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Tal e qual o pombo liberado por Noé para ver se ainda existia vida na terra, devidamente mascarado e com um vidrinho de álcool em gel nas mãos, me aventurei por outros dois quarteirões.

Walmir Rosário || wallaw2008@outlook

Aos poucos, as livrarias começaram a nos oferecer livros sobre as causas e efeitos da pandemia, primeiramente com livros reportagens, contando, passo a passo, o início, o meio e as previsões para o fim. O que mais me chamou a atenção – mesmo não tendo adquirido nenhum deles, e sim ao ler resenhas – é que não existirá um fim para a Covid-19, no máximo uma trégua.

Trégua essa que depende dos avanços da ciência na apresentação de medicamentos e, sobretudo, vacinas, já em experimentos em diversos países e com a participação do Brasil nas pesquisas. Essa seria uma boa notícia se eu não tivesse lido por aí que o Coronavírus é chegado a mutações e poderemos ter pela frente o Covid-20, 22, 38, 45, de acordo com a vontade dos chineses.

Se nos bastasse o grande incômodo da doença, agravada pelas notícias da grande mídia terrorista, também seremos assediados pelas publicações de livros de luxuosas capas e conteúdo aterrorizador. Monografias de especializações, dissertações de mestrado e teses de doutorados invadirão nossos cérebros, sugando nossa massa cinzenta, tal e qual o tamanduá do cartunista Henfil.

Quem também está de volta, reestilizado, é o Cabôco Mamadô, cujas vítimas não mais serão enterrados no cemitério dos mortos-vivos e sim pomposamente cancelados com ampla repercussão nas redes sociais. É os tempos mudaram. Por mais que alguns se esforcem, a tese marxista continua sendo levada ao pé da letra: A história se repete, primeiro como tragédia, depois como farsa.

Mas voltando às edições sobre a pandemia, termos livros sobre todas as óticas e ideologias, sempre aos olhares atentos dos antropólogos, sociólogos, filósofos, juristas, historiadores, ideólogos e, quem sabe, sem especialidade alguma, como eu. Uma barafunda de ideias que – por certo – fará corar o mais sabidos dos sofistas que pululam os programas de televisão de norte a sul do país.

Enquanto gastaremos nosso precioso tempo em ler, ouvir e ver tais “verdades absolutas”, quem sabe esqueceremos os absurdos que vimos e presenciamos durante o tempo em que ouvimos insistentemente: “Não saiam, fiquem em casa”. Presos – ou melhor, “debaixo de ordens” –, não tivemos nem mesmo que pensar sobre o livre arbítrio ou o princípio constitucional do direito de ir e vir.

Como se não bastasse a queda, ainda levamos o coice. Não temos nem o sagrado direito de informação sobre o trâmite dos recursos destinados a dar um freio na pandemia, gastos como se investidos fossem nas mais variadas formas de tratamento. Salvo por uma ou outra operação da Polícia Federal, não temos como traçar um simples roteiro do dinheiro desde que saiu de Brasília.

Nos tempos modernos de hoje, esse dinheiro nem precisa viajar pelas estradas, como nas diligências nos velhos filmes de faroeste, ou mais recentemente pelos carros-fortes, sempre alvo dos assaltantes. Agora viajam por meio eletrônico e não levam dois segundos sequer para chegar aos destinos. Pelos meus imprecisos cálculos, essa viagem é tão acelerada que não dá parar no destino. Faltam os freios, acho eu.

Enquanto fico em casa sem ter o que fazer, a não ser ajudar a mulher em pequenas tarefas domésticas, me atenho aos meios de comunicação disponíveis para continuar informado se o mundo ainda consegue se equilibrar no firmamento. Numa de minhas saídas consegui ver um carro-pipa jogando água nas paredes, passeios e ruas e fui informado pelo motorista que era água sanitária para matar o vírus. Tiro e queda!

Nem eu mesmo sabia dessas ricas propriedades da água sanitária e enquanto me debruço ao computador para aprender o que poderia fazer com a que tenho em casa, eis que ouço de novo num carro de som a mensagem para não sair de casa. Até que me alegrei pois me era concedido o direito de ir à padaria, supermercado e farmácia. Viajar! Jamais! Me aquietei por uns dias.

Tal e qual o pombo liberado por Noé para ver se ainda existia vida na terra, devidamente mascarado e com um vidrinho de álcool em gel nas mãos, me aventurei por outros dois quarteirões. Conversei com uns dois amigos no jardim de suas casas, perguntei pelas novidades e se já tinham descoberto algum medicamento para nos livrar dessa maldita doença. Qual nada, tudo na mesma.

Depois de uma meia hora encontro um cidadão bem informado sabedor dos fatos, cabo eleitoral dos bons, gente importante na política municipal e estadual, e que me confidencia e recomenda: “É melhor ficar quieto em casa, pois não tem remédio que bata a testa com a doença, que teima em aumentar a cada dia, desembestada igual mula antes de amansar”.

Não me contento e pergunto:

– E a água sanitária não resolveu a parada?

– Que nada, parece que não surtiu efeito, respondeu e continuou sua viagem.

Da maneira que ele falou, achei que já estavam falsificando a água sanitária. Vou até mandar a que comprei em casa para fazer um teste no laboratório.

Walmir Rosário é radialista, jornalista e advogado. Confira crônicas e histórias no Blog Walmir Rosário.

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