tem-se ouvido falar sobre o dever de se cumprir a Lei, afirmativa essa, claro, que não merece qualquer reparo. Mas não se pode dizer isso distante da prática e seletivamente, pois não é razoável que se eleja para cumprimento apenas normas que mais satisfaçam ao ego de quem, precipuamente e por ofício, tem esse dever.

A EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 103/2019 – Não é assim que, sob esse mesmo argumento de cumprimento da Lei, em nossa cidade se levou a efeito um dispensar indistinto de servidores aposentados, sob o argumento de se estar no cumprimento de ditames constitucionais, o que não passa de meia verdade, pois a Emenda Constitucional nº 103/2019 quer fora do serviço público somente os que a partir de sua vigência se aposentaram, fazendo ressalva expressa quanto aos aposentados anteriormente a ela, excetuando-os, permitindo-lhes, ipso facto, a permanência no emprego.

TODA APOSENTADORIA SERÁ CASTIGADA (??!) – Aliás, se tem notícia de que os servidores aposentados pelo RGPS vêm sofrendo retaliações faz tempo, pois o enquadramento nos cargos criados, coisa que a todos os demais servidores foi garantido, não lhes foi deferido, sendo mantidos, ao que se sabe, num quadro à parte, numa anomalia inexplicável, posto que, antes da EC nº 103/2019, tinha-se por certo que a aposentadoria não causava rutura contratual laboral. Daí, infere-se que, se não havia, como não houve, rutura do pacto laboral, liame esse que seguia indene mesmo ante a aposentadoria, impunha-se o enquadramento do servidor

FUNCIONÁRIO E CARGO. CARGO E FUNCIONÁRIO – Fala-se também que aos servidores aposentados pelo regime geral de previdência gerido pelo INSS foi imposto o regime estatutário. Ora, como dito acima, não houve enquadramento dos mesmos nos cargos criados, não havendo portanto que se falar, in casu, em mudança de regime, pois não há funcionário sem cargo (aqui, ambos os termos, funcionários e cargo, tomados na acepção técnico jurídica trazida pelo Direito Administrativo). Essa situação leva a uma outra perversa anomalia, posto que, não ocupando o aposentado cargo público não há que se falar em vacância de cargo, o que impede a aplicação da Lei Municipal que trata da matéria, pela óbvia impossibilidade de se declarar vacância de cargo sem existir, no particular, cargo a ser vacante.

Pois é… Valorizar o servidor não é uma mera condescendência do gestor. É, sobretudo, um dever legal.

Osias Lopes é ex-secretário de Administração de Itabuna.

Respostas de 11

  1. Nobre advogado Osias Lopes, honra os professores aposentados celetistas demitidos ilegalmente. Essa situação é absurda, pois humilham e perseguem os servidores aposentados. Muitos aderiram ao PDV por pressão e medo, eu no caso, sei dos meus direitos, não assinei nada. Vou continuar acreditando na Justiça. Pior mesmo é a desculpa
    do gestor, alegando demissão por sermos aposentadas. Pois afirmo isso é Constranger, persegui, expor o idoso ao abandono, ao desamparo, quando o aposentado recebe um salário mínimo e meio e passou a vida contribuindo com o INSS.

    1. Cara Luciana, inicialmente devo agradecer-lhe por sua atenção dispensada ao meu escrito, que foi feito pela preocupação que a situação impõe. Perder renda já não é coisa boa, piora quando é resultado de insensibilidade de quem tem o dever de dispensar toda atenção e respeito aos servidores, especialmente quando se trata de aposentados, e piora muito mais quando se fazer campear injustiça. A Emenda Constitucional n. 103/2019 já não é de boa concepção e aplicada de maneira autoritária fica pior ainda. E quando o aplicador não atenta para suas nuances termina por agravar tudo, ainda mais. Mas, a Justiça haverá de repor tudo em seu lugar.

  2. Bom dia, Osias Lopes e seguidores do Blog Pimenta. Fico feliz com textos que traduzem a verdade e a injustiça no município de Itabuna (BA). Estar aposentado não é vergonha, nem é impedimento para permanecer trabalhando. Os aposentados, que têm assegurado por lei o direito de permanecer no exercício da função, não estão saqueando os cofres públicos e não estão retirando direito do trabalho aos jovens, eles estão exercendo um direito que a lei lhes faculta. Hoje vivemos uma realidade de demissões ilegais, exposição ao ridículo de profissionais honrados e éticos que sempre se dedicaram com afinco ao serviço público. Estamos sendo assediados moralmente, acusados de usurpadores do erário público. É muito triste!

    1. Professora,

      É doído tudo o que está acontecendo com os aposentados. A aplicação da malfada Emenda Constitucional n. 103/2019 poderia, ou melhor, deveria, a meu ver, ser amplamente discutida com os servidores e com a entidade sindical que os assiste e representa.

      O modo autoritário da condução da aplicação da Emenda e a inobservância das nuances que ela encerra, bem como a desatenção às circunstâncias, coadjuvada pela manifesta insensibilidade com que se houve o gestor, acabaram por ofender o brio de quem deveria ser homenageado e reverenciado, por ter passado uma vida inteira mourejando pelo bem das pessoas, da Administração e da própria sociedade itabunense: o(a) aposentado(a).

  3. É vergonhoso e vexatório o tratamento dado por esse governo irresponsável e insensível aos professores que construíram e continuam construindo a educação do município. O professor não é um objeto descartável, substituível como uma coisa. merece todo o cuidado e respeito pela sua dedicação e anos de serviço. Excelente colocações e muito esclarecedor.

    1. Cara Luciana, inicialmente devo agradecer-lhe por sua atenção dispensada ao meu escrito, que foi feito pela preocupação que a situação impõe. Perder renda já não é coisa boa, piora quando é resultado de insensibilidade de quem tem o dever de dispensar toda atenção e respeito aos servidores, especialmente quando se trata de aposentados, e piora muito mais quando se faz campear injustiça. A Emenda Constitucional n. 103/2019 já não é de boa concepção e aplicada de maneira autoritária fica pior ainda. E quando o aplicador não atenta para suas nuances termina por agravar tudo, ainda mais. Mas, a Justiça haverá de repor tudo em seu lugar.

  4. Ao nobre Ozias o nosso aplauso 👏👏👏👏pela pertinência do artigo acima exposto de forma esclacedora ( qto ao óbvio).. e sobretudo pelo histórico apresentado, verdades factuais expostas e respeito às normas e regras que regem a Constituição Federal! O nosso agradecimento pela defesa do CUMPRIMENTO da LEI (sem interpretações equivocadas e/ou mal intencionadas) e SIM de forma JUSTA com EQUIDADE e que atendam aos lindemes republicanos e libertários!
    Lúcia Bittar – Presidente de Honra do Conselho Municipal de Educação de Itabuna-BA.

    1. Professora, agradeço-lhe a atenção. O meu escrito tem a intenção de ajudar no debate sobre a aplicação da EC N. 103/2019. Essa alteração na Constituição tem notório cunho neoliberalista e, por assim, desatende aos interesses da Administração Pública e aos interesses dos administrados em geral. E tudo piora quando sua açodada aplicação não distingue o que ela quis distinguir, piorando o que já era ruim, cometendo, por isso, mais e mais injustiças.

      Tem-se notícia de que a entidade sindical já adotou as providências jurídicas e judiciais pertinentes para repor tudo aos seus devidos lugares. Aguardemos.

  5. Com o plano de cargos e salário, nos servidores saímos perdendo e muito..digo isso como servidor público do município de Itabuna . Há 34 anos,com esse governo que aí está não valoriza o servidor. Até no pagamento de férias o servidor é gafado..ou melhor subtraindo, não paga o que tem de direitos. Acorda Sr. Prefeito, Augusto Castro. É lamentável!

  6. PERFEITO Dr. Ozias, NÃO PODIA ESPERAR OUTRO POSICIONAMENTO DO SENHOR, O CONHEÇO E SEI DA SUA ÍNDOLE E CAPACIDADE PROFISSIONAL. É LAMENTÁVEL O QUE ESTAMOS VIVENDO,UM GESTOR RASGANDO A CONSTITUIÇÃO FEDERAL, AGINDO COMO UM VERDADEIRO DITADOR E DONO DA LEI. EU SÓ ESPERO QUE A JUSTIÇA SEJA FEITA, CASO CONTRÁRIO ISSO VAI VIRAR MODA???

  7. Obrigada pelo apoio. Estamos nos sentindo lesadas, humilhadas e assediadas. Todos sabem que temos respaldo legal, inclusive o prefeito, mas aposta na morosidade da justiça, no terrorismo, na imposição!Desarrumou todo o ano letivo, pois já tinhamos começado a organizar as escolas, mas segue destruindo.
    Onde está o Ministério Público, o Conselho Municipal, os juízes , a lei de Itabuna? As vidas dos professores importam, aí da estamos aqui!

Deixe aqui seu comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Saiba como seus dados em comentários são processados.