Dentro delas, isolados, certos de suas incertezas, emparedados em suas convicções, os bolhas voltaram. E a história parece que nada nos ensina. Ou até tenta, mas as bolhas parecem ser impenetráveis.
Afonso Dantas
Eu pensava dali, o outro pensava de lá e outro ainda, de acolá. E vivíamos nossas vidas, com nossas certezas e com nossas ilusões. Éramos – todos nós, ou quase todos – os bolhas. Mas não éramos os bolhas da gíria da década de setenta, onde bolha era o chato, o quadrado. Nós éramos os bolhas que vivem nas bolhas e acham que o mundo é aquilo ali e só.
E as bolhas não eram de sabão, límpidas e flutuantes e frágeis, sensíveis ao menor toque que as faziam sumir. Eram bolhas imensas, eram bolhas firmes e sólidas e também isoladas e alheias à existência de outras bolhas. Eram as bolhas da ilusão do egocentrismo, as bolhas da percepção da vida através da programação de uma TV, as bolhas dos nossos grupos de convívio, do trabalho, do setor X, do setor Y, enfim, das bolhas onde nossa percepção ficava confinada e junto com ela, as nossas tantas verdades.
E as bolhas estouraram. Eram firmes, eram robustas, mas estouraram. Anos e anos de certezas se tornaram incertezas ao contato dos bolhas com outros bolhas de outras bolhas. O outro finalmente percebeu a presença dos outros. “Nem todo mundo pensa assim”, descobriu um. “Não se podia fazer isso”, pensou outro. “Aquilo podia ser feito de outro jeito”, concluiu ainda outro.
E se enxergaram. E falaram um com o outro. Mas ao invés do diálogo, surgiu o conflito. Nós e eles. Eles e nós. Eles, nós e os outros.
Mas, com tudo isso, parecia que o mundo convergiria para um sentido de união, de entendimento. As bolhas finalmente perderiam o sentido e os bolhas parariam de se digladiar e se isolar.
Qual o quê!
A revolução na comunicação, ao invés de aproximar as pessoas, criou outras bolhas. “Só sigo quem pensa assim!”, disse um. “Só sigo quem pensa assado”, digitou outro. E assim, voltaram com toda força e estão se criando mais e mais bolhas. E dentro delas, isolados, certos de suas incertezas, emparedados em suas convicções, os bolhas voltaram. E a história parece que nada nos ensina. Ou até tenta, mas as bolhas parecem ser impenetráveis.
Afonso Dantas é publicitário, administrador de empresas, especialista em marketing e em gestão cultural, sócio e diretor de criação da Camará Comunicação Total e sócio criativo da Lá ele! Camisas e coisas.