Tempo de leitura: 6 minutosO presidente do PSB de Ilhéus, Magno Lavigne, e o prefeito Newton Lima, do mesmo partido, não falam mais a mesma língua. Aliás, parece que nunca falaram. Um dos participantes do movimento que levou à cassação do ex-prefeito Valderico Reis, Lavigne esteve na linha de frente da campanha pela reeleição de Lima e sai deixando claro que lhe faltou espaço no governo. Fala que o prefeito não gosta de política, mas não esconde que o não-atendimento de pedidos do próprio Lavigne e de outros militantes do PSB foi determinante para o rompimento. “Newton é ingrato”, diz o presidente, que admite a possibilidade de sair do partido. Aliás, em certo trecho da entrevista, concedida por email, o quase ex-pessebista não perdoa a presidente da legenda, Lídice da Mata, a quem acusa de tentar esconder irregularidades cometidas para se manter com o domínio sobre a legenda. Confira.
Pimenta – Você está rompendo com o prefeito Newton Lima?
Magno Lavigne – Para falar de minha relação com o prefeito Newton é necessário voltarmos no tempo. Fui candidato a prefeito na eleição em que Valderico se elegeu. Por ser trabalhador do setor de transporte e dirigente do Sindicato dos Rodoviários de Ilhéus, sempre tive uma posição de enfrentamento político/ideológico com ele. Afinal, Valderico era um “patrão”. Na campanha eu dizia: “quem não é bom patrão não pode ser um bom prefeito”. Depois criei, juntamente com outras lideranças, o MEP – Movimento Pela Ética na Política de Ilhéus. Foi o primeiro movimento a denunciar frontalmente os desmandos daquele governo, como o nepotismo, a compra de calcinhas com dinheiro público e por fim o mensalinho, fato que culminou na cassação do ex prefeito. O governo Newton é fruto desta conjuntura. Não foi construído por ele e sim, um processo construído por muitos, inclusive por mim.
Pimenta – Faltou espaço para você no governo?
ML – Talvez eu não tenha entendido que este não seria um governo de compromissos ideológicos. Uma administração voltada para os reais interesses da população, preocupada com a organização política de suas bases. Para que eu tivesse mais espaço nesta conjuntura deveria abrir mão de bandeiras que sempre defendi, como por exemplo, o apoio aos sem terra, aos indígenas e as organizações de trabalhadores. Portanto, o que houve é que já entrei numa guerra perdida. Como discutir estas coisas com pessoas despolitizadas? Uma administração sem ambição transformadora e que não ousa planejar a cidade para além de seu fluxo de caixa. Fui minado e caluniado por setores do governo que entendem a bajulação como a única forma de se governar.
Pimenta – Você já comentou que o prefeito tenta governar sem “fazer política”. O que isso significa?
ML – Sim, disse. Se isto fosse possível, ao invés de eleições faríamos concurso público para prefeito. Veja bem, não acho que política seja coisa ruim. Faço política por gosto e por paixão. Não posso entender o que certos setores do governo de Ilhéus falam acerca da classe política. Defeitos todos tem, até mesmo aqueles que se escudam na religião como plataforma de suas ações. Ao mesmo tempo que se critica a política, mantém uma atitude conservadora. Lembro-me bem do documento que o PPS fez quando rompeu com o governo Lula. O titulo era ” Sem mudança não há saída”. Este governo não conseguiu romper como uma tradição antiga em Ilhéus, que é a manutenção das mesmas figurinhas carimbadas na administração. Tem gente ai que serviu a todos os governos do passado. Por isso repito “Sem mudança não há saída”.
Pimenta – O prefeito muitas vezes aparenta insegurança. Há alguém que influencie as decisões dele?
ML – Até onde eu sei, Newton define suas ações a partir de sua própria consciência. Quem eu percebo aumentando o grau de influencia no governo é o grupo da deputada (Ângela Sousa). O chefe de gabinete de Newton, a meu ver, é seu assessor mais influente. Esta influência foi construída com muito jeito. O rapaz já foi assessor de Fábio Souto e certamente está cumprindo direitinho o papel que seu grupo político lhe deu.
Pimenta – O ex-prefeito Valderico tentou manter uma relação promíscua com a Câmara. Como é hoje a relação entre Newton e os vereadores?
ML – No meu entendimento, mesmo eu tendo tentado articular a candidatura de Dr. Aldemir, Jailson é um ótimo nome. A relação do governo com a Câmara se dá hoje num nível ético bom. O problema é que a articulação política do governo é ruim.
Pimenta – Newton apoiou Valderico até os últimos instantes. Você acha que foi por fidelidade, conveniência ou as duas coisas juntas?
ML – Sinceramente, hoje eu tenho dificuldades de avaliar este fato.
Pimenta – Como a deputada Lídice da Mata, maior liderança do PSB na Bahia, vê a sua saída?
ML – Saída? Para mim pouco importa o que Lidice ache ou deixe de achar. Ela tem é que dar explicações de como o partido que pretende ter candidato próprio a presidente da República consegue ser tão nanico na Bahia. O grupo do qual eu faço parte votou nela nas últimas eleições. Os 500 votos que ela teve em Ilhéus foram garimpados por nosso grupo com muito sacrifício e contra a campanha do voto local. Os amigos de hoje, ou estavam com Veloso, ou com ACM Neto. Sei que não se faz política olhando para trás, mas algumas coisas precisam ser ditas, para que o relato dos fatos seja o mais verídico possível. E mais: no ultimo congresso estadual do partido, o grupo LL – Lidice e Leonelli -teve medo de ser derrotado por cometer atitudes que indicam possíveis fraudes, fato que está na Justiça. Pasme, o PSB realizou congressos municipais onde sequer tinha filiados. Portanto, a crise que existe no PSB não é local. Se eu tiver que sair do partido certamente não sairei sozinho, pois não faço política a partir de meu umbigo. Sou de partido, de posição e de grupo.
Pimenta – E qual a posição da base local do partido, inclusive a do vereador Alcides Kruschewsky?
ML – Para alguns setores do PSB já deveríamos ter rompido com Newton há muito tempo. A maioria dos nossos candidatos a vereador tem me procurado e exposto posições duras a respeito do tratamento recebido pelo prefeito. Quanto a Alcides, não tenho conversado com ele. A minha hipotética saída do PSB deixa o vereador muito bem, pois ele é o vice. No caso, além de vereador tornar-se-ia presidente do partido, o que para quem alimenta ambições políticas maiores, não deixa de ser um grande negócio. O último contato dele comigo foi por carta, quando cobrei dele e Aldemir, por escrito, alguns trâmites estatutários do partido.
Pimenta – Você de fato vai deixar a presidência do PSB? Qual será o seu destino político?
ML – Sou um militante da luta política, se vou ou não sair da presidência do PSB só o tempo poderá dizer. O que posso afirmar, por hora, é que a crise do PSB baiano é séria e que certamente terá desdobramentos drásticos, não só em Ilhéus, como em todo o estado. Muitas coisas poderão mudar no partido. Quanto ao meu destino, vou dizer como Zeca Pagodinho: “deixa a vida (política) me levar”. Sei que continuo minha luta no movimento sindical e na defesa dos interesses de Ilhéus, como por exemplo, a luta pelo porto sul, a ferrovia oeste leste.
Pimenta – Como você avalia a administração do prefeito?
ML – Se o prefeito não acordar rapidamente vai ser engolido por setores da corporação municipal, muito fortes no dia-a-dia da prefeitura e por um grupo político travestido de amigo que sonha com ele se transformando num novo Valderico. Sinceramente, torço para que Newton dê certo. Afinal, pode até ter alguém que tenha lutado igual a mim para que ele fosse eleito prefeito. Só não conheço alguém que tenha lutado mais.
Pimenta – Newton o decepcionou?
ML – Politicamente, nunca esperei muito de Newton. Só esperava que ele reconhecesse o papel que jogamos em sua eleição, pois sabe que quando muitos dos seus aliados de hoje diziam que ele não iria para lugar nenhum, e outros diziam que ele não deveria sair candidato, fomos, nós do PSB de Ilhéus, que bancamos sua candidatura contra forças poderosas. Leonelli, por exemplo, esteve em Ilhéus pedindo que apoiássemos Dr. Ruy (pessoa a qual eu prezo muito). Pessoalmente, não tenho problemas com Newton, pois como diz Jorge Medauar, “política não é lugar para xiliquentos”. Agora, sob o ponto de vista político, ele foi ingrato. Não com Magno, mas com o PSB. Ele pode até argumentar que o partido tem cargos no seu governo; no entanto, são cargos inexpressivos. O secretário de Turismo mesmo cumpre mais o papel de assessor de vereador do que a função para a qual foi nomeado. Fora o tratamento dado a militantes como Val, Corsário, Zé Roberto e Jair Garçon, entre outros que foram para os bairros defender a reeleição de Newton. Pergunto-me às vezes: a fidelidade política não conta?
Pimenta – Dizem que você e o prefeito nunca “se bicaram”. Era apenas incompatibilidade de gênios ou havia mais algum motivo para essa antipatia?
ML – Somos de mundos diferentes. Sou um homem de convicções socialistas e ele uma pessoa que não gosta de política. Ou seja, temos muitas divergências. O problema é que não acho que as divergências devam ser escondidas. Acredito no debate de ideias. Parece que o prefeito não tem muita paciência para isso.
Pimenta – Comenta-se que o prefeito está se tornando um homem rico, comprando apartamentos, terras. É verdade?
ML – Nada do que sei até o momento me tira a convicção que o cidadão Newton é um homem honesto. Tenho com ele divergências no campo das ideias e é assim que faço política.