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Osias Ernesto Lopes
É sempre bom ouvir e falar de música, notadamente da música popular brasileira. E aqui o faço apenas enquanto ouvinte e amante desta arte que tanto bem faz à alma, e especificamente para dizer de sua importância, da verdadeira trilha sonora que é formada ao longo de nossa vida. Inegavelmente que muitos dos momentos vividos, seja de felicidade, de tristeza, de festejos, têm quase sempre uma música especial, como que a emoldurá-los. E o que dizer dos namoros, dos amores, sem uma música que os adorne?
Minha geração foi privilegiada musicalmente, sem dúvida. Vivemos os tempos da Jovem Guarda, do Tropicalismo, vimos o rock and roll, ou rock n’roll, se solidificar e ser exaltado pelo imorredouro baiano Raul Seixas, assistíamos a alegria contagiante de Jair Rodrigues, e o samba de Martinho da Vila ecoar. Era um tempo em que todas as músicas de um LP (Long Play) faziam sucesso!
Foi uma juventude embalada por canções entoadas pelo “rei” Roberto Carlos e sua turma da Jovem Guarda. Quem nasceu na década de 1950 que nunca cantarolou alguma música romântica de Wanderley Cardoso, Jerry Adriani, Agnaldo Timóteo, The Fevers, Renato  Seus Blue Caps, Elis Regina, Chico Buarque de Holanda, Gil, Caetano, Gal e Bethânia, etc.?
São artistas que, além de também produzirem músicas que embalavam nossos sonhos juvenis, ajudavam a aprimorar a formação de nossos pensamentos político-sociais e sedimentar o senso crítico. Eram obras que, digamos assim, se completavam e formavam um ambiente deveras lúdico, romântico, alegre e inteligente.
Lógico que esses são apenas alguns poucos nomes do enorme elenco que nos fins dos anos 1960, nos anos 1970 e até meados dos anos 1980, habitavam magistralmente a chamada MPB. A relação de nomes é demasiadamente vasta. Não cabe aqui (literalmente, inclusive) relacioná-los.
Registre-se que era um tempo que ainda contava com a realização de grandes festivais de música, que se expandiam até as escolas (os famosos festivais estudantis), e com shows de filarmônicas em praças públicas, especialmente quando em data de comemoração cívica, dentre outras atividades artísticas.
Essas colocações são a propósito de uma entrevista com que me deparei folheando A Tarde [o artigo foi escrito em 25 de julho]. Era do maestro Júlio Medaglia, falando sobre a falta de divulgação de músicas de qualidade. O tom de lamento do maestro é doloroso porque real. Sua assertiva de que a “mediocrização geral da música popular é uma coisa universal” é preocupante e nos leva a refletir.
Bem, óbvio que não se pode arredar o fato inconteste de que existem trabalhos de nível sendo elaborados, produzidos no mundo musical atual, mas… e sua divulgação? Por que tais obras não mais chegam ao povo como antes?

Nenhum outro país tinha uma música popular dessa qualidade num veículo de massa tão forte. Se colocar coisa boa no ar, as pessoas vão ver”

Lembra o maestro Medaglia que até meados dos anos 1980 o que havia de bom estava no rádio e na televisão e afirma: “no período dos grandes festivais, quanto mais subia a qualidade da música, mais subia a audiência”.
Ele cita como exemplo o festival da Rede Record, em 1967, com 94% de audiência, e sentencia: “nenhum outro país tinha uma música popular dessa qualidade num veículo de massa tão forte. Se colocar coisa boa no ar, as pessoas vão ver”. Também acredito.
Medaglia, pelo conteúdo de sua entrevista, está convencido de que tal “mediocrização” da música se assenta na constatação que ele próprio faz de que os meios de comunicação “cresceram demais”, pois, “ficaram muito rápidos, ágeis e ansiosos por lucro, o que levou à simplificação das coisas para vender mais depressa, para o cara jogar fora e comprar outro”.
Fundamentando, diz ele que “o mecanismo industrial no mundo inteiro é fazer uma coisa mais superficial para que seja descartada e substituída rapidamente”, e conclui: “mas as coisas da alma não se pode tratar da mesma forma que a compra, venda e fabricação de automóvel, celular e tênis”.
É…, observando as coisas como estão, mesmo que não se concorde com tudo que diz Medaglia, por se tratar de arte, o tema merece profunda reflexão!
Osias Ernesto Lopes é advogado, ex-Procurador-Geral dos Municípios de Ilhéus e Itabuna e ex-secretário de Administração de Itabuna.

Uma resposta

  1. Parabéns por mais este bom artigo. Sugiro que continue focando no tema. Os apreciadores da boa música certamente serão confortados/agradecidos, e, quem sabe os dirigentes dos meios de comunicação comecem a refletir sobre o assunto – atendendo a sua oportuna sugestão.

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