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Quem, como Alencar Pereira da Silveira, nasce no dia consagrado a Iemanjá tem o corpo fechado e uma legião de amigos para clamar: Vida longa ao Caboclo Alencar!

 

Walmir Rosário

Se não puder ajudar, pelo menos não atrapalhe! Esse bordão é bastante antigo e não sai de moda, acredito eu que para passar um pito, chamar a atenção, dar um esfrega nas fuças do dito cujo que faz o que não deveria. Isso vale – e muito – para o sacripanta que uns dias atrás espalhou pelas redes sociais uma notícia falsa – ou fake news, como está na moda – dando conta que o Caboclo Alencar teria morrido.

Neste dia, logo cedo, enquanto esperava o café ser posto à mesa, me deparei com essa heresia no Facebook, no Instagram e no Whatsapp, de que o Caboclo teria partido para o outro mundo sem se despedir de ninguém. Com essa profusão de notícias ruins sobre os amigos que se vão, de início fiquei alarmado, mas fui me recuperando aos poucos todas as vezes que analisava uma premissa sobre sua morte.

Ora, sem mais delongas iniciei uma série de ligações para amigos comuns que trataram de desmentir a calúnia na mesma hora e prometeram tomar providências junto à polícia, à justiça e até ao papa, com a firme intenção de aplicar um castigo eficaz no mentiroso. Justamente quando o Caboclo Alencar acaba de comemorar seus 90 anos bem vividos um sujeito qualquer decreta a morte dessa autoridade, sem mais nem menos.

Mesmo neste terrível tempo em que a pandemia assola o mundo – incluído aí o Brasil e Itabuna – o Caboclo Alencar continua prestando relevantes serviços à sua clientela, servindo as deliciosas e quase sexagenárias batidas. Se bem que o Caboclo Alencar poderia se valer do alto dos seus 90 anos para resolver se aposentar do trabalho e passear com sua Neusa mundo afora. Mas não, continuou na labuta.

A única mudança que se permitiu foi mudar a linha de produção da indústria implantada no Beco do Fuxico, onde também funciona o internacionalmente famoso ABC da Noite, para a sua residência. É bom que se diga que também se permitiu a outra mudança: deixou de servir as batidas no varejo e agora somente trabalha em atacado, comercializando-as a partir de embalagens de litro.

Sujeito modesto esse Caboclo Alencar, que continua firme na lida para não deixar os alunos – repetentes ou não – do ABC da Noite a ver navios. Que ninguém repare não ser servido na forma tradicional, de pé no balcão e em pequenos copos de plásticos em dois tamanhos, pois não convém manter esse serviço em sua própria residência, cujos frequentadores são apenas os convidados.

Mesmo assim, na porta de entrada o Caboclo não se furta de entregar os maravilhosos litros de batida, quase sempre acompanhados de uma dose da bebida, para deleite do ilustre cliente. Nestas semanas em que prevalece o lockdown, nada melhor do que passar o fim de semana em casa e devidamente abastecido. Afinal, um boêmio distinto é conhecido pelos serviços que presta ao recepcionar seus convidados.

Mas voltando ao malfazejo que transmitiu essa heresia ao mundo por meio da internet, fico aqui imaginando o que o Caboclo Alencar teria feito de mal ao dito cujo, para premeditar tamanha vingança. Teria ele passado pelo Beco do Fuxico e dado de cara, por dias a fio, com o ABC da Noite fechado e se sentiu prejudicado no seu sagrado direito de beber uma das batidas, conforme mandava a tradição?

Não acredito na atitude mesquinha desse sujeito e rogo que a justiça venha a dar o tratamento merecido ao dito cujo, no tamanho que merece o tresloucado ato praticado. Se falhar a justiça dos homens que, pelo menos, atue a divina, e que ele seja, no mínimo, proibido de beber as tradicionais batidas do ABC da Noite por um longo período, na mesma proporção do estrago que causou aos amigos do Caboclo.

Para os que ainda não tomaram ciência do que representa o Caboclo Alencar, vai aqui uma simples amostra da importância desse homem para os frequentadores do ABC da Noite, tanto os diários como os esporádicos. De portas abertas desde 1962, o Caboclo coleciona uma carteira de amigos e clientes que ultrapassam limites, divisas e fronteiras, que sempre voltam para uma mais uma dose.

Itabunense nascido em Sorocaba (SP), Alencar Pereira da Silveira teve a ideia de transformar o açougue em que comercializava carne de porco em uma casa de batidas, cervejas e tira-gostos. De lá pra cá não fez outra coisa na vida que não fosse proporcionar a felicidades dos costumeiros clientes, transformando seu negócio numa verdadeira casa de amigos. E tantos amigos que crescem a cada dia.

E para tomar a saideira, de cara vou avisando ao dito cujo carcará sanguinolento que praga de urubu magro não pega em cavalo gordo. Quem, como Alencar Pereira da Silveira, nasce no dia consagrado a Iemanjá tem o corpo fechado e uma legião de amigos para clamar: Vida longa ao Caboclo Alencar!

Walmir Rosário é radialista, jornalista e advogado.

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Kennedy Alencar, do UOL

Ao tirar a competência da 13ª Vara Federal de Curitiba para julgar o ex-presidente Lula, o ministro do STF Edson Fachin anula todos os atos processuais em relação ao petista. Ou seja, de balaiada, anula duas sentenças (apartamento do Guarujá e sítio de Atibaia) e uma denúncia (terreno da Odebrecht para Instituto Lula) contra o ex-presidente.

A decisão devolve Lula ao jogo político, pois ele volta a ser ficha limpa e estará livre para concorrer à Presidência em 2022 se não tiver outra condenação em segunda instância até lá. O efeito é politicamente poderoso, pois evidencia a parcialidade no tratamento de Lula por Sergio Moro. Será muito difícil que Lula não esteja na cédula eleitoral do ano que vem.

Como o Brasil não é para amadores, Fachin tenta salvar o que restou da Lava Jato, que vem se enfraquecendo com a exposição das lambanças de Moro, Dallagnol e cia. ao corromperem o processo judicial. Se são nulos os atos de Moro, não é necessário mais julgar a sua suspeição, algo que estava pendente na Segunda Turma do STF. Ela, a suspeição, é mais do que evidente com a decisão de Fachin, que tenta isolar o caso do ex-presidente dos demais julgados por Moro. Clique e confira a íntegra do artigo de Kennedy Alencar em sua coluna no UOL.

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Espera-se que a atual geração corrija a caminhada e reverbere um novo percurso. Certamente, seremos mais criativos, inovadores

Efson Lima | efsonlima@gmail.com

A sociedade convencionou comemorar o dia internacional da mulher em 8 de março, anualmente. A data faz lembrar lutas históricas, entre elas, o motivo que levou uma parte dos países no mundo a relembrar esse dia.  Louvemos todas as mulheres, entretanto, peço licença para reverenciar aquelas  que fazem da escrita a luta diária, utilizam suas vozes para promover direitos,  afirmam o empoderamento feminino no dia a dia e apresentam caminhos para uma sociedade. As letras representam uma das feições mais avançadas de uma sociedade e registram o trajeto humano.

Como sabido, o ambiente do ensino superior no primeiro momento esteve reservado aos homens. Entretanto, as mulheres foram quebrando as correntes e adentrando no espaço que, aparentemente, tinha sido  projetado para a perpetuação da masculinidade. E, agora, elas não só têm concretizado suas formações, mas se espalhado na efetivação de diversos ofícios. Buscam ocupar as diferentes profissões. Tornam-se professoras, médicas, advogadas, enfermeiras,  juízas, engenheiras, escritoras… empreendedoras elas foram sempre.

O Coletivo Flisba (Festival Literário Sul-Bahia) busca compreender esse processo. Não sem razão, promoverá no dia 08/03, às 21 horas, pelo Instagram,  uma live para refletir sobre a data. A mediação da atividade será feita pela professora Silmara Oliveira, presidenta da Academia de Letras de Itabuna (ALITA) e a convidada será a professora Tica Simões, professora universitária da UESC, que formou uma geração de pessoas e orientou tantas outras no campo da literatura, do turismo e da cultura. Ambas, sócias da ALITA. Além disto, são duas mulheres que exaltam a literatura do sul da Bahia  e, certamente, vão refletir sobre a obra da poeta Valdelice Pinheiro, cuja escritora é a homenageada do Bardos Baianos – Litoral Sul.

O FLISBA reservou ainda dois outros momentos: em 09/03, às 20 horas, vai promover  uma live com o tema “Violência oculta e explícita contra a mulher”  no perfil do Flisba e no dia 11/03, uma roda de conversa “DE MULHER PARA MULHER – Desabafos e descobertas”. A roda de conversa receberá inscrições no Sympla. Estas duas atividades serão  conduzidas por Indyara (Indy) Ribeiro, psicóloga e psicanalista, e da professora  Luciana Chagas, ela que é doutora em Psicologia Clínica (USP), psicanalista e pesquisadora.

Como explicitado, o campo das letras é poder. Falar é poder. Dominar o código é ter assegurado um caminho. Mas nem sempre foi uma caminhada tranquila para as mulheres e mesmo se assenhoreando do código não significa que o trajeto só será de flores. Vejamos,  Júlia Lopes, uma grande escritora brasileira, teve seu nome apagado da ata de fundação da Academia Brasileira de Letras. Para o seu lugar, colocou-se o esposo. A esposa do jurista Clóvis Beviláqua até tentou, mas foi escamoteada. Mais tarde, Rachel de Queiroz quebrou as correntes sexistas e adentrou  ao  Petit Trianon, que não só representou uma conquista pessoal, mas também coletiva e, simbolicamente, retomou a história de Júlia Lopes, que teve seu direito cerceado no museu Pedagogium, no Rio de Janeiro, naquele 20 de julho de 1897, quando da fundação da ABL. A professora Jane Hilda Badaró tem um excelente artigo publicado sobre as mulheres nas academias de letras, na Revista Estante da Academia de Letras de Ilhéus. Ela traça um panorama do ingresso das mulheres nesses espaços.

O sul da Bahia além de cacau, sempre deu escritoras. Não sem razão, temos uma plêiade de mulheres para serem lidas e estudadas. Peço licença para registrar as flisbianas, pois, elas têm colaborado significativamente para as artes e as letras no sul da Bahia. Elas promovem lives, escrevem poemas, participam de saraus, usam suas redes sociais e proclamam um novo estado de poesia. Elas não perdem a criticidade, provocam reflexões e nos sinalizam outros caminhos. Avançam no campo da gestão cultural, se socorrem na arte da docência para o sustento; pintam telas para retratar a região e sua gente; cuidam de museus e do patrimônio cultural, fazem gestão cultural e estudam.  Não teríamos Flisba sem as presenças e sem as atuações destacadas delas. Algumas com mais tempo no grupo, outras chegando, elas se somam e mostram a força do “mulherio”: Anarleide Menezes, Aurora Souza, Cremilda Conceição, Hussiane Amaral, Indy Ribeiro, Laura Ganem, Luh Oliveira, Raquel Rocha, Sheilla Shew, Silmara Oliveira, Sophia Sá Barretto e Jane Hilda Badaró. Um salve, dois salves para elas que cumprem diversas jornadas e encontram forças para voluntariamente nos oferecer luzes sob a perspectiva de que uma outra humanidade é possível.

O feminino nunca foi problema. Problema sempre foi a masculinidade tóxica que impediu a mistura de homens e mulheres nos espaços, impossibilitou as trocas de experiências e dificultou uma geração  com mais empatia. Espera-se que a atual geração corrija a caminhada e reverbere um novo percurso. Certamente, seremos mais criativos, inovadores, consequentemente, poderemos ser chamados de seres humanos dotados de inteligência e reflexão crítica.

Efson Lima é doutor, mestre e graduado em Direito (UFBA), membro do coletivo Flisba, professor universitário e advogado.

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A Deus, o nosso destino. A nós, a tentativa de acolhimento de todos! Estamos juntos?

Manuela Berbert || manuelaberbert@yahoo.com.br

Após um período sabático, estou de volta aos artigos. Falaremos sobre a vida, cotidiano, empreendedorismo e política, sempre aos domingos. E eu pensei em começar esse texto de diversas formas ou com um título autoexplicativo, mas optei por deixar o questionamento no ar justamente para que ele não selecione, logo no comecinho, os “interessados” ou não pelo tema. Precisamos falar sobre isso, sem reservas. Todos nós!

Durante oito anos estive à frente da comunicação da Santa Casa de Misericórdia de Itabuna. Pedir desligamento, no segundo semestre de 2019, foi uma das decisões mais difíceis da minha vida, e isso não é segredo para ninguém. De um lado, a vontade absurda de, enfim, tocar a minha empresa de Comunicação e Eventos. Por outro, além do medo do novo, a paixão pela gestão de Dr. Eric Júnior enquanto provedor, já que eu coordenava sua equipe de comunicação (tendo ao lado uma das maiores profissionais de produção, gestão e marketing da região, Jaqueline Simões). A inteligência dele, acima da média, rapidez de raciocínio e garra, contagiam, e sou prova viva disso. Eram 298 desafios por dia, mas que me prepararam para a independência profissional como nenhuma outra experiência! Saí, e meses depois fui (fomos) surpreendidos pela pandemia. No primeiro momento, inúmeros questionamentos. Hoje, tenho a certeza de que não tinha condições emocionais de passar por este momento ali dentro.

Assisti, na última semana, a Dr. Eric Junior na TV (atualmente coordenando a UTI Covid-19) falando dos capacetes que evitam a intubação, e me emocionei vendo o quanto está visivelmente exausto! Todos os médicos estão exaustos! Os enfermeiros, técnicos, fisioterapeutas e demais profissionais. Os empresários também estão exaustos! Os pais de família estão exaustos! As mães estão exaustas! Aquelas que nunca exerceram a função de professoras dos próprios filhos estão exaustas! Os professores lidando com ensino à distância também estão! Os jovens que sonharam com a vida acadêmica estão exaustos! Os adolescentes privados do convívio com os amigos estão exaustos! As crianças estão exaustas! Estamos todos! E a cobrança de ser bom, bonito e bem sucedido neste momento deixa uma poeira densa e ainda mais pesada no ar. Por isso, precisamos falar de saúde mental! Abertamente! Para nos ajudarmos a passar por esta fase tão delicada que jamais imaginamos um dia, e que não tem um fim definido. Por que ainda nos incomodamos tanto com esse assunto?

Ao mesmo tempo, diante de todo o caos, é preciso lembrar que estamos aqui! Estamos vivos! E precisamos passar por esta vida sentindo o coração pulsar de verdade, para termos a sensação de não estarmos vivendo em vão. Precisamos sonhar, embora a pandemia esteja aí nos provando que não temos o controle de nada. Que dubiedade de sentimentos! Uma loucura coletiva a qual fomos todos expostos, e que o “salve-se quem puder” não reverbera, afinal a doença é pandêmica, embora o tratamento e sintomas sejam tão individuais. A Deus, o nosso destino. A nós, a tentativa de acolhimento de todos! Estamos juntos?

Manu Berbert é publicitária!

Imagem da pintura "A parábola dos cegos" (Pieter Bruegel, 1568)
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Que líder fuleiro, perverso e egoísta vocês me arranjaram. Isso não tem nada a ver com política. É ser ruim ou ser bom. E, infelizmente, esse filho da puta de franja não tem nem nunca teve nada de bom.

Rodrigo Melo

Estamos à beira de algo nunca visto antes, nem mesmo em época de guerras, e vai acontecer aqui mesmo, no Brasil: pessoas morrendo como as frutas caem das árvores, sem que ninguém possa reparar. Há mais de um ano se previa isso, mas aí aparecia esse pessoal raivoso e cheio de razão falando sobre combater comunistas e gritando, enlouquecidos, pelo capitão, o único homem honesto sobre a terra. Muitos ainda fazem isso: por orgulho e pela vaidade de não aceitarem que erraram, que esse presidente é um grande pau no cu.

O capitão não é honesto, nunca foi, todo mundo agora sabe, mesmo esses arautos da moralidade, tanto que faz tudo às escuras e vive fugindo de investigação, criando inclusive a PEC da impunidade para livrar um dos filhos da cadeia. E para ele próprio quando precisar. E para livrar os outros filhos também. Todos eles metidos com crime e contravenção. E se você não enxergar isso, você também é muito cara de pau.

Hoje o Brasil saiu do grupo das dez maiores economias do mundo. O gás subiu, ao contrário do que dizia Paulo Guedes, e nós somos o único país onde a pandemia aumenta em vez de diminuir. Morre-se aos montes, sem parar.

Enquanto isso, o filho primeiro compra uma casa de milhões só para dar o recado de que ele pode fazer o que quiser e que nunca vai ser preso, pois vai ter o pai para corromper a lei e uma porção de besta, todos prepotentes e petulantes, servindo de advogados de defesa, espalhando fake news e brigando em nome de um sujeito que no fundo não está nem aí pra ninguém.

Que líder fuleiro, perverso e egoísta vocês me arranjaram. Isso não tem nada a ver com política. É ser ruim ou ser bom. E, infelizmente, esse filho da puta de franja não tem nem nunca teve nada de bom. Assim como todos que, por detrás de suas vidas esplendorosas e exemplares, avalizaram todo esse terror.

Rodrigo Melo é escritor; publicou Jogando dardos sem mirar no alvo, O sangue que corre nas veias, Enquanto o mundo dorme e Riviera

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Em vez de ser considerada um dos sete pecados capitais, a gula, para esse modesto comilão, é a satisfação do prazer de comer – bem e muito –, saciando a costumeira fome e degustando os sabores. Não importa se num restaurante grã-fino e laureado com as medalhas da moda e pouca comida, ou num pé sujo (com todo o respeito)

 

Walmir Rosário

A depender de onde estamos e com quem falamos quando o assunto é alimentação, geralmente ouvimos que o melhor tempero para a comida é a fome. Não discordo que a barriga vazia e a vontade de comer sejam componentes para esvaziar um bom prato, mas outros atributos mexem com nossos olhos e as papilas gustativas, destacando os sabores doces, salgados, amargos, azedos e umami (chic), sem falar nos gostos.

E essas diferenças podem ser notadas e degustadas independentemente do local em que estivermos fazendo nossa refeição. Isto quer dizer que tanto nos famosos e laureados restaurantes, os famosos “pé sujo”, ou em casa, o toque dos chefs renomados, cozinheiros ou quem mais se aventure no forno ou fogão é fundamental para saborearmos uma boa, excelente ou má refeição.

Muitos restaurantes tipo “pé sujo” possuem uma respeitável clientela, daquelas que têm direito a cadeira cativa num determinado dia de semana, saboreando um bom prato – melhor, dois ou mais tipos diferente de proteínas (boi, porco, carneiro, aves, peixes…) – e saem pra lá de satisfeitos. A cada dia uma especialidade da casa, daquelas de deixar qualquer ser vivente com água na boca.

Não basta encher a barriga, mas degustar cada tipo de comida, seja proteína, carboidrato, gordura, ou o que valha, é por demais essencial para que o cliente volte na próxima oportunidade ou se torne um freguês assíduo. E como dizem que a melhor propaganda é a feita de boca a boca, por certo, novos acompanhantes estarão dispostos a socializar as delícias desses restaurantes.

Em vez de ser considerada um dos sete pecados capitais, a gula, para esse modesto comilão, é a satisfação do prazer de comer – bem e muito –, saciando a costumeira fome e degustando os sabores. Não importa se num restaurante grã-fino e laureado com as medalhas da moda e pouca comida, ou num pé sujo (com todo o respeito), no qual a fartura é fundamental.

Nessas minhas andanças por restaurantes brasileiros e de outros países, pude constatar que o tamanho do prato é inversamente proporcional aos preços cobrados do distinto cliente, sem tirar nem por. E são muitos os pé sujos espalhados por esse imenso país, notadamente nas feiras livres e locais de movimento, como portos, rodoviárias e os que servem a comidinha de cada dia aos comerciários e industriários.

Comida de sustança para quem pega pesado no trabalho – ou nem tanto, mas que aprecia uma boa rabada, mocofato, cozido, sarapatel, sobe e desce, e outras delícias regionais nem tão conhecida por todos. E todos bem temperados, com especiarias das mais diversas, como queriam os portugueses ao ganhar o mundo nas circunavegações, deixando esse legado para nós pobres mortais.

À vezes nem mesmo precisamos sair de casa para provarmos esses manjares dos deuses, prática que tenho utilizado nesses últimos tempos em que a quarentena é recomendada pelas autoridades – nem sempre médicas – e que temos que obedecer. Quase sempre nem requer muito trabalho, desde que feito de maneira correta o planejamento, com a compra dos insumos principais e acessórios.

Outras vezes nem mesmo precisamos sair de casa, principalmente quando se aproxima o fim de semana, em que as panelas precisam ser renovadas. Basta fazer uma vistoria na geladeira e acreditar na consagrada teoria de Antoine-Laurent de Lavoisier, cientista das áreas da química e biologia, que mostrou ao mundo que “na natureza nada se cria e nada se perde, tudo se transforma”.

E foi o que fiz numa sexta-feira dessas, em que a chuva leve e intermitente cismou de modificar meus planos em encontrar os amigos, conforme prometido: ao meio-dia em pino, num desses recatados bares. Como o tempo chuvoso não permitiu, tratei eu de me virar por conta própria, dando-me ao luxo de sequer sair de casa. Para ganhar inspiração fui em busca de uma boa cachaça e algumas cervejas, disponíveis em no recato do lar.

Bastou abrir a velha geladeira e conferir a pequena sobra do feijão gordo da semana, misturá-lo com farinha e transformá-lo num especial tutu à mineira, arroz, cortar e passar na banha a última folha de couve, fritar umas fatias de bacon, linguiça calabresa e, com a sobra da gordura fritar um ovo, devidamente mexido. Para me sentir num pé sujo, bastou colocá-los num prato branco e numa toalha bem surrada.

Para me despedir, não pensem os senhores que estão com água na boca, que me enganei ao citar a ingestão de muita comida e apresentar um prato pouco condizente com o texto acima elaborado. Como ninguém é de ferro, do planejamento ao começo dos trabalhos etílicos, a eles se juntaram os tira-gostos, consumidos sem dó nem piedade. Afinal, o que de melhor fazer numa sexta-feira acinzentada e chuvosa?

Walmir Rosário é radialista, jornalista e advogado.

Na crônica de Rodrigo Melo, o golpe burguês do vestido clonado || Foto ilustrativa
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Tirarei onda contigo e com o seu marido e com seus filhos e com todos esses filhos da puta que acham que cagam melhor e vivem reinando em suas patotas. Eu serei foda, minha senhora, e vocês me chamarão para os seus aniversários e ficarão frustrados quando eu não aparecer.

Rodrigo Melo

A campainha toca e eu largo a caneta e o papel sobre a mesa e vou atender. Talvez seja o oficial de justiça. É uma senhora com uma sacola cheia de tecidos. Minha mulher costura, de maneira que sempre aparecem essas madames, quase todas usando óculos escuros, carros bacanas, cheirando bem, elas que não deixam de apertar a campainha até eu aparecer e dizer, pronto, estou aqui. São mulheres de médicos e também de advogados e de toda essa turma que parece ganhar dinheiro. Mesmo assim elas costumam ir às lojas caras, pegam cinco ou seis roupas para experimentar em casa, no caminho compram tecidos e trazem tudo pra cá. Dois dias depois retornam às lojas dizendo que as roupas ficaram longas ou curtas demais. Ou qualquer merda do tipo. Essa que tocou a campainha agora é uma senhora de 50 e poucos anos. Não sorri nem nada.

-Ela saiu – digo.

-Ah, que coisa. Não vou voltar depois. Essa rua é péssima. Tenho medo.

-Vai ser calçada em breve.

Ela não parece escutar.

– Vou deixar em sua mão e você fala pra ela que é pra fazer tamanho M – diz, sua voz estridente como a de uma mulher que vende produtos na tevê. – O molde é G mas eu quero M. Ela não pode errar nisso.

-Certo.

Vira o rosto, torcendo o pescoço, levantando os óculos e apertando um dos olhos enquanto me encara, os cabelos pintados num loiro muito fraco. Loiro d’água, penso.

-Melhor eu anotar – diz, sorrindo duma forma que não soou muito simpática. – você pode esquecer…

Que Deus e a moçada da humildade me perdoem, mas nesse instante me vem a vontade de me voltar pra ela e dizer, com calma mas com imponência, que não precisa, que se alguém ali tiver que escrever alguma coisa esse alguém sou eu. Tenho intimidade com a caneta, minha senhora, e quando não estou abrindo portas para madames rasas como uma tábua de cortar carnes eu tenho escrito algumas páginas bem boas, algumas páginas cheias de simplicidade e força, a luz a se fazer na quietude dum quarto com vista para um muro cinza, o nome da minha filha escrito nele. Um dia essas páginas serão impressas e todos vão saber quem eu verdadeiramente sou: uma espécie de Harrison Bergeron com uma caneta na mão, louco o bastante para tocar, perdido o suficiente para fazer gente estancar lágrima antes dos outros notarem, o forte brilho da verdade no meio de toda uma escuridão. Um dia, minha senhora, ficará curiosa ao ponto da comichão interna te fazer sair do seu altar e perguntar por aí:

-Mas o marido dela é o escritor?

E alguém te responderá:

-É, aquele gordinho, o que abria a porta.

E a senhora dirá, surpresa:

-Puxa vida, acha que ele tinha cara de escritor?!!!

E eu tirarei onda contigo e com o seu marido e com seus filhos e com todos esses filhos da puta que acham que cagam melhor e vivem reinando em suas patotas. Eu serei foda, minha senhora, e vocês me chamarão para os seus aniversários e ficarão frustrados quando eu não aparecer.

Tudo isso é o que penso dizer, mas nada digo porque sou um covarde e porque ela sorri ao me entregar a sacola com o bilhete dentro: sempre fraquejei na hora de guerrear

Pra falar a verdade, acho que nem sou tudo aquilo que pensei.

Rodrigo Melo é escritor; publicou Jogando dardos sem mirar no alvo, O sangue que corre nas veias, Enquanto o mundo dorme e Riviera

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Depois de falar, parava para escutar e, a depender do que ouvia nos resmungos de Ruy, passava a xingá-lo com todos os impropérios que conhecia.

José Nazal

Em Ilhéus há duas antigas praças, muito próximas. Ambas ficam na avenida beira-mar, onde tudo acontece, denominada de Soares Lopes. As praças são dedicadas a dois ilustres baianos: o poeta Castro Alves e o jurista Ruy Barbosa.

Um velho frequentador das praças, o bancário Coló, apreciador de uma boa pinga e fumante inveterado, era apaixonado pelo “Poeta dos Escravos” e adversário ferrenho do “Águia de Haia”. Coló, no auge dos seus ‘’porres”, era o mensageiro que levava e trazia os recados entre os bustos dos ilustres homenageados. Na maioria das vezes, recados desaforados.

Coló morava próximo da praça de Antônio, nome pelo qual ele se dirigia ao ídolo e amigo íntimo, o poeta baiano Antônio Frederico Castro Alves. Diante do busto, bradava em alto e bom som: “Antônio, vim lhe dizer que o tal do Ruy desafiou você. Disse-me hoje que encontrou erros de português em seus versos! Vim aqui te dizer isso e pedir permissão para voltar lá e dizer uns desaforos a ele. Tá pensando o quê, o tal jurista? Que é mais importante que você? Vou lá e volto já”.

Partia então Coló, calmamente e num equilíbrio perfeito (com a solenidade que apenas os bêbados têm), para a praça de Ruy. Chegando, desancava o jurista com o recado que trazia a resposta de Castro Alves. Depois de falar, parava para escutar e, a depender do que ouvia nos resmungos de Ruy, passava a xingá-lo com todos os impropérios que conhecia.

Assisti a essas cenas diversas vezes. Quem não viu tem o direito de não acreditar.

José Nazal é fotógrafo, memorialista e foi vice-prefeito de Ilhéus (2017-2020).

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Como não estava acostumado a ser retrucado com veemência, Manuel continuou a viagem até Medeiros Neto sem dar uma palavra com seu amigo “Cambão”.

Walmir Rosário

Manuel Leal de Oliveira foi uma figura ímpar do Sul da Bahia. Eclético e desinibido, sempre esteve presente nas mais diversas ocasiões relevantes da política e da economia regional. Morou um tempo na Guanabara e São Paulo. Na capital carioca, trabalhou nos jornais Última Hora e Jornal do Commércio. Após tirar a “sorte grande” na Loteria Federal, volta a Itabuna.

Já em terras grapiúna, Manuel Leal adquire, com os recursos da premiação, uma fazenda em Firmino Alves (ex-Itamirim), onde por muito tempo ocupou cargos e a presidência do Sindicato Rural. Como sindicalista patronal rural, demonstrou prestígio e fez parte da diretoria do outrora Conselho Consultivo dos Produtores de Cacau-CCPC, chegando a ocupar cargos importantes, como a Secretaria.

Foi sócio de alguns empreendimentos, entre eles uma fábrica de balas e uma indústria de química que fabricava água sanitária e alvejante: a Alvex. Usando sua experiência adquirida na área de marketing dos jornais do Rio de Janeiro, promoveu uma revolução na comunicação de Itabuna, junto com o jornalista Cristóvão Colombo Crispim de Carvalho, ao promover o lançamento do produto utilizando o teaser.

Manuel Leal possuía verve afiada e uma facilidade incrível de fazer amigos – desafetos também –, tornando uma pessoa importante na sociedade regional. Foi fiscal da Prefeitura de Itabuna e, em seguida, nomeado fiscal do Instituto de Aposentadorias e Pensões dos Comerciários (IAPC), que mais tarde se tornou o Instituto Nacional de Previdência Social (INSS), após a unificação do sistema.

Vida estabilizada – cacauicultor, empresário, funcionário público –, Manuel Leal sempre teve uma grande paixão: o jornalismo. Ainda estudante do Colégio Divina Providência, fundou o polêmico jornal A Terra, que lhe tornou ainda mais conhecido. Logo depois criou o Tribunal Regional, que fizeram história ao falar abertamente do cotidiano, da economia e da política, sempre com uma linguagem afiada, o que não agradava os poderosos.

Desde estudante que era considerado comunista, embora se relacionasse perfeitamente e com destaque com pessoas das mais diversas classes sociais e ideologias, seus amigos e de sua família. De vez em quando um comunista famoso procurado pela polícia era abrigado em sua casa ou fazenda, com todas as honras e mesuras que merecia, a pedido dos tantos amigos.

Em 1987, junto com o escritor e jornalista Hélio Pólvora, Manuel Leal funda os jornais Cacau LetrasA Região, dois jornais elaborados com esmero e que – de cara – ocuparam o merecido lugar na comunicação estadual. E A Região conseguiu chegar ao clímax, influenciando o pensamento e a política regional. E o jornal passou a ser aguardado aos sábados pelo conteúdo altamente polêmico.

Além de Hélio Pólvora, passaram pelo A Região editores e repórteres da mais alta linhagem do jornalismo sulbaiano, mantendo, sempre, o tom “manuelino” que fez história na comunicação regional. Algumas semanas a tiragem de 5 mil exemplares era insuficiente para atender aos ávidos leitores e a gráfica tinha que se desdobrar para aumentar o número de exemplares.

Lembro-me quando editor de A Região – junto com Daniel Thame – inovar na diagramação do jornal, modificando, inclusive, a primeira página para aproveitar uma grande notícia de última hora. Não raro, jornal na gráfica, nos livrávamos das chamadas da primeira página, substituindo-a por um tijolão de três laudas e uma foto de um fato que não poderia deixar de ser publicado.

Com todas essas atividades, Manuel Leal nunca deixou de ser o fiscal do INSS, fiscalizando empresas das cidades baianas. Numa dessas viagens tinha como motorista o seu fiel escudeiro José Emanoel Aquino, o conhecido “Cambão”. Ao se aproximar do posto da Polícia Rodoviária Federal, em Itamaraju, o policial fez o sinal para o veículo em que viajavam parar para fiscalização.

Assim que o policial se aproximava do carro, Manuel Leal sacou do bolso da camisa uma carteira de couro com as armas da República contendo sua carteira funcional do INSS, e brandiu:

– Fiscal federal do INSS. Estou a serviço! – exclamou.

Tranquilo, o policial rodoviário não se intimidou com a carteirada e retrucou em quente:

– E o senhor quer dizer que eu estou aqui brincando, não é…Favor passar os documentos do veículo e do condutor – pediu.

Como não estava acostumado a ser retrucado com veemência, Manuel continuou a viagem até Medeiros Neto sem dar uma palavra com seu amigo “Cambão”.

Manuel Leal foi assassinado após uma denúncia feita pelo jornal A Região. Hoje o jornal é mantido na forma digital pelo seu filho, o jornalista Marcel Leal.

Walmir Rosário é radialista, jornalista e advogado. Com artigos e crônicas, ele também edita o Blog Walmir Rosário.

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Seria mais honesto vestir a carapuça do governo e mostrar a verdadeira face oportunista do Carlismo, que “mamou o tempo todo nas tetas da ditadura”.

Wenceslau Junior

É impressionante o contorcionismo político do ex-prefeito de Salvador e presidente nacional do Democratas, ACM Neto, para não vincular sua imagem a Bolsonaro.

O presidente nacional do DEM comandou pessoalmente o “cavalo de pau” na eleição da Mesa da Câmara dos Deputados, quando o partido abandonou a candidatura de Baleia Rossi (MDB-SP), construída por Maia e comprometida com a independência do legislativo, para apoiar Arthur Lira (PP-AL), candidato oficial do Planalto, apoiado por Bolsonaro, que derramou milhões de reais em emendas e prometeu fazer uma reforma administrativa, abrindo mais espaço para o centrão em troca de votos.

Nem bem o “defunto esfriou”, ou seja, menos de 15 dias da eleição da Mesa Diretora, realizada no dia 1º de fevereiro, o Planalto faz o movimento de promover Onyx Lorenzoni (DEM-RS) do Ministério da Cidadania para a Secretaria-Geral da Presidência. Lembrando que o mesmo, além de coordenar a transição, ocupou o Ministério da Casa Civil, entre janeiro de 2019 e fevereiro de 2020, quando passou a ocupar o Ministério da Cidadania.

É bom salientar que Onyx Lorenzoni não foi o único democrata a ocupar cargos no primeiro escalão do governo Bolsonaro. O também deputado federal Luiz Henrique Mandetta (DEM-MS) ocupou o Ministério da Saúde de janeiro de 2019 a abril de 2020, enquanto a deputada federal Tereza Cristina (DEM-MS) ocupa o Ministério da Agricultura desde o início da gestão de Bolsonaro.

Portanto, a legenda comandada nacionalmente por Neto indicou 3 Ministros no início do governo, sendo que um deles (Lorenzoni) pode ser considerado o “curinga” da gestão. Atualmente, são 2 Ministros (Tereza e Lorenzoni) em ministérios importantes, fora os membros da legenda que ocupam cargos de segundo e terceiro escalões, a exemplo de José Carlos Aleluia (ex-deputado federal e ex-presidente estadual do DEM-BA), reconduzido ao Conselho de Itaipu em maio de 2020.

Com a assunção do Ministério da Cidadania por João Roma, assume o mandato a deputada federal Tia Eron (PRB), passando José Carlos Aleluia a ocupar a primeira suplência.

Como é de conhecimento público, o DEM deu um “cavalo de pau”, deixando Rodrigo Maia, Baleia Rossi e a oposição “a ver navios”.

Nunca se teve notícia, até então, de uma abertura de cofre tão escancarada em troca de votos para eleger a Mesa da Câmara. Além da liberação de emendas e outras verbas, cargos de primeiro, segundo e terceiro escalões “choveram na horta” de deputados que  se renderam ao Poder Central.

Sabemos que, além do compromisso de pautar com “força total” as matérias conservadoras do presidente Bolsonaro, haja vista a meteórica votação da autonomia do Banco Central, especula-se que está no pacote o engavetamento das dezenas de pedido de impeachment do desastroso presidente.

Depois de ter contribuído abertamente para a vitória de Bolsonaro na eleição da Mesa, o DEM, inclusive na Bahia, vem recebendo as contrapartidas por parte do Governo e uma delas é a nomeação do “apagado” deputado federal João Roma (Republicanos-BA), ex-chefe de gabinete da Prefeitura, compadre e amigo pessoal de Neto, para o Ministério da Cidadania.

Como se não soubesse de nada, Neto esbraveja ter sido traído por Roma e que se Bolsonaro fez a nomeação com intuito de intimidá-lo, ganhou um inimigo.

Esse jogo de cena, esse “contorcionismo” político não entra na cabeça de quem tem um mínimo de acesso à informação, vejamos:

1º – O DEM esteve presente na campanha, na transição e na composição do Governo o tempo todo. Onyx Lorenzoni foi coordenador de campanha, coordenador da transição e encontra-se no terceiro ministério;

2º- Neto é presidente nacional da legenda e nunca se posicionou contrário às presenças de deputados do partido em ministérios importantes;

3º- Neto se envolveu pessoalmente na articulação que desembarcou a maioria dos deputados do DEM da candidatura de Baleia Rossi para a de Arthur Lira.

Me parece que se trata da velha tática de colher o bônus (cargos, emendas, recursos) sem vincular sua imagem com o desgaste (fascismo, machismo, homofobia, violência, entreguismo e negacionismo) do desgoverno Bolsonaro.

“O tempo é o senhor da razão e da verdade”. Vamos ver os municípios da Bahia que mais irão aquinhoar os recursos do Ministério da Cidadania. Vamos ver em que palanque João Roma estará nas eleições de 2022.

Seria mais honesto vestir a carapuça do governo e mostrar a verdadeira face oportunista do Carlismo, que “mamou o tempo todo nas tetas da ditadura”. Não adianta tentar construir uma imagem de “progressista”, “avançado”, “comprometido socialmente”, pois a prática do DEM escancara o liberal-conservadorismo que compõe o seu DNA.

Wenceslau Junior é professor universitário, advogado e membro da Comissão Política Estadual do PCdoB

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O cancelamento do carnaval nos deu a oportunidade de refletirmos sobre nossas práticas, o barulho do trio elétrico foi naturalmente trocado pelo silêncio, o que possibilita escutarmos as vozes internas para quem sabe trocar o cancelamento de pessoas pelo acolhimento, nossa arrogância pela tolerância, mesmo com os que não toleram.

Marcos Cardoso

Certamente, 2021 será lembrado como o ano em que não teve carnaval. Para a geração daqui a trinta anos, será impossível imaginar, como foi o “País do Carnaval” cancelado, o Brasil sem a folia. Isto, se o mundo voltar para os velhos trilhos, anterior à pandemia da Covid-19.

A festa popular exportada da Europa, derivada do entrudo, ritual de jogar farinha, ovo e água, era uma forma prazerosa do adulto brincar e findava no primeiro dia da quaresma. Ao longo do tempo foi se modificando e adequando ao jeito brasileiro, junto com o futebol, para os críticos, o nosso “ópio”. Para alguns teóricos, a festa desvela também a nossa hierarquização social, na mesma medida em que os dias de folia eram o salvo-conduto, para a fantasia simbólica de ser quem não é no dia a dia, através da fantasia literal, digo a vestimenta, assim os menos favorecidos viravam reis e rainhas da folia ou o que a sua imaginação permitisse.

Nos últimos dias, a palavra cancelamento esteve em evidência, tanto pelo carnaval cancelado, quanto pelas situações ocorridas na casa mais vigiada do Brasil, a do Big Brother. Certamente, este foi o ponto de ebulição para as reflexões expostas.

O ineditismo do não carnaval, no ano em que o cancelamento em todas as suas versões ganhou protagonismo, o do carnaval foi compulsório, pelas autoridades, foi protocolar. Porque, antes disso, os agentes biológicos nos cancelaram, restando a alternativa de suspensão dos festejos.

Fevereiro sem carnaval mexe primeiro com a cadeia produtiva na sociedade de consumo, mas vai além, já que esta usina de alegria, simbolicamente incutida no imaginário dos brasileiros e vendida aos gringos que aqui aportam todo fevereiro, toca na alma de milhões que se alimentam durante doze meses desta expectativa é a data mais esperada do ano, cantada em verso e prosa.

Nossa identidade cultural foi construída em torno do carnaval e historicamente se consolidou como uma festa identitária, em que minorias sociais levantam suas bandeiras contra o racismo, machismo e por mais direitos como reivindica o movimento social LGBTQIA+.

Sim, o carnaval é palco de lutas sociais, mas é também a síntese de um povo cheio de mazelas que se permite extravasar alegria, tristeza e lascividade, já que a festa é da carne e na modernidade, que é líquida, as relações são fluídas.

Como ocorre também no programa Big Brother Brasil, muitos vivem esses dias intensamente, se comportam no público como se estivessem no privado. Famosos e anônimos, ricos e pobres, convivem no mesmo ambiente, todavia, com prazo de validade determinado, já que a folia dura em média quatro dias e na casa mais vigiada do Brasil, noventa.

As semelhanças vão além, tanto lá (BBB) como cá (carnaval), ambos exigem equilíbrio tantas vezes ignorados. São verdadeiras maratonas, seja em Salvador, ao som do axé, ou nos passos do frevo nas ladeira de Olinda, requerem condicionamento físico, como nas provas de líder da casa, em sua natureza são competições, vide Carnaval do Rio, com premiação em dinheiro para a escola de samba campeã ou o mais de um milhão de reais, para o vencedor do programa. Falar de BBB e carnaval é falar de narcisismo, sempre exaltado através dos corpos desnudos em exposição.

A edição BBB 21 coincidiu até mesmo no quesito cancelamento, o carnaval por motivos óbvios, para não propagação do corona vírus. No reality recheado de tretas, o “cancelar” pessoas (prática de boicote, deixar de seguir alguém nas redes sociais, para puni-la e fazer perder contratos de trabalhos) foi a pauta mais evidente desta temporada ainda em andamento.

Em que vozes tidas como progressistas, empoderadas, que são ou eram abraçadas pela militância antimachismo, racismo e GLBTfóbicas, deixaram aflorar seu lado perverso, potencializado pela exposição midiática, sobretudo por reproduzir o comportamento do opressor, justamente quem se coloca, fora da casa, na posição de protagonista na quebra das amarras.

Por fim, o cancelamento do carnaval nos deu a oportunidade de refletirmos sobre nossas práticas, o barulho do trio elétrico foi naturalmente trocado pelo silêncio, o que possibilita escutarmos as vozes internas para quem sabe trocar o cancelamento de pessoas pelo acolhimento, nossa arrogância pela tolerância, mesmo com os que não toleram. Talvez neste processo se colha um fruto saudável, a geração de consciência sobre a diversidade social.

Marcos Cardoso é técnico em Segurança Pública e graduando em Ciências Sociais (Uesc).

Carlos Farias e Thelma
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Walmir Rosário

Notícia boa viaja a pé, já as más, a cavalo. E é exatamente nessa antiga premissa que estamos nos acostumando – mesmo com irresignação – a viver nesses últimos tempos assolados pela pandemia da Covid-19. Desta vez, a péssima notícia chega em dose dupla, pelo whatsapp de José Nazal: “Nosso amigo Faria faleceu nesta sexta-feira (12), de Covid-19, e sua esposa Thelma se encontra internada na UTI”.

Irrequieto, dinâmico, agitado, astucioso, afável – para muitos –, carrancudo – nem tanto – para outros. E neste contexto se encaixava o ilheense Carlos Farias Reis, exatamente como o pensamento de Nélson Rodrigues, para quem toda a unanimidade era burra. Eu mesmo o classificaria com mais adjetivos díspares, principalmente quando o tema era sua conduta no trabalho, no dia a dia. Ainda bem.

Meses atrás, o casal Farias e Thelma deixa Ilhéus para dar apoio à filha em Aracaju, onde o genro passou um grande tempo na UTI, lutando contra a terrível Covid-19. Trancado no apartamento, não se conformava na mudança de vida, no comportamento totalmente estranho para quem sempre foi acostumado a sair às ruas, passear pela cidade, ou simplesmente conversar com os amigos.

Por ironia do destino, o Casal Farias Reis resolve retornar a Aracaju, refazendo o trajeto anterior pela capital baiana, revendo os amigos mais chegados. Já em Sergipe, sentem-se mal e são diagnosticados com a infecção da Covid-19. O que tanto temiam que infectassem os amigos, chegou a eles sem qualquer aviso-prévio, longe de sua querida cidade natal, Ilhéus.

Farias era um apaixonado por Ilhéus, embora sempre manifestasse vontade de se mudar para Aracaju, para viver mais próximo à família, ato sempre postergado por ele e cumprido pelo Divino. Farias se foi e agora rezamos por Thelma, sua esposa, para que se livre desta doença e deixe a UTI, restabelecendo-se por completo. Um casal perfeito, separado de forma violenta.

E desde o início do ano passado que Farias tentava marcar um almoço em sua casa para homenagear o jornalista José Adervan, falecido em 12 de fevereiro de 2017. Com a epidemia, a data festiva não foi agendada, e uma das preocupações do anfitrião eram as sucessivas mortes dos convidados – acometidos da Covid-19 –, com o risco de não haver quorum para a recepção. E Farias morre exatamente quatro anos após Adervan.

Por falar em recepcionar os convidados, um dos seus chegados na legião de amigos, o saudoso Raimundo Kruschewsky (Barão da Popov), sempre foi pródigo em nomear Farias como o último dos grandes anfitriões de Ilhéus. Essa frase foi tomada emprestada do escritor grapiúna Jorge Amado, que costumava chamar seu amigo Raimundo Pacheco Sá Barreto de o último coronel do cacau.

Grande anfitrião, Farias (ou Carranca, para alguns), se preocupava de forma exagerada com os amigos, tanto que nos nossos telefonemas quase diários, dava notícia do estado de saúde de quase todos, perguntando acerca dos que não tinha notícia. Nessa lista, uma de suas inquietudes era o jornalista e escritor Antônio Lopes, seu amigo desde os tempos de escola, com direito a cadeira e litro de whisky cativo na residência de Farias.

Carlos Farias Reis era considerado um homem das antigas, embora transitasse com muita facilidade em todas as faixas etárias e sociais, às vezes dizendo verdades merecidas, outras vezes palavras de conforto, ou simples pilhérias. Em sua casa reunia amigos, sem importar a ideologia política, posição social ou financeira, e seus convidados iam de representantes do clero, passando por jornalistas, comerciantes, comerciários ou políticos.

Ao tomar conhecimento da morte de seu amigo Farias, Antônio Lopes, ainda agastando com os efeitos de um infarto, ao se refazer do choque, exclamou. “Estou arrasado, creio que perdi uma parte de mim”. O sentimento de Lopes por certo ecoou em Ilhéus e ultrapassou seus limites, dada a comoção que tomou conta de amigos tantos em Itabuna, Canavieiras, Salvador, Aracaju, dentre outras cidades.

Funcionário da Petrobras, abandonou sua merecida aposentadoria quando chamado para implantar o terminal da empresa de Itabuna, tornando a vestir o pijama listrado assim que inaugurado. Como era do seu temperamento irrequieto, prestou vestibular para Direito; formado, prestou concurso para juiz conciliador do Juizado Especial; aprovado, preferiu não assumir o cargo, deixando a vaga para os mais novos.

Em sua colação de grau, Farias não era chamado pelos amigos de formando, como natural, mas de desembargador, pela idade, o que valeu um lauto almoço, com direito a assento na mesa da diretoria. Como bem disse o amigo Antônio Lopes, com a partida de Faria todos perderam um pedaço de si – em graus diferentes –, lembrança que por certo não sairá da memória de cada um de nós.

Walmir Rosário é radialista, jornalista e advogado.

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Jogo duro, aquele. Ninguém queria se arriscar e a marcação era feita homem a homem. Jogo pra “pirão”, narravam Orlando Cardoso e Geraldo Santos. Era uma partida para ficar nos anais da Desportiva.

Walmir Rosário 

Quem não conheceu a tabelinha Pelé e Coutinho no auge do time do Santos Futebol Clube? Claro que todos os desportistas daquela época (décadas de 1950/60). Mas eu garanto que se não fosse o poder da mídia paulista e carioca, com suas emissoras de rádios potentes e com poderes de dominação cultural, essa dupla seria fichinha se comparada a que jogava pelo Botafogo de Rodrigo: Pedrinha e Mundeco.

Nada se comparava a essa espécie de irmãos siameses do futebol do bairro Conceição, em Itabuna, que fazia vibrar os torcedores do Botafogo, além dos gritos estridentes de Rodrigo, que ecoavam no campo da Desportiva a cada jogada da dupla. Essa tabelinha era tão importante para o time, que Rodrigo – após o último treino de apronto – tomava todas as precauções com a saúde dos dois atletas.

Na verdade, Rodrigo tratava Pedrinha e Mundeco com o desvelo de um pai – principalmente antes dos jogos –, dando orientações e conselhos. Como um psicólogo, tentava mergulhar numa análise do subconsciente de cada um deles, auscultando-os sobre as dores da alma e outros problemas que os afligiam cotidianamente.

Esses problemas nada mais eram do que as incursões que os dois faziam, na calada da noite, pelo jardim da Estação Ferroviária (hoje praça José Bastos) à “caça das gatas” (chamadas maldosamente de graxeiras, por serem empregadas domésticas). Para dar coragem de enfrentá-las, ambos não dispensavam umas doses de “verdinhas”, tomadas nos botecos da cabeceira da ponte velha.

Era aí que morava o perigo, e disso bem sabia o experiente Rodrigo Antônio dos Santos, que tinha a mesma habilidade ao cuidar de tipos frios e impressões de sua gráfica, como das escapadas noturnas de seus atletas. Afinal, nem por sonho poderia entrar para o jogo do Campeonato Amador da cidade, justamente contra o Flamengo, desfalcado dos seus meio campistas. Pedrinha e Mundeco eram os maestros que regiam a orquestra botafoguense.

E o receio de Rodrigo não era infundado. Véspera do jogo, nada de Mundeco comparecer ao treino das cinco da manhã, no campo da Desportiva. Mais tarde, após algumas diligências, o todo-poderosos presidente do Botafogo era informado da notícia que menos queria ouvir: Mundeco estava acamado com uma forte gripe contraída nas noites de sereno embaixo dos pés de fícus do jardim da Estação.

Domingo, após lamentar a terrível baixa, o time do Botafogo se dirige à Desportiva para enfrentar seu mais ferrenho adversário, o Flamengo, que acabara de contratar quatro novos jogadores e prometia se vingar da última derrota sofrida pelo rival da “Abissínia”, como chamavam pejorativamente o bairro Conceição.

Jogo duro, aquele. Ninguém queria se arriscar e a marcação era feita homem a homem. Jogo pra “pirão”, narravam Orlando Cardoso e Geraldo Santos. Era uma partida para ficar nos anais da Desportiva.

Aos quarenta e quatro minutos do segundo tempo, Pedrinha, que até então não tinha acertado uma – era impossível jogar sem seu parceiro de tantos anos –, descobre o centroavante Danielzão na grande área e lança a bola. O centroavante matou a redonda no peito e, na hora de mandar a bomba, recebeu uma tesoura voadora do zagueiro flamenguista. Pênalti! Apitou o árbitro. Finalmente a pátria alvinegra estaria salva.

Silêncio total na velha Desportiva. De longe, Rodrigo grita:

– É sua, Pedrinha, bata esse pênalti – autorizou.

Bola na marca do pênalti. Todas as duas torcidas na expectativa e o árbitro finalmente trila o apito. Pedrinha se encaminha para a bola e chuta. Todos acompanham a trajetória da bola e, pasmem, ela faz uma curva parabólica ao contrário e se encaminha para o morrinho onde hoje está localizada a Igreja de Santa Maria Goretti.

Ninguém entendeu nada, era impossível Pedrinha errar o gol, já que uma de suas marcas era chutar colocado. Poderia, no máximo, o goleiro pegar, mas errar daquele jeito, nunca. Recomeça o jogo e o árbitro apita final de partida. Um raquítico zero a zero que não interessava a nenhuma das duas equipes. Rodrigo entra em desespero e, no vestiário, entre lamentos e palavrões cobra explicações ao seu craque.

Passada a aflição, Pedrinha enfim, pode se explicar. Ao se encaminhar para a bola e bater o pênalti, ele ouve o sinal característico do seu parceiro Mundeco pedindo o passe, com aquela tossidela combinada. Aí então ele não contou conversa, passou a bola para o seu parceiro de tabelinhas. Para quem não conheceu a dupla, o que aconteceu foi o seguinte: como Mundeco estava gripado, foi assistir ao jogo do morro da igreja, seu local preferido. Ao vir descendo a ladeira, uma irritação na garganta o fez tossir. Aquele hã-hã característico foi o suficiente para que Pedrinha atendesse ao sinal combinado do seu parceiro.

Walmir Rosário é radialista, jornalista e advogado, além de editar o Blog Walmir Rosário.

Para Carlos Pereira, ACM Neto passa longe do poder ostentado pelo avô
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ACM Neto não tem nem de longe o poder do avô. Evidentemente, vem de uma escola familiar, é de direita, oportunista, inteligente e habilidoso. É apenas uma pequena parte do antigo poder do carlismo, mas em situação histórica totalmente diversa.

Carlos Pereira Neto Siuffo

ACM foi um político que predominou na política baiana por quase trinta anos. Começou na UDN com Juracy Magalhães, antes do golpe de 1964. Depois rompeu, e posteriormente alternou o poder disputando com outras correntes das classes dirigentes (o juracisismo, o vianismo e, meio outsider, com Roberto Santos).

ACM era dirigente da direita tradicional, conhecia muito das virtudes e fraquezas humanas e sabia manipular os instrumentos de poder como poucos. Eram conhecidos os slogans divulgados por seus seguidores: “quatros anos de pau sem pão”; “aos amigos os favores da lei, aos inimigos os rigores da lei”; ” a bolsa ou chicote”. Sabia corromper e bater, tinha arte em extorquir empresários e, também, agradar intelectuais e jornalistas.

Carlos Castelo Branco conta que ele mandava buscar jornalistas do sul para almoços na Bahia. E muitos intelectuais outrora de esquerda eram seus amigos (dentre eles, Jorge Amado). Comandava a Bahia com dengo e chicote. Era um populista de direita e patrocinava a cultura popular. Fazia da Bahia um sincretismo. Católico tradicional, afagava o candomblé.

Praticamente dizia a “Bahia sou eu”, a ponto de incorporar os símbolos e as cores do Estado em suas propagandas partidárias.

Comandava as instituições do Estado com mão de ferro (todas). As polícias eram milícias suas. Também era dono do judiciário. Era famosa a sabadada dos desembargadores no beija-mão.

Agradava e socorria amigos (desde que não o comprometesse) e era impiedoso com os adversários. Tinha espírito de moleque de rua e tanto telefonava quanto mandava fac-símile expressando xingamentos horríveis para jornalistas.

ACM foi o modernizador por cima da economia baiana. Uniu as oligarquias rurais com o capitalismo moderno e se cercava de tecnocratas competentes. Desde que não fizesse política contra ele internamente, não se importava com pessoas de esquerda nos órgãos do Estado. De quando em quando, cooptava algumas – era conhecida a esquerda baiana na Seplantec. Boa parte de suas bancadas estadual e federal eram compostas de seus tecnocratas, forçava os oligarcas regionais a votar neles.

Rompendo com a ditadura em seus estertores, manteve um grande poder no governo Sarney. Com isso, sufocou o governo estadual de Waldir Pires e o de Lídice em Salvador. Alertando que ele continuava com grande força nas instituições estaduais.

A coligação PSDB e PFL manteve forte o carlismo. Mesmo após o rompimento com FHC, ACM continuou forte e cooptando políticos antes adversários, como fez com parte do PSDB, cujas lideranças comandam o PP da Bahia.

O principal cálculo de poder de ACM era fazer Luís Eduardo Magalhães presidente do Brasil. A morte do filho começa a fazer desandar o carlismo, por falta de um sucessor natural.

O carlismo era formado no mando ditatorial e nos interesses econômicos e fisiológicos dos seus “fiéis seguidores”. Internamente, era um ninho de cobras, cada qual querendo picar a outra.

A morte de ACM dispersa o carlismo. A maioria dos seus então seguidores hoje apoia o governo petista. As instituições também não são mais as mesmas. O carlismo morreu e não existe mais. Seu poder era alicerçado nos muitos interesses econômicos e fisiológicos das classes dirigentes e nas características pessoais de um líder de direita, inclusive muito bem articulado nacionalmente.

ACM Neto não tem nem de longe o poder do avô. Evidentemente, vem de uma escola familiar, é de direita, oportunista, inteligente e habilidoso. É apenas uma pequena parte do antigo poder do carlismo, mas em situação histórica totalmente diversa.

O carlismo foi um fenômeno histórico. Os antigos seguidores do carlismo hoje estão no governo de Rui Costa e também na oposição. O fenômeno carlista deixou de existir.

Não esquecer que Oto Alencar chegou a ser governador pelo antigo carlismo. Não esquecer!

Carlos Pereira Neto Siuffo é professor de Direito da Universidade Estadual de Santa Cruz (Uesc).

Pelé chega ao Estádio Mário Pessoa em ônibus da velha Sulba
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Como a porta estava entreaberta, ouvi a voz inconfundível de Pelé: “Deixe o menino entrar, eu dou a entrevista…”. Entrevistei o Rei durante 15 minutos e ainda de quebra ouvi Haroldo e Lima.

Ramiro Aquino

Devia ter um ano de rádio quando o Santos Futebol Clube, o inigualável Santos de Pelé, veio pela primeira vez a Ilhéus. Corria o ano de 1964, salvo engano, e o timaço do Santos jogaria contra a Seleção local, soube mais tarde reforçada pelo excelente goleiro Betinho, do Janízaros, de Itabuna. A delegação do Santos vinha de Belém, a capital do Pará, e viajaria para o exterior em duas ou três semanas.

Cabe aqui um retrocesso nesse caso, pois o goleiro Betinho jogaria na véspera contra o Grêmio Esportivo pelo Campeonato amador de Itabuna na velha e acabada (sempre foi) Desportiva. E foi Pelé quem pediu a presença de Betinho, pois ele já sabia da fama do jogador.

Não existia ainda a ponte Ilhéus-Pontal e os moradores do bairro do Pontal, veranistas e passageiros do aeroporto, eram transportados nas pequenas lanchas e desembarcavam bem defronte ao Ilhéus Hotel, de Jocelin, amigo velho de meu pai.

O Betinho era irresponsável (disse “era” porque ele já morreu) e jogou a partida toda do sábado contra o Grêmio, mesmo depois de ter rasgado a mão, em lance fortuito. Mas, mesmo assim, confirmou a presença no jogo contra o Santos.

Apesar de novo no rádio o Geraldo Santos, meu narrador e meu chefe, me escalou para cobrir o Santos. Cheguei a Ilhéus duas horas antes e revi alguns companheiros de Salvador e de Ilhéus. E aí…

Chegou o Santos na lancha e não vi o Pelé. Lá estavam os outros jogadores do time santista, como Peixinho, Mengálvio, Pepe e os menos votados. Como era perto da hora do almoço, todos se dirigiram para o restaurante do Ilhéus Hotel, e lá estavam as aparelhagens das rádios de Salvador e Ilhéus. Vi ali Nílton Nogueira, que já conhecia, o ilheense Djalma Costa Lino, acoplado ao irmão Fernando, que por permanecer na terra levava alguma vantagem.

Entrevistei Peixinho, Pepe, etc. E vi também um técnico de som meu conhecido de uma rádio de Ilhéus, Nivaldo, que foi a minha salvação.

Ele conhecia todos os investigadores de Polícia da cidade e disse ter visto Pelé, Haroldo e Lima subirem direto para os aposentos onde iam ficar no mesmo quarto. Conversou com dois amigos da polícia e estes deixaram nós subirmos. O mais difícil estava na porta do quarto. Dois “guarda-roupas” guardavam Pelé e Cia. Conversei com eles, que tinha menos de 9 meses e era novo no rádio, disse ter viajado 300 kms (aumentei somente uma “pequena porcentagem”) só para entrevistar o Rei. Como a porta estava entreaberta, ouvi a voz inconfundível de Pelé: “Deixe o menino entrar, eu dou a entrevista…”. Entrevistei o Rei durante 15 minutos e ainda de quebra ouvi Haroldo e Lima.

Desci ao restaurante e encontrei todos os radialistas atrás de uma entrevista com Pelé. Como eram de Salvador e Ilhéus passei para eles sob a condição ser citado e em que condições eu consegui a entrevista.

Entrei no carro e voltei rapidamente para Itabuna. Até hoje, com menos qualidade, guardo essa entrevista. A primeira boa entrevista a gente não esquece.

Ramiro Aquino é radialista, jornalista e cerimonialista.