Ezequias Souza e Edgar Ricardo mataram sete pessoas por aposta em jogo de sinuca
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No Exército, várias vezes escutei que não se dá armas a idiotas. Vejo, tristemente, que esta máxima de outrora não vigora mais, e que o acesso a todo tipo de armamento torna muito mais mortal e trágica a ação criminosa de muitos brasileiros.

Julio Gomes 

Ingressei no exército em 1984, como simples soldado, para prestar o serviço militar obrigatório em um quartel situado no Rio de Janeiro. Inicialmente, passamos quase três semanas inteiras aquartelados, saindo somente na sexta-feira, às 18h, para estarmos de volta na segunda-feira, prontos e em forma, às 6h30.

Neste período de adaptação à vida militar, marchávamos, fazíamos exercícios físicos, recebíamos instrução básica, tínhamos todas as refeições e dormíamos nos beliches da companhia de infantaria, sem sair do quartel para nada, sem acesso a visitas e a telefone. Antes de colocarmos as mãos pela primeira fez no fuzil automático calibre 7.62, arma padrão dos soldados brasileiros, passamos por mais de um mês submetidos à disciplina, adaptação e doutrinação para desenvolver o mínimo de responsabilidade necessária para ter aquele tipo de armamento nas mãos.

Estamos agora em 2023 e constato, com extremo desgosto e preocupação, que hoje qualquer pessoa que tenha dinheiro e preencha as frouxas formalidades burocráticas existentes pode comprar armas que, naquela época, eram de uso absolutamente restrito, proibidas para civis, incluindo fuzis automáticos, que são armas de guerra.

Não pude deixar de pensar em todos os fatos acima ao assistir, pelo YouTube, repetidas vezes e com olhos de quem entende o que é o manuseio de um armamento, a destreza, habilidade e extrema desenvoltura com que os assassinos de Sinop, Goiás, liquidaram, em apenas exatos dez segundos, sete vidas humanas, incluindo a de uma criança de 12 anos, morta com um tiro pelas costas.

Armas como a espingarda calibre 12 usada na chacina – e outras, como fuzis automáticos – não deveriam estar disponíveis para venda, sobretudo com a facilidade que ocorre hoje no Brasil, colocando-se ao acesso de qualquer imbecil, desde que tenha dinheiro e cumpra, repito, os frouxos requisitos legais estabelecidos.

No Exército, várias vezes escutei que não se dá armas a idiotas. Vejo, tristemente, que esta máxima de outrora não vigora mais, e que o acesso a todo tipo de armamento torna muito mais mortal e trágica a ação criminosa de muitos brasileiros.

Vejo também com certa preocupação a proliferação dos clubes de tiro e dos Colecionadores, Atiradores e Caçadores (CACs), pois, mesmo sendo estritamente legais, é de extrema ingenuidade pensar que a habilidade com o uso do armamento ali adquirida possa ser utilizada por todos unicamente para fins lícitos. Obviamente que quem os frequenta e os CACs, até que se prove o contrário, são pessoas responsáveis e inteiramente idôneas, não são bandidos nem assassinos.

Mas, o hábil manuseio de armas pode se prestar a inúmeros fins, e ingenuidade só é bonitinha em crianças; nos adultos, torna-se um grave defeito.

Por fim, entendo que acesso, porte e uso de armas deveriam permanecer o mais restrito possível aos profissionais de segurança, de preferência àqueles que trabalham a serviço do Estado: militares, policiais, guardas municipais e mais um restrito grupo de funções afins. E só.

Guardo a convicção de que se um cidadão comum precisa andar armado e pronto para atirar, como em um antigo filme de faroeste, algo está profundamente errado. Armamento deve ser, sobretudo, instrumento de trabalho institucional e não objeto potencializador da estupidez humana, algo tristemente tão presente no Brasil de hoje.

Julio Cezar de Oliveira Gomes é graduado em História e em Direito pela Uesc.

5 respostas

  1. Acho que os atos de imbecilidade não tem ligação com armas, mas sim com pessoas idiotas. Pessoas matam com carro todos os dias. Atribuir a maldade das pessoas ao uso da arma de fogo é vazio demais.

  2. Parabens Julio pelo puxão de orelha na comunidade que anda armada e na frouxidão das regras de controle e posse de armas de fogo.Mas é preciso desarmar tb os espíritos. Ah,Sinop é MT.

  3. Parabéns prof. Júlio Gomes. Faço de suas palavras minha tb!!!!…. Ao invés de armas temos que dar Livros ? a sociedade brasileira!!!!….

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