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Valéria Ettinger1Valéria Ettinger | lelamettinger@gmail.com

Enquanto “houver uma mulher em condições não dignas, isso irá repercutir em todas as mulheres” e, assim, todas nós estaremos aprisionadas, sendo conduzidas pelos valores machistas.

Eu recebo flores, mas preciso lutar por igualdade;

Eu recebo flores, mas meu salário é menor que o dos homens;

Eu recebo flores, mas tenho dificuldade de conseguir emprego por causa da maternidade;

Eu recebo flores, mas não tenho o direito de usar a roupa que quero porque sou estigmatizada;

Eu recebo flores, mas dizem que tenho culpa se sou violentada;

Eu recebo flores, mas não existem políticas públicas para a minha saúde enquanto mulher trabalhadora urbana, rural, das florestas e ou do mar;

Eu recebo flores, mas ainda sou tratada como objeto a ser consumido;

Eu recebo flores, mas meu corpo é tratado como uma propriedade privada;

Eu recebo flores, mas dizem que se sou do lar não faço nada e se sou mulher trabalhadora tenho que enfrentar jornadas triplas, sem ajuda e sem reconhecimento;

Eu recebo flores, mas as instituições ainda me tratam com indiferença, escárnio ou dúvida;

Eu recebo flores, mas a CPMI da Violência contra a Mulher ressaltou o assassinato de 43,7 mil mulheres no País entre 2000 e 2010, 41% delas mortas em suas próprias casas, muitas por companheiros ou ex-companheiros;

Eu recebo flores, mas a cultura machista me prendeu em uma identidade de submissão e fraqueza;

Eu recebo flores, mas dizem se sou independente e tenho um bom salário sou uma ameaça aos homens;

Eu recebo flores, mas não posso deixar de enfrentar ou me permitir ser maltratada;

Eu recebo flores, mas ninguém pode me condenar se eu resolver praticar um aborto. As consequências são minhas;

Eu recebo flores, mas gostaria que as mulheres não criassem seus filhos no padrão da cultura machista;

Eu recebo flores e continuarei lutando para que outras mulheres não sofrerem estupros sejam eles individuais ou coletivos;

Eu recebo flores, mas ainda preciso de uma lei que puna severamente os crimes contra a minha integridade física e moral;

Eu recebo flores e gostaria de ver todas as mulheres estudando e trabalhando;

Eu recebo flores e todos os anos, no Dia Internacional da Mulher, lembrarei que nós, mulheres, precisamos nos reconhecer enquanto sujeitos de direitos, nos unirmos em favor de outras mulheres em estado de vulnerabilidade e jamais nos julgarmos por nossas atitudes. Devemos minar cotidianamente todos os espaços de discriminação, romper com os estereótipos, não aceitar e nem reproduzir atitudes sexistas. E, sobretudo, tomar muito cuidado com a criação das filhas e (dos filhos), rejeitar os modelos de feminilidade, desobedecer os códigos de conduta impostos pela divisão sexual do trabalho: mulher não ri assim, não sente e anda assim, não faz, não pode. O feminismo é política e teoria, mas é também um estilo de vida, uma forma de estar no mundo. Trata-se da politização da experiência pessoal (GOMES, 2012, p. 29), pois enquanto “houver uma mulher em condições não dignas, isso irá repercutir em todas as mulheres” (TELES, 2012, p.29) e, assim, todas nós estaremos aprisionadas sendo conduzidas pelos valores machistas.

Valéria Ettinger é professora universitária e assessora do TJ-BA.

GOMES, Loreley. In: SAMBO, Paula, Uma luta de todas as mulheres. Revista Caros Amigos, A Era da Mulher: Conquistas e Desafios, São Paulo: ano XV, Editora Casa Amarela Ltda, 2012, p.29.

TELES, Amelinha, In: SAMBO, Paula, Uma luta de todas as mulheres. Revista Caros Amigos, A Era da Mulher: Conquistas e Desafios, São Paulo: ano XV, Editora Casa Amarela Ltda, 2012, p.29.

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