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Celina Santos

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As cenas da novela das oito, mostrando a sociedade indiana dividida entre pessoas de casta e pessoas sem casta (os dalits), causam repulsa em muitos telespectadores. Naquele país é visível o preconceito que relega aos extremamente pobres a condição de mera poeira. Mas seria hipocrisia não reconhecermos que aqui no Brasil também temos os nossos dalits. Assim como na Índia, por aqui eles somam milhões. Na prática, são discriminados de inúmeras formas, enquanto na teoria têm o amparo do artigo 5º da Constituição, que apregoa: Todos são iguais perante a lei.

Em Itabuna, Sul da Bahia, um exemplo gritante dessa condição é a vida de Edna Oliveira Melo (foto), de 48 anos, moradora do bairro Fátima. Em primeiro lugar, ela é dalit diante da casta dos Beneficiários dos Planos de Saúde. Porque não tem dinheiro para custear um tratamento adequado contra a úlcera crônica que traz na perna há mais de seis anos.

O resultado da enfermidade é que essa mulher se arrasta pelas ruas, convivendo dia e noite com o fantasma da dor. Esse fantasma a acompanha até o posto médico, quando vai fazer curativo, até a farmácia, quando busca um analgésico qualquer, até qualquer canto da rua, onde haja uma garrafa pet que possa vender.

Diante da casta das Madames, que podem comprar uma calça jeans por 1500 reais, Dona Edna talvez seja mesmo tratada como poeira. Porque sobrevive com menos de 100 reais por mês, graças à venda do material reciclável que consegue catar. Isso, é claro, quando a dor lhe permite dar algum passo.

Dona Edna é dalit até mesmo diante da casta dos Empregados com Carteira Assinada, porque a vida inteira trabalhou em subempregos e nunca pôde contribuir para assegurar sua aposentadoria, ou um auxílio, um amparo na hora da doença. Tudo isso apesar de pagar impostos desde a hora que escova os dentes.

Hoje, dona Edna, pela enésima vez,

estará diante de um perito do INSS.

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Hoje (22), pela enésima vez, essa senhora estará diante de um legítimo representante da casta dos Peritos do INSS. Respaldados pelos poderes do ‘deus’ Previdência Social, eles analisam se a pessoa precisa ou não ser beneficiada com o auxílio-doença de 415 reais.

Incrivelmente, até então, as tentativas junto ao órgão da Seguridade Social foram frustradas. Porém, assim como em todas as oportunidades anteriores, Dona Edna vai para o encontro cheia de esperança. Afinal, foi novamente encaminhada pela secretaria de Assistência Social da Prefeitura de Itabuna (que já lhe concedeu, inclusive, o direito à gratuidade no transporte por considerá-la deficiente). Além disso, na hora da perícia, terá em punho dois laudos médicos que atestam sua incapacidade para o trabalho.

Cientes dessa história, nós, da casta dos jornalistas (profissionais que sonham em ser olheiros da sociedade), só podemos estar vigilantes. Entretanto, vigilância à parte, fica aqui a torcida para que, desta vez, diferentemente dos dalits da Índia, nossa dalit brasileira não seja tratada como poeira, e sim como uma cidadã que precisa – e é merecedora – de amparo. Fica a torcida para que não seja necessário recorrer à casta dos Procuradores do Ministério Público Federal.

Celina Santos é redatora do jornal Diário Bahia e, no caso em questão, também se sente poeira frente à chaga da desigualdade social.

0 resposta

  1. Celina parabens pelo seu trabalho jornalistico, que os burocratas da previdencia se sensibilizem com as dificuldades da sra Edna, e que a GLOBO tenha a coragem de mostrar as “castas” brasileiras

  2. Tantos absurdos, tantos absurdos… Cel, parabéns pela sensibilidade de enxergar como seres humanos aqueles que tantos só veem realmente como poeira. Sinto que muitos estão cegos e não percebem que um dia toda essa poeira vai virar uma tempestade (já está virando), como aquelas dos desertos… E vai invadir as casas dos porretas, entrar nos olhos deles, acabar com o brilho dos móveis sofisticados e destruir seu belo jantar. Não haverá como conter a revolta dos que têm sido, ao longo de séculos, maltratados, humilhados e espoliados. Como diz Lenine, “Olho na pressão (tá fervendo), olho na panela / Dinamite é o feijão cozinhando, dentro do molho dela…”

  3. Parabéns, brilhante trabalho jornalístico. Vou torcer para Dona Edna conseguir o benefício. Assim como eu, acho que os demais leitores gostariam de saber o resultado, se puder informar, agradeço.

  4. Sinto falta de reportagens deste nível de sensibilidade e comprometimento, o jornalismo deveria enveredar pelo humanismo sem ser apelativo ou piegas.
    Vi esta mulher divessas vezes e me causou comoção, se o caso torna-se público sem tirar a dignidade do ser humano, a vida destas pessoas mudará de verdade.

    Parabéns Celina

  5. Parabéns, Celina, pela sensibilidade, pelas analogias. Torço para que o representante da “casta dos peritos” do INSS resolva enxergar em dona Edna, uma pessoa digna do benefício que esta senhora tão sofrida, faz jus.

    Aproveito o ensejo para destacar: fala-se muito em inclusão dos negros no Brasil, mas esquecem que os “dalits” brasileiros, não são só os negros. A senhora em questão, é branca, de cabelo lisinho. Portanto, inclusão só de afro-descendentes é discriminação.

  6. Sensivel a jornalista, boa história relatada, só não entendo porque até jornalista tem que ter formação em novelas.

    Precisamos trazer o brasileiro para vida real e não engano de novela.

  7. Parabens Editores do pimenta na muqueca, EM VEZ DE FICAR FAZENDO POLITICA, VOCES DEVERIAM DIVULGAR MAIS A REALIDADE DA SOCIEDADE ITABUNENSE PARA VER SE OS POLITICOS SE CONCIENTIZEM E EM VEZ DE GASTAR DINHEIRO EM PROJETOS SEM FUTUROS, INVESTIREM NA SAUDE E NAS AÇOES SOCIAIS COMO COMBATE A POBREZA E A VIOLENCIA, FALANDO EM VIOLENCIA O QUE ESTA ACONTECENDO COM NOSSA CIDADE HEIM! ASSALTO EM PLENA LUZ DO DIA, HOMICIDIOS E VARIOS DELITOS, GOSTARIA QUE VOCES FIZESSEM UMA REPORTAGEM ABORDANDO ESSE ASSUNTO “VIOLENCIA”, COM UMA ATENÇAO MAIOR, OBRIGADO PELO ESPAÇO CEDIDO PARA NÓS LEITORES OPINARMOS.

  8. Parabéns Celina pela sua reportagem, pois trata do assunto com responsabilidade, sem sensacionalismo. No entanto, infelizmente a sociedade não quer enxergar o que vê todos os dias à sua volta.

  9. Fico sentida em ver os brasileiros sofrerem tanto as consequencias da desigualdade social. D. Edna faz parte do universo de brasileiros que tem uma vida sofrida e dificil. Sonho tanto em ver um dia essas desigualdades se anularem, pois diante de Deus somos todos iguais e mereçemos a felicidade. Desejo uma boa sorte a D. Edna!!!

  10. Gente, estaremos acompanhando sim. E o resultado da perícia, se ela acontecer mesmo hoje, será tornado público sim. Vamos torcer, porque a situação pela qual essa senhora passa fere qualquer ser humano que se depare com ela. Exceto os peritos que a receberam até então.

  11. POR ISSO EU TRATO A TODOS COMO SE EU FOSSE AQUELA PESSOA QUE ESTÁ ALI, DEUS ME ENSINOU A AMAR O PRÓXIMO COMO O SEU SEMELHANTE,MAS COMO ELE DIZ:ESTÁ MAIS FÁCIL PASSAR UM CAMELO QUE” SIGNIFICA CORDA GRANDE E GROSSA”PELO BURACO DA AGULHA DO QUE UM RICO ENTRAR NO REINO DOS CÉUS, MESMO ELE FAZENDO CARIDADES NO SEU CORAÇÃO ESTÁ A MALDADE, POIS ELES NÃO COMPARTILHAM AS SUAS ALEGRIAS, EXCLUINDO SEUS IRMÃOS, ESSE MUNDO É PASSAGEIRO, MUITOS CORAÇÕES ESTÃO SE ESFRIANDO, COMO NO TEMPO DE ISRAEL QUE DEMOROU 40 ANOS PARA A TERRA PROMETIDA E MUITOS SE PERDERAM NO CAMINHO,DEUS VOLTARÁ E QUEM NÃO SE CONVERTER FICARÁ PENANDO SOBRE A TERRA!! NA ÉPOCA DE NOÉ TODOS RIRAM,NÓAS ESTAMOS EM UMA BOLA QUE DEUS QUISER MANDAR UM ASTERÓIDE ACABAR COM A TERRA NÃO SOBRARÁ NADA NEM A MEMÓRIA E SIM QUEM GUARDAR OS ENSINAMENTOS DE DEUS SE LIVRARÁ.

  12. Muito comovente sim…acho que quando histórias como essa se tornam públicas, fica mais fácil ajudar!Acho que posso fazer algo p tentar resolver isso e farei o possível!
    Escrevam mais histórias assim, que mais pessoas poderão ser ajudadas!

  13. Em relação ao INSS, quero informar o seguinte. Cria-se grandes difilcudades para aposentar pessoas dígnas, enquanto isso aquí na minha rua tem um traficante que levou um tiro no braço esquerdo no que ocasionou o encolhimento dos seus dedos, não o desabilitanto para o trabalho, tanto é que o sujeito continua no tráfico, e o mesmo conseguiu se aposentar sem a menor dificuldade. Fico preocupado comigo que já contribuo as mais de 20 anos. Da mesma forma minha esposa contraiu L.E.R. Procurou o INSS e o médico-perito( drºRui) conçedeu-lhe o bebeficio. Passados 30 dias a minha esposa retornou para a 2ª pericia. Mesmo sentido as mesmas dores e com o mesmo problema, a médica-perita( comenta-se que é a esposa do Drº Rui ), suspendeu o beneficio. O que o INSS não explica é a quantidade de aposentadorias irregulares que o orgão expede.

  14. Parabéns à jornalista,pela sensibilidade ao fazer essa matéria,parabéns ao Pimenta,pela publicação!

    Esse,infelizmente,é o retrato da Bahia e do Brasil de todos ‘os nós’…

  15. a coragem e a dignidade encontra-se em qualquer “casta” pergunto-me constantemente onde anda os procuradores publicos para intervirem nesta ferida, ja que recebem exclusivamente para isto. ja que a “casta” dos politicos que legislam nao sao so imcompetentes sao muito mais ainda negligentes.

    Parabens Celina continue metendo a caneta na ferida.

  16. Parabens pela reeportage.Mostra sua sensibilidade,coragem,para falar de um assunto que faz a sociedade não enxergar o que não lhe interessa.

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