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Celina Santos | celinasantos2@gmail.com

Parafraseando Caetano Veloso, quando escreveu que “o Haiti é aqui”, numa alusão à desigualdade social brasileira, nos resta dizer que a guerra é lá na Síria, mas “o bangue-bangue é aqui”.

“Levanta, Léo, oh meu filho! Ele tá vivo, me dá a mão dele, me dá a mão dele”. Eis o lamento ensandecido de uma mãe itabunense, cujo filho adolescente foi “abatido” por 15 tiros em pleno dia, no bairro Santa Inês. Infelizmente, não se trata de um caso isolado, mas de uma cruel constante na rotina de tantas e tantas famílias dessa terra.

Enquanto esse artigo começava a ser escrito, haviam se passado 223 dias do ano de 2012. Nesse período, foram computados 112 assassinatos. Isso representa média de um homicídio a cada dois dias! A maioria das vítimas, como todos sabem, é composta por adolescentes e jovens.

Do alto da sua imaginária “zona de conforto”, muitos se pegam dizendo: “só estão matando vagabundos”, numa referência aos dependentes químicos (doentes que perdem a batalha contra a tirania do vício em crack) e àqueles que encontram na venda dessa droga um meio de ganhar dinheiro facilmente.

Mas é dado a algum ser humano o direito de decidir sobre a vida – e a morte – de outro ser? Simplesmente matar virou a solução? Quem garante que as centenas de mortos não teriam um futuro diferente, caso lhes fosse dada alguma oportunidade que não o caminho do uso e/ou tráfico de entorpecentes?

Onde estão as tais políticas públicas de cunho social? Cadê a bonita proposta do tal Pronasci (Programa Nacional de Segurança com Cidadania)? Tudo muito louvável, porém, até então, apenas no plano da teoria. Na prática, só morte e mais morte. Choro e mais choro.

Aliás, pensando estar protegidos em nosso “lugarzinho quente”, repetimos: “só morre quem está no lugar e na hora errados”. Ok. Mas onde fica o lugar certo para fugir de uma bala perdida, se pessoas estão sendo atingidas até dentro de igrejas, como aconteceu no domingo, dia 12 de agosto, no bairro de Fátima? Qual seria a hora segura, se tem gente sendo alvo de tiros até pela manhã, em plena avenida Juracy Magalhães, uma das vias mais movimentadas do centro de Itabuna?

Há muito tempo se fala em implantar, nos bairros mais perigosos da cidade, as chamadas Bases Comunitárias de Segurança. Tal medida certamente evitaria atitudes audaciosas de bandidos, como ordenar o fechamento de escolas, quando eles querem trocar tiros com seus rivais.

Para derrubar o reino de impunidade que aqui impera, apesar do esforço, muitas vezes sobre-humano, das polícias Civil e Militar, também se anunciou a instalação de uma Delegacia de Homicídios. O setor se dedicaria exclusivamente à função de investigar e punir assassinos.

Essas providências, no entanto, ainda são saíram do campo das promessas do nosso “ilustre” governador Jacques Wagner. Porque é inegável que a referida delegacia ainda não dispõe de estrutura adequada para funcionar. As tais bases, no Rio de Janeiro conhecidas como UPPs (Unidades de Polícia Pacificadora), por aqui não passam de lenda.

(Parágrafo acrescentado de última hora, por força da “metralhadora” dos fatos). O terror não tem trégua. Na noite de terça-feira, um homem, supostamente viciado na maldita “pedra”, era assassinado no bairro São Caetano. Horas depois, 15 bandidos encapuzados, trajando coletes à prova de balas, ditaram o clima de pavor no Corbiniano Freire.  Invadiram casas, passando-se por policiais, jogaram gasolina e atiraram para todo lado. O intuito era caçar rivais do tráfico. Resultado: uma menina de quatro anos foi covardemente executada dentro de seu lar, enquanto dormia. E Itabuna acaba de chegar ao insuportável patamar de 114 assassinatos neste ano.

O cidadão itabunense, que tem medo de se sentar num bar ao ar livre para tomar uma cerveja, também teme antes de visitar um amigo num bairro periférico e pensa duas vezes antes de respeitar um sinal vermelho à noite. Está, em suma, vendo ameaçado o seu Constitucional – e legítimo – direito de ir e vir. E agora? É uma situação irremediável?

Ainda que pareça tolo e abstrato, cabe indagar: quantos mais precisarão ser executados para que uma providência eficaz seja tomada? Quantas mães precisarão ser massacradas pela dor de ver invertida a “lógica” de que os filhos enterram os pais?

Parafraseando Caetano Veloso, quando escreveu que “o Haiti é aqui”, numa alusão à desigualdade social brasileira, nos resta dizer que a guerra é lá na Síria, mas “o bangue-bangue é aqui”. E isso é, sob todos os aspectos, lamentável, revoltante, assustador.

Celina Santos é chefe de redação do Diário Bahia e, no caso em questão, apenas mais uma cidadã indignada com o caos ditado pela violência em Itabuna.

16 respostas

  1. Excelente texto! Vamos aguardar se alguém propõe um plano de emergência em Itabuna que possa amenizar essa situação de insegurança.

  2. Que tristeza tudo isso! E è inacreditavel que nada foi feito e ainda nao seja feito pra melhorar a situaçao que esta nas cidades. Vejam em que estado esta a violencia nas cidades brasileiras e aqui em especial Itabuna? E o que esta fazendo o governo? Nao falo so o governo da Bahia mas falo do Brasil inteiro!
    Nao é possivel sair de casa, sem medo de ser morto e o que mais vai acontecer pra que providencias sejam tomadas?
    O governo falhou, o governo tem toda a culpa do quer esta acontecendo em nao ter investido em educaçao, trabalho, melhoria de vida e pra todos etc…
    Mas uma copa do mundo, Olimpiada e outras coisas mais se tem recursos!
    Este é o Brasil e enquanto a populaçao nao for as ruas cobrar os seus direitos como em outros Paìses sao feitos, eu nao sei mais ha que ponto vai chegar tudo isso que ja estar acontecendo agora.

  3. Os chefões do trafico estão presos mas continuam dando ordens aos seus comandados. Então a solução seria eliminar os chefões de todas as facções criminosas. Quem se habilita????

  4. Jornalista Celina. Parabéns!Enquanto permanecer esse governo raquitico, irresponssavel sem amor por Itabuna, pela educaçao saude e segurança, é só isso aí que nos espera!Falo dos treis poderes e em Itabuna pior ainda ppois o nosso é totalmente inespressivo, irresponssável e … nao está nem aí para nada ! Mas..lhe daremos uma resposta a altura nessa eleiçao! É o poior de tudo é que em vez dele proteger o seu eleitorado ( a sofrida periferia)ele deixa que ele se matem!! Coitado desse povo nao tem nem a quem apelar!e o pior de tudo é que ainda tem gente que fala que quem esta morrendo é somente marginais. E essa pobre criançinah que foi asasinada ontem ? que culpa tinha esse pobre anjo??????

  5. Inteligente esse texto, parabéns, mas cadê os culpado por isso, governo ou familia, nenhum dos dois, o jovem acham que ter vida marginal é glamour, mas falsa sensação de poder, pelo contrário é um fraco, mas enquanto existir consumidores de marconha, cocaina, clack e outros alucinóginos, vai ter violência e morte, solução há, consumidores de drogas, bebidas alcoolica, produtos furtados ou roubados e piratas se abstenham desse prazer.

  6. Os “cabeças de repolhos”, os que não pensam, acham que marginal bom é marginal morto. Pobres diabos que não sabem o que falam. Não entendem a dinâmica social excludente, cujo raio abrangente os inclue.

    O próprio preconceito que professam é atestado da demência mental que os atinge.

    Esses, estúpidos desde o berço, motivados pela mídia escrota, por apresentadores que lucram com a miséria humana, só aumentam as estatísticas que atestam o número de analfabetos funcionais do país, enquanto jovens, em sua maioria pretos e pobres, são barbaramente assassinados.

  7. Fico me perguntando se houvesse mais investimento do poder municipal em políticas públicas para crianças, adolescentes e jovens se a situação não seria diferente.

    Alem de culpar o governador, que de fato é omisso, precisamos atribuir a parcela de culpa ao “LOBO EM PELE DE CORDEIRO” do Azevedo.

    Excelente Texto Celina

  8. Parabens Celina,

    Fico me perguntando por muitas vezes tambem, onde estamos seguros?

    Uma coisa é certa: Aos pés do Senhor Jesus há segurança, esta é a única certeza que temos.

  9. Vive-se muito de reuniões e de projetos que não saem do papel.Em Itabuna, criança e adolescente nunca foram prioridade.Só vemos as mães pobres enterrando seus filhos que não conseguem viver sua juventude ou sua infância.

  10. Só me resta parabenizar pela excelente matéria, e lamentar por todas as familias destruídas pelo vicio das drogas e pela incompetência do governo em combater o crime organizado, e mas uma vez quem paga o preço é a população, só quem já viu de perto algo tão pavoroso quanto a morte de uma pessoa amiga “viciada em Crack” sabe o que estou dizendo mas infelizmente vivemos em uma sociedade onde não temos educação e nem saúde como prioridade onde a sociedade esta corrompida,onde não temos mas o respeito aos nossos país ,onde a maioria dos jovens não frequentam mas as Igrejas, onde esta praticamente extinto o respeito ao próximo, temos que nos organizarmos e juntos reagirmos tem uma frase de luther King que me identifico e muito ” O que me preocupa não é o grito dos corruptos mas sim o silêncio dos bons” vivemos em um momento que precisamos nos unirmos pais e mães de familias, para discutirmos e acharmos soluções de convivio social, para os nossos filhos e netos ou seja para o nosso futuro, então é hora de comerçarmos a orientar os nossos filhos a vigiarmos , a saber quem é o colega de escola que ele anda, é hora de icentivarmos a prática de esportes é hora de darmos o exemplo de mostrarmos que nós somos capazes de mudar esta realidade, que esta aí colocada e imposta por uma sociedade corrupta.

  11. Que nada, enquanto for traficantes e usuarios de drogas, dou até graças a Deus. Só não podem morrer pessoas inocentes como a menina de 04 anos, morta dentro de casa com um tiro no peito. Esses crimes sim, devem ser investigados e punidos ou até que seja feita a mesma coisa na famosa “volta da cobra”.

  12. Celina, querida,

    Você nem imagina o orgulho que sentí ao ler a profundidade das reflexões contidas no seu texto.
    As suas palavras nos tiram da “zona de conforto” para que possamos olhar ao redor, tomar alguma atitude e, definitivamente, cobrar das autoridades medidas sociais, educativas e de trabalho que minorem a dor da perda de tantas vidas ceifadas em plena juventude.
    Um grande abraço.

    Dirceu Góes

  13. * Gente, muito obrigada pelos comentários. Esse texto foi, principalmente, um desabafo, uma forma de externar minha indignação com a situação a que Itabuna chegou. Indignação, aliás, que é compartilhada pela imensa maioria de nossa população.
    Dirceu, meu professor querido, obrigada pelas palavras! Saudade imensa.Lamento apenas que seja para compartilhar algo tão ruim. Mas não podemos fechar os olhos e fingir que está tudo cor-de-rosa, não é? É isso. bjos

  14. O certo é a justiça enviar os traficantes presos mais perigosos do presídio que se divide em Raio A e Raio B para um presídio de segurança máxima (RDD), e acabar com a ousadia desses otários.

    Teria oura forma, ir exterminando os mais perigosos aos poucos na famosa “volta da cobra”, ponto de desova, mas isso, a pastoral carcerária e os órgãos defensores dos Direitos Humanos infelizmente cairiam em cima, desaprovando.

    Quanto aos usuários, deveria-se implantar um regime de internamento compulsivo e obrigatório, pois eles representam risco para si mesmo e para a sociedade, pois roubam para manter o vício maldito.

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