Tempo de leitura: 7 minutos
Em entrevista ao Pimenta na Muqueca, o engenheiro e ambientalista Alfredo Melo, presidente da Emasa (Empresa Municipal de Água e Saneamento) revela certo desconforto com a incompatibilidade entre a condição de defensor do meio ambiente e a de dirigente da empresa que mais agride a natureza em Itabuna. A Emasa despeja hoje todo o esgoto coletado na cidade diretamente no Rio Cachoeira, sem tratamento (a execeção é o Hospital de Base, onde funciona um sistema de tratamento alternativo, que Melo pretende implantar em outras áreas de Itabuna).
Na conversa, além de afirmar que tem projetos para reduzir essa agressão, o presidente falou de outros assuntos, como a demissão de funcionários concursados e o atabalhoado episódio da exoneração de um assessor, que depois voltou às suas funções por ordem do prefeito José Nilton Azevedo (Melo alega que tudo não passou de um equívoco). Ele também diz que não está no cargo por indicação do seu partido, o PV, mas sim do prefeito. “Assim contemplamos toda a cidade”, frisa Alfredo Melo.
Abaixo, a entrevista:
Pimenta na Muqueca – O senhor está há seis meses à frente da Emasa. Qual a situação em que a empresa estava e o que está sendo feito nesse período?
Alfredo Melo – Encontramos uma empresa sucateada, visto que nos últimos anos não recebeu investimentos nem manutenção – até porque se tinha um pensamento de vender a empresa. Estamos arrumando a casa, ao tempo que fazemos as ações para melhorar a prestação do serviço. Estamos concluindo a ampliação da rede adutora – de Ferradas ao São Lourenço -, melhorando o sistema de tratamento. Para isso estamos licitando equipamentos como bombas, filtros, e vamos saltar de 600 litros por segundo para 900, inicialmente, e depois para 1000 litros por segundo. Vamos reduzir em 99,99% a necessidade de manobras para fornecer água para a cidade.
PM – E essa produção é suficiente para abastecer a população?
AM – É, sim. Mas vamos trabalhar para ampliar esse abastecimento. Para isso vamos construir a barragem no rio Colônia, uma obra do governo federal, através do PAC, o que nos dará a total capacidade de abastecimento tanto para a população quanto para as empresas aqui instaladas.
PM – A Emasa cobra taxa de esgoto de até 75% na conta de água do itabunense, mas apenas coleta e lança os dejetos sem tratamento no Rio Cachoeira. Como se justifica essa cobrança?
AM – Primeiro, quero dizer que estranhamos que as autoridades competentes apenas agora, 12 anos após a ocorrência do fato, resolvam denunciar isso, a falta de tratamento de esgoto. Não foi um problema que criamos, nós o herdamos. Mas com essa arrecadação já providenciamos o conserto das máquinas que fazem o bombeamento do esgoto, que estavam em uma empresa do Rio de Janeiro. Então, o resultado dessa arrecadação já converge para o tratamento, embora ainda nesse momento seja apenas a criação de condições para o tratamento do esgoto, que será implantado. Vamos reativar a estação de tratamento e quando ela estiver em funcionamento, o esgoto tratado vai representar 14% do total da cidade.
PM – Como você, um ambientalista, convive com o fato de presidir uma empresa altamente poluidora como a Emasa?
AM – É doloroso ver o esgoto sendo jogado no rio. Por isso estamos tratando esse assunto com a maior presteza. O problema é que a cidade cresceu e não foram construídas novas estações de tratamento. Também estamos fazendo isso. Vamos implantar no bairro Jorge Amado a tecnologia chamada Water Land (terras molhadas), uma estação de tratamento natural e altamente eficiente.
PM – Como funciona esse sistema?
AM – Essa é uma experiência muito boa, que é usada no Hospital de Base com sucesso há mais de 12 anos. Consiste numa filtragem natural dos resíduos, em um terreno preparado para isso. Estamos tentando um financiamento junto à Caixa e acreditamos que em breve estaremos implantando esse sistema no bairro Jorge Amado, inicialmente.
PM – O prefeito Capitão Azevedo sinalizou que a Emasa vai fazer o trabalho de coleta de lixo. O que falta para isso ocorrer?
AM – Estamos estudando, sim. A Emasa já fez isso e está habilitada também legalmente. Só esperamos a determinação do prefeito Azevedo.
PM – Recentemente o senhor mandou demitir sete trabalhadores concursados, em um processo sumário. Eles dizem que foram punidos por terem participado de uma caminhada de protesto.
AM – Esse caso foi tratado como são tratados casos assim em empresas de sociedade anônima. A Emasa é uma empresa de economia mista, que se enquadra no regime das S/A e as relações de trabalho são regidas pela CLT. Foram feitas advertências a alguns funcionários, que insistiram em paralisar as atividades. A lei diz que manifestações e paralisações devem ser informadas à empresa com uma antecedência de 72 horas, o que não ocorreu aqui. Apenas tratamos o assunto da maneira que a lei nos permitia.
PM – A CLT prevê, por exemplo, uma gradação de punições ao funcionário antes da demissão: advertência, suspensão e só depois a demissão, que é a máxima punição. Demitir não foi uma punição exagerada?
AM – Acho que depende da agressão, do que causou essa punição. Eu acho que é uma agressão muito grande parar o abastecimento de água para uma cidade como Itabuna por uma hora. Bombeamos 600 litros por segundo. Se pararmos por uma hora, deixaremos de bombear 2.160.000 litros, o que abastece 520 famílias de quatro pessoas. Se ficar quatro horas sem abastecimento, são 2.080 famílias sem água. Há que se ter responsabilidade sempre. Há vários tipos de agressão – física, verbal, moral… Será que a sociedade itabunense não foi agredida? No dia 7 de maio, você dá um aumento de 20% e mais R$100, e no dia 18 é feita uma paralisação, com uma agenda de reunião programada para o dia 20. Será que há isenção nessas ações?
PM – Os trabalhadores da Emasa decidiram, em assembléia, escolher o Sindae como seu sindicato, mas a diretoria da empresa não reconhece essa representação. Por outro lado, o Sindae afirma que o Sintrasi, que seria o preferido pela Emasa, não está regularmente constituído (não teria nem CNPJ). Quem está com a razão?
AM – A Emasa foi informada da regularidade do Sintrasi, que apresentou documentação que atendia à exigência legal para tratar dos interesses dos trabalhadores. Foram mostradas cópias de documentos constitutivos, resultado de plebiscito com os trabalhadores, declaração do Sindae, afirmando que não tinha interesse na base daqui de Itabuna… Até uma sentença de um juiz trabalhista, em ação movida pelo Sintrasi, dando ganho de causa ao sindicato. Se até a Justiça Trabalhista reconhece essa entidade, não teríamos nem embasamento para não reconhecer. Negociamos com esse sindicato, concedemos um reajuste inédito de 20% sobre o salário, para todos os funcionários, além de R$ 100 em vales-compras.
PM – O senhor recentemente foi desautorizado pelo prefeito, depois de exonerar um assessor. Como o senhor explica o episódio?
AM – Há um mês, fizemos um contrato com o radialista Gonzalez Pereira, que é funcionário da Emasa, concursado, mas em outra atividade que não a sua principal, que é a comunicação. Criamos uma coordenação de comunicação juntamente com a secretaria de comunicação do Município. Joselito (jornalista Joselito Reis) passaria a chefe desse setor de comunicação na Emasa, subordinado à secretaria. Para assumir, Joselito precisava ser exonerado de sua antiga função. O jurídico preparou uma portaria e o RH, outra. Apenas a do RH – da exoneração – chegou ao funcionário, o que causou o problema que todos conhecem [ao tomar conhecimento da exoneração, o jornalista Joselito Reis teve uma crise hipertensiva e teve que ser atendido no Hospital de Base]. Mas conseguimos resolver, e até já demos boas risadas sobre esse episódio.
PM – Quando a Emasa voltará a ser membro da Assemae, e por que ela se desfiliou?
AM – Já voltamos. A Assemae é a associação que defende os interesses das empresas municipais de água e saneamento, caso da Emasa. Como o município, no governo passado, pensava em vender a Emasa, esse vínculo com a Assemae não era compatível. Hoje essa situação mudou, e voltamos a fazer parte da associação. Inclusive assumimos um cargo na direção nacional.
PM – No governo passado, a Emasa foi alvo de muitos escândalos, com denúncias de fraudes em vários contratos. Está sendo feita alguma investigação relativa a tais denúncias?
AM – As denúncias que foram feitas contra a administração anterior estão sendo investigadas de acordo com o que manda a lei, com o sigilo necessário. Agora, muita coisa que precisava ser refeita estou refazendo. Licitei em nível nacional aluguel de carros, extingui contratos de aluguel, principalmente de equipamentos e máquinas. Vou cumprir os que estejam em vigência para evitar pagamento de indenizações, mas depois vamos fazer licitações para tudo. Aliás, já fizemos mais de 30 somente este ano. Isso faz com que os preços caiam bastante. Um exemplo é o combustível. Vamos economizar mais de R$ 14 mil por ano só pelo fato de termos licitado.
PM – Como está a questão da dívida com a Coelba?
AM – Governos passados parcelaram a dívida com a Coelba até 2020 e o valor total chega a R$ 11 milhões. Gastamos hoje com energia elétrica um terço do que arrecadamos. Trazemos água de uma distância de 20 quilômetros, bombeando 600 litros por segundo, durante todo o dia. A conta de energia, somente nessa linha, é de R$ 400 mil mensais. Mais o parcelamento, de R$ 170 mil/mês, chega a R$ 570 mil, o que equivale a um terço do que a Emasa arrecada. A solução que identificamos para isso é a construção de nossa própria unidade geradora de energia. Descobrimos em Castelo Novo uma antiga hidrelétrica, construída no início do século passado, e vamos, junto com a Coelba, reativar essa central elétrica que, segundo indicam os projetos, vai nos dar 1 megawatt de energia por dia. Temos dívida de energia e vamos pagar com energia.
PM – E quando esse sistema vai estar em funcionamento?
AM – Assim que sair o financiamento, possivelmente em seis meses. O financiamento deve ficar em torno de R$ 600 mil a R$ 1 milhão. Também, em determinados pontos, vamos trazer água por gravidade. É o mesmo princípio dos antigos aquedutos dos romanos, que vamos utilizar incrementando com as tecnologias mais avançadas de que dispomos hoje em dia. No sistema todo, de Rio do Braço até Itabuna, nós aplicamos 2.600 cavalos de potência. Se utilizarmos em alguns trecho esse sistema de transmissão por gravidade, iremos reduzir essa demanda a menos de 10 por cento. Então, uma obra de 10 milhões, para quem paga R$ 570 mil de energia por mês, estará quitada em 20 meses.
PM – Como o senhor se sente em relação ao governo municipal? Existe apoio às suas ações?
AM – O que sentimos é um governo trabalhando em grande harmonia. Em relação aos projetos que temos, sempre procuro o secretário Fernando Vita, com quem já trabalhei em governos passados, e depois de definidos os projetos, cada um vai em busca das autoridades competentes, para conseguir os recursos. Não há uma competição, mas uma vontade de trabalhar em conjunto. Essa é uma filosofia do prefeito Capitão Azevedo. Não sou cargo do PV, mas do prefeito, e assim contemplamos toda a cidade.