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Bolsonaro não é idiota, repito, mas a população brasileira também não é e tem dado demonstrações inequívocas de sua sapiência: a próxima delas – e decisiva – será oferecida ao futuro da nação no dia 2 de outubro.

Thiago Dias

A forma de governo presidencialista concentra grande poder na Presidência da República. Isso é óbvio, mas a nossa época chegou ao rebaixamento de exigir, a todo instante, a reafirmação de obviedades, como sintoma da impossibilidade do consenso mínimo que a retórica bolsonarista impõe ao debate público. Quando a interlocução racional se torna impossível, impera a batalha pelo sentido da história. Nessa guerra, importam os eventos desde o passado remoto aos da última manhã.

As ideias introduzidas acima podem ser demonstradas pelos padrões da estratégia discursiva de Bolsonaro, que é sofisticada. Quanto a isso, vale ressaltar que o presidente não é idiota nem louco e, no campo ideológico, mantém coerência radical, pois sabe exatamente quais são os interesses que defende. Também é capaz de cultivar relação favorável ao seu governo no Congresso, com o preço que conhecemos.

O que Bolsonaro não consegue, apesar das tentativas diárias, é se livrar das responsabilidades do presidente da República e dos efeitos políticos do seu fracasso na gestão econômica, que agrada muito ao mercado financeiro, mas castiga os trabalhadores e as pequenas empresas.

Quando o trabalhador sente o peso enorme da inflação toda vez que põe a mão no bolso, aflora o doloroso sentimento de que a vida está mais difícil agora, após três anos e meio de governo Bolsonaro, do que na época dos tão criticados governos Lula e Dilma.

Por ironia da história, a Petrobras, mesmo assaltada por execráveis esquemas de corrupção, mantinha política de preços muito mais favorável ao desenvolvimento das forças produtivas do país. Não se trata de passar pano nos malfeitos, que devem ser combatidos com o rigor imparcial da Justiça, a questão é observar as diferenças das políticas implementadas na estatal por cada governo e as consequências delas para a nação. E não precisa ser petista para reconhecer isso.

Está aí Ciro Gomes que, diariamente, entre uma crítica e outra ao PT, lembra que a política de preços da Petrobras foi praticamente a mesma de 1954 a 2016, ano do golpe parlamentar na ex-presidente Dilma Rousseff.

O caso dos combustíveis não impõe a primeira derrota a Bolsonaro na sua guerra contra os consensos da República. Ele já perdeu a batalha das vacinas, por exemplo. Importante notar que, nos dois casos, a materialidade dos temas em questão dificulta a tentativa retórica de ruptura com a realidade. A eficácia e a segurança das vacinas contra a Covid-19 se transformaram em realidades sólidas demais para contestações simplistas.

O mesmo vale para o preço do tanque de combustível na bomba: é real demais para sofismas delirantes sobre o ICMS e “a culpa dos governadores”. As pessoas também são capazes de perceber os impactos dos preços dos combustíveis na inflação dos alimentos, que é menor para quem ganha a partir de cinco salários mínimos – único estrato econômico que dá liderança a Bolsonaro nas pesquisas eleitorais.

Como não é idiota, Bolsonaro faz barulho. Culpa a Petrobras. Troca presidente. Ameaça privatizar a estatal. No desespero, já faz o cálculo para saber se, agora, vale a pena uma briguinha com os acionistas minoritários da estatal para segurar os preços, pelo menos, até outubro.

Sabemos que nada disso próspera, porque o clima é de butim. A Petrobras é gerida como se não houvesse amanhã. Dos R$ 106 bilhões que lucrou em 2021, reservou menos de R$ 5 bilhões para investimentos e distribuiu o restante para os acionistas.

Também foi escolha de governo acelerar a venda de refinarias e não ampliar a capacidade de refinamento do petróleo. Agora, segundo a Federação Única dos Petroleiros, o Brasil corre risco de desabastecimento de diesel, pois há escassez de oferta no mercado internacional e o país importa 25% do necessário para suprir a demanda interna, mesmo estando entre os 12 maiores produtores mundiais da matéria-prima do combustível.

Bolsonaro não é idiota, repito, mas a população brasileira também não é e tem dado demonstrações inequívocas de sua sapiência: a próxima delas – e decisiva – será oferecida ao futuro da nação no dia 2 de outubro.

Thiago Dias é repórter e comentarista do PIMENTA.

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